Professor do Unasp sugere que defesa político-jurídica da liberdade religiosa atrasa a volta de Cristo

Você já parou para pensar que a defesa legal da liberdade religiosa quer impedir Lei Dominical e atrasa a volta de Cristo? No artigo “Discurso da Liberdade Religiosa na Igreja Adventista do Sétimo Dia”, o doutor Haller E. S. Schünemann, Professor Titular de Ciências Humanas do UNASP e Pesquisador REPAL-UMESP, defende esse posicionamento:

A IASD ensina que antes da volta de Cristo, a questão do sábado se tornará o divisor de águas, entre os fiéis e os infiéis. Os guardadores do sábado serão perseguidos por sua crença e quando for feito um decreto mundial para a morte de todos, então Cristo interfere na história humana, resgatando os seus fiéis. Dentro desse quadro, podemos concluir que realmente o sábado se torna um aspecto muito importante. No entanto, vemos aqui aquilo que consideramos o paradoxo adventista. …É interessante observar que ao mesmo tempo que a intolerância religiosa é apontada como um sinal da volta de Cristo, ela passa a ter um departamento de liberdade religiosa, que se tiver êxito em sua atuação, evitaria a ocorrência do esquema apontado em sua escatologia.

Embora o referido artigo esteja disponibilizado abaixo na íntegra, a seguir você pode acompanhar o contexto desse raciocínio do professor Dr. Haller E. S. Schünemann, com redivisáo dos parágrafo para estimular a leitura online:

…A IASD como é indicado pelo seu nome, considera o sábado um dia especial. A IASD ensina que o sábado é o dia correto de descanso, pois ele foi criado por Deus e está presente nos Dez Mandamentos existentes na Bíblia, que é uma regra universal. Assim, ao contrário do que ensinam a quase totalidade das Igrejas Cristãs, o dia de guardo correto é o sábado.

Além disso, o sábado é observado dentro da concepção judaica de tempo, que considera o início do novo dia no horário de pôr-do-sol. Assim, o dia de sábado deve ser observado, entre o pôr-do-sol de sexta-feira até o de sábado, como horário sagrado. 1

Esse conceito foi defendido recentemente pelo representante mundial da IASD do Depto. de Liberdade Religiosa em uma reunião realizada em São Paulo.

Horário sagrado: De sexta à noite ao pôr do sol de sábado

Em princípios, os adventistas do sétimo dia nesse horário sagrado, não deveriam se envolver em qualquer atividade não-religiosa. Assim, trabalho, estudo e lazer estariam entre as atividades proibidas nessas horas sagradas.

Embora, os costumes de observância do sábado sejam cada menos exigentes, ainda assim, em especial o trabalho e o estudo são alvos de controle sobre os membros. Uma boa parte desses controles é feito pelos próprios membros, de modo que os processos de relaxamento são devido ao menor interesse coletivo de apontar os transgressores.

As práticas de estudo e trabalho, contudo, são regulares e, em especial, nas comunidades menores, quase impossível de serem transgredidos sem serem notados. Desta forma, é comum a estudantes adventistas, que precisam estudar a noite, terem problemas com as aulas de sexta-feira à noite.

Vários adventistas, em especial, os novos conversos, muitas vezes têm dificuldades de se acomodarem no trabalho justamente, por que muitos setores trabalham aos sábados. Nos serviços ou comércios, que funcionam diuturnamente, é muito comum, os adventistas trabalharem regularmente aos domingos, ao invés do sábado, o que em alguns casos, pode ser interpretado favoravelmente pelo empregado.

Mesmo a área de saúde, no qual a própria instituição oferece cursos técnicos e superiores em Enfermagem e mantém instituições hospitalares, o trabalho ao sábado é tido como só podendo ocorrer dentro de certos padrões, que são quase impossíveis de serem seguidos em termos práticos.

Defesa político-jurídica da liberdade religiosa, um paradoxo adventista

Os adventistas do sétimo dia consideram o sábado não apenas um dia sagrado, mas o sinal de obediência a Deus. Dentro do esquema profético da IASD, a observância do sábado, seria uma espécie de “selo” que Deus coloca sobre os fiéis. Assim, a dedicação e a fidelidade ao sábado seria uma prova de amor a Deus, e uma condição necessária a salvação do crente. A doutrina do sábado, por tanto, relaciona-se com o outro conceito fundamental do adventismo que é a volta de Cristo.

