Ecumenismo Macabro: Católicos, Protestantes e Adventistas Envolvidos no Genocídio de Ruanda

Fiéis ruandeses acusam padres católicos e pastores protestantes de ter estimulado a matança

ELIZABETH NEUFFER, da equipe do The Boston Globe

NYANGE, Ruanda – Antigamente havia uma igreja católica em Nyange. Construído numa colina perto de um grupo de casas, o templo de tijolos vermelhos, durante muitos anos, foi procurado pelos fiéis em momentos difíceis.

Assim, quando em 1994 a milícia liderada por hutus iniciou a chacina da minoria tutsi, milhares de pessoas correram para a igreja em busca refúgio. Mas, em vez disso, encontraram a morte. Um padre, Athanase Serumba, é acusado pelos sobreviventes de ter apressado a ação dos soldados que atacaram o edifício e o destruíram.

Hoje, tudo o que resta da igreja de Nyange são pilhas de escombros e quatro cruzes de madeira, assinalando valas comuns. A crença da comunidade no catolicismo – que já foi muito firme – também virou ruínas.

“Eu perguntei: Padre, pode me ajudar?”, lembra Charles Kagenza, um sobrevivente da chacina cegado e espancado pela milícia hutu, ressaltando: “O padre respondeu – não posso fazer nada por você.” E acrescentou: “Como eu poderia continuar a ter fé?”

Enquanto Ruanda se esforça por absorver o genocídio de 1994 e submeter os responsáveis à Justiça, surgem provas de cumplididade de membros das igrejas Católica, Protestante e Adventista ruandesas no derramamento de sangue que custou a vida de mais de 500 mil tutsis e hutus moderados.

Segundo grupos de direitos humanos e sobreviventes do massacre, embora membros do clero e trabalhadores religiosos também tenham sido assassinados e alguns morreram defendo sua congregação, outros fecharam os olhos ao crime e até encorajaram os assassinos.

Punições

O Tribunal Internacional de Crimes de Guerra para Ruanda indiciou um ministro da Igreja Adventista do Sétimo Dia. O governo francês acusou sacerdotes catóticos de ter cometido crimes de guerra. Outros sacerdotes e freiras, acusados de crimes de guerra pelas autoridades ruandesas, estão sob custódia.

Funcionários ruandeses e representantes internacionais agora discutem medidas para punir esses religiosos e o papel que suas igrejas deveriam desempenhar – ao admitir sua responsabilidades em tais episódios.

Num sinal de que leva muito a sério essa questão, o governo ruandês (liderado por tutsis) criou uma lei sobre genocídio que enquadra “autoridades religiosas” acusadas de crimes contra a humanidade, como sujeitas à pena de morte.

Esse quadro dividiu profundamente as comunidades religiosas ruandesas, frustrando a esperança de que pudessem desempenhar um papel importante na reconciliação em Ruanda, particularmente diante do regresso 700 mil refugiados hutus que estavam no Zaire. Entre os refugiados, figuram muitos suspeitos de participação nos massacres.

Alguns membros do clero ruandês acham que as autoridades católicas e protestantes deveriam reconhecer o papel desempenhado pelas respectivas igrejas. “Sem a aceitação do pecado da igreja, de sua falha, não poderá haver reconciliação”, declarou o sacerdote católico Ubald Rugirangoga, de 40 anos, do Colégio de Santo André, em Kigali. Rugirangoga perdeu toda a sua família durante a chacina de 1994. “A igreja deve dizer: Nós erramos e pedimos perdão.”

Ações individuais

Mas os líderes eclesiásticos – incluindo os da Igreja Católica, cujos fiéis representam 65% da população – mantêm silêncio. O arcepispo católico Thadee Ntihinyurwa – que só concordou em responder por escrito às perguntas sobre genocídio feitas pelo Globe – escreveu: “Não são os acusados que devem explicar as acusações feitas contra eles.”

O papa João Paulo II – que condenou os assassinatos – disse recentemente que a Igreja Católica de Ruanda não pode ser acusada por ações individuais. “A Igreja não pode ser responsável pelas iniqüidades cometidas por seus membros que agiram contra a lei evangélica”, ressaltou ele em carta dirigida aos ruandeses. “Todos os membros da Igreja que pecaram durante o genocídio devem ter a coragem de suportar as conseqüencias dos atos que cometeram contra Deus e contra o seu futuro.”