A IASD ensina que antes da volta de Cristo, a questão do sábado se tornará o divisor de águas, entre os fiéis e os infiéis. Os guardadores do sábado serão perseguidos por sua crença e quando for feito um decreto mundial para a morte de todos, então Cristo interfere na história humana, resgatando os seus fiéis. Dentro desse quadro, podemos concluir que realmente o sábado se torna um aspecto muito importante. No entanto, vemos aqui aquilo que consideramos o paradoxo adventista.

Ao mesmo tempo, que é profetizado de que o sábado é o sinal, a IASD envolve-se na temática da liberdade religiosa, não apenas como um discurso, mas como uma mobilização efetiva em sociedades democráticas, em especial, para assegurar cada vez mais as sua liberdade doutrinária.

Vamos apresentar brevemente as questões da IASD e o surgimento da liberdade religiosa como uma proposta e depois destacar quais são as “lutas atuais” em relação a liberdade religiosa entre os adventistas.

Como já demonstramos a observância do sábado gera uma série de tensões na vida do adventista, em especial, nos novos conversos, que não puderam planejar, estratégias de trabalho e estudo, para minimizar, essas tensões que são normalmente feitas pelos adventistas de segunda ou mais gerações. Como o sábado é um sinal, ele acaba sendo considerado em termos práticos a doutrina mais importante para os adventistas (Schünemann, 2010).

É interessante observa que ao mesmo tempo que a intolerância religiosa é apontada como um sinal da volta de Cristo, ela passa a ter um departamento de liberdade religiosa, que se tiver êxito em sua atuação, evitaria a ocorrência do esquema apontado em sua escatologia.

Enquanto não ocorrer a perseguição, Jesus não virá. Logo…

A liberdade religiosa como política da IASD remonta quase o seu surgimento como instituição. (Morgan (2001) demonstra em sua obra, que embora a IASD sempre foi conservadora do ponto de vista das práticas morais, ela tinha dificuldade em apoiar as reivindicações de maior controle social pretendido pelo estabelishment protestante, pois, sempre havia dentro desse grupo, uma proposta de maior controle sobre as atividades trabalhistas no domingo, o que a IASD sempre identifica como um processo desencadeador da futura perseguição. Assim, há vários casos, nos quais a IASD, se posiciona contra os demais evangélicos apenas como forma de não favorecer práticas restritivas em relação ao domingo.

Selecionamos dois episódios citados em Morgan (2001) para ilustrar as tensões da IASD em função de sua escatologia e da liberdade religiosa nos Estados Unidos.

O primeiro caso ocorreu ao longo da década de 1870 e 1880. Embora a IASD se posicionasse favorável a questão da temperança (proibição de bebidas alcoólicas) ela não se posicionava totalmente contra a proibição, pois o mesmo movimento protestantes pró-temperança, também, defendia maior rigor no controle das atividades de trabalho no Domingo, o que era um sinal da ameaça final se tornando real. Assim, a IASD posicionou-se claramente contra as leis de temperança, para evitar que leis pró-domingo fossem aprovadas.

No segundo caso, ocorrido ao longo da década de 1920, a IASD acaba se aproximando do movimento fundamentalista no enfrentamento da Evolução, conceito que a IASD rejeita completamente. Como a IASD já tinha uma rede escolar no qual não ensina Evolução, ela não se posicionou favorável a obrigação da Criação nas escolas públicas, mas era contrário ao ensino da Evolução. Podemos dizer que a posição da IASD era que esse tema não deveria ser abordado na escola pública.

Os exemplos acima são apenas de caráter ilustrativo de como historicamente a IASD foi se posicionando em relação a relação da religião na esfera pública, enquanto relacionadas a suas crenças e interesses.

No Brasil, IASD nasceu longe da Política

No caso brasileiro, a IASD chegou ao país pouco tempo após a proclamação da República. Assim, naquele momento, a constituição brasileira de inspiração totalmente positiva, propõe total separação da Igreja e do Estado. A Igreja Católica embora majoritária e oficial durante todo o período imperial, não tinha quadros representativos e não conseguiu de imediato recuperar sua condição privilegiada.

Desta forma, a IASD, em seu início no país, consegue se manter bem longe das questões políticas e essa temática tem pouco interesse, na medida em que a maior parte dos membros ainda vivia em regiões rurais e eram na maioria pequenos proprietários de terra.

Em nossa tese (Schünemann, 2002) procedemos uma ampla investigação sobre as narrativas biográficas do fundadores, e fica evidente, que embora, existam vários relatos de intolerância religiosa, em especial, nas pequenas cidades do interior, as autoridades locais sempre são colocadas como garantido a segurança dos pregadores adventistas, ou mesmo dos novos conversos. Assim, não há registro de mártires, nessas memórias. Isso evidencia, dentro da nossa compreensão, que o caráter laico do estado brasileiro funcionava pelo menos em relação aos adventistas.

A situação começou a mudar a partir da tomada do governo federal por Vargas. Greenleaf (1992) demonstra que no caso do Brasil, a uma clara intenção da IASD de ser reconhecida, em especial, pelos trabalhos assistenciais que eram feitos em várias regiões do Brasil, principalmente, através de lanchas ao longo de grandes rios brasileiros, como Amazonas, São Francisco, Ribeira, entre outros.

Apesar dessa demonstração de “patriotismo” a IASD no Brasil se mantinha bastante distante da esfera política nacional, conceito que começa aos poucos ser questionado, mas não está vinculado, as questões sociais que influenciam outros protestantes de missão a aproximar-se mais da sociedade brasileira.

A situação muda a partir da chegada da ditadura militar, no qual há uma aproximação com o governo. Em parte, essa mudança, ocorre a partir da procura do regime militar nas igrejas protestantes uma oposição a Igreja Católica, pois a esquerda católica é uma fonte de oposição ao regime militar.

Dois fatores foram importantes para a aproximação da IASD com o governo nacional. Primeiramente, a existência desde a década de 1930 de trabalhos assistenciais feitas ao longo dos rios, que na década de 1970 estavam quase concentrados na região Amazônica. Esse trabalho, ainda que envolvesse muitas vezes missionários estrangeiros no início, nessa época, já estava realizado principalmente por brasileiros, o que favorece a percepção de um processo integração nacional pelos militares.

O segundo fator foi a necessidade de ajustar a rede escolar adventista as exigências da nova LDB de 1971. A nova legislação inviabilizava as escolas paroquiais adventistas, em quase sua totalidade, pois até aquele momento, elas eram escolas primárias, utililzando-se dependências das igrejas. A necessidade de construir novas escolas e principalmente, conseguir terrenos para construção das escolas aproxima a IASD do governo em especial para a aquisição de terrenos para o estabelecimento de algumas escolas.

Defesa da “liberdade religiosa” aproximou a IASD do Estado

A IASD no Brasil sempre tivera uma posição até então contrária a participação na política, pela compreensão de os políticos para exerce o poder usavam de práticas inaceitáveis a um adventista (Schünemann, 2002). No entanto, a partir da década de 1970, uma geração adventista começa a se interessar por política. A posição levantada por esses políticos adventistas foi justamente a temática da liberdade religiosa.

Um número crescente de adventistas desejam fazer faculdades, e a IASD não tinha praticamente nenhuma oferta. Assim, a ocorrência dos vestibulares no sábado era um entrave para adventistas. O crescimento de membros adventistas urbanos e de baixa renda também forçava que muitos desses adolescentes, em especial, precisassem estudar a noite e com isso, aumentava as tensões em torno das aulas de sexta-feira à noite.

Assim, surge progressivamente o interesse de garantir os direitos dos adventistas de terem tratamento especial pela guarda do sábado para assegurar as condições de estudo em escolas públicas. É importante ressaltar que a maior parte das escolas nessa fase inicial foi ampliada com os recursos dos membros. Em algumas localidades, os terrenos foram obtidos por relacionamentos políticos.

Podemos perceber que na medida em que surge o interesse crescente na temática de liberdade religiosa, como garantia de direito aos adventistas de guardarem o sábado, sem prejuízos as suas carreiras escolares, há uma aproximação da IASD do Estado, como forma de assegurar esses benefícios. Assim, estamos afirmando que nesse caso o interesse da liberdade religiosa, caminha junto com uma redefinição da relação ao Estado. …

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Discurso da Liberdade Religiosa na Igreja Adventista do Sétimo Dia

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