Campos de matança

Em um país onde milhares de pessoas assistem às cerimônias religiosas no domingo, é dificil conciliar os sinais exteriores de fé com o fato de que muitas delas ergueram machetes para matar, aleijar, decapitar, saquear e violentar vizinhos.

Igrejas que eram centros comunitários espirituais se converteram em campos de matança, onde a milícia liderada por hutus atacou e matou milhares de pessoas em busca de refúgio. Hoje, algumas igrejas são memoriais e não casas de oração.

Na igreja de Ntarama, nos arredores de Kigali (a capital), os ossos de centenas de pesosas assassinadas há dois anos ainda estão espalhados no santuário. Ao contrário do que sucedeu na Bósnia, em Ruanda a identidade religiosa não teve nenhuma influência na chacina.

Na Bósnia, os rebeldes sérvios bósnios usaram o temor de uma invasão islâmica para justificar os ataques contra o governo bósnio, liderado por muçulmanos. Em Ruanda, a chacina étnica não teve nada a ver com religião; havia membros da minoria tutsi e da maioria hutu em todas as igrejas.

Mas as igrejas cristãs tiveram destacada atuação no genocídio, exatamente como tiveram em Ruanda em 1931, quando os belgas coroaram Mutara III Rudahigwa como rei e ele prontamente se converteu ao cristianismo. Alguns missionários, ansiosos por fazer conversões, vincularam a ajuda econômica à profissão de fé.

As igrejas não estão isentas do racismo amplamente difundido em Ruanda. Ninguém contestou a divisão do país entre a maioria hutu e minoria tutsi – distinção que geralmente não pode ser feita com base nas características físicas.

“Estamos apegados à nossa identidade étnica”, admitiu padre Rugirangoga. “Quando alguém é padre, e se considera tutsi ou hutu, não poderá haver reconciliação junto ao povo.”

Esse sentimento de identidade étnica persiste até hoje. Alguns líderes religiosos hutus que fugiram de Ruanda e de seu governo liderado por tutsis continuam exilados. O arcebispo anglicano Augustin Nshamihigo, por exemplo, fundou uma igreja dissidente em Nairobi. Muitos sacerdotes continuam exilados no Zaire, entre os quais pelo menos um bispo católico.

Alguns sacerdotes alegam que a Igreja Católica Romana poderia ter usado de sua influência sobre o governo liderado por hutus para interromper a chacina de 1994. A Igreja foi tocada pela violência imediatamente: o primeiro massacre de Ruanda ocorreu no Centro Jesuita Cristus, de Kigali, onde foram mortas 17 pessoas – entre as quais 7 sacerdotes.

Mas os líderes eclesiásticos se limitaram a condenar o genocídio, acusam muitos ruandeses. “A Igreja não fez nada durante o genocídio”, admitiu o padre Octave Ugirashebuja. “Ela era a única organização capaz de conter a chacina e agora não quer admitir a falha.”

Alguns membros da comunidade reliogiosa ruandesa divergem. “Que outro recurso temos para defender as pessoas?”, indaga o sacerdote Andre Sibomana, líder do grupo de direitos humanos local, para acrescentar: “A não ser dizer: Parem, parem!”

O Estado de São Paulo, 20 de dezembro de 1996

2 comentários em “Ecumenismo Macabro: Católicos, Protestantes e Adventistas Envolvidos no Genocídio de Ruanda”

  1. Leandro Macedo, o que acho interessante é que quando um adventista mostra os erros das outras igrejas ele é tido como um grande amigo de Deus e da igreja, mas quando mostra os erros doutrinários ou de práticas da IASD a mesma pessoa passa a ser inimiga de Deus e da igreja.

  2. Amigo esqueça a igreja Adventista, você é muito desocupado ñ acha?

    Suas sustentações são muito fracas, e outra, uma pessoa assim com essa revolta, precisa se entregar a Jesus e pregar seu evangelho, coisa que você não faz… sua preocupação é tentar manchar o nome de uma instituição que leva a palavra de Deus para todo mundo… coitado de vc, Deus tenha piedade,!
    Vai procurar uma lavagem de roupa, que é bem mais proveitosa pra você, hehehehe…!

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