Guerra do Iraque Prepara a Sincronização de Emoções Necessária para os Eventos Finais

Leia e conclua por si mesmo.


Mistura de Deus e guerra no discurso de Bush irrita europeus

Por Tom Heneghan

PARIS (Reuters) - O tom religioso dos discursos do presidente norte-americano George W. Bush vem se tornando cada vez mais irritante para muitos ouvidos na Europa, onde líderes que invocam Deus em tempo de guerra em geral são suspeitos de abusar da fé para fins políticos.

Ninguém menos que o presidente da Alemanha, o primeiro-ministro francês e o ministro do Exterior da Bélgica se juntaram a líderes religiosos na expressão de sua preocupação quanto às crenças de Bush e ao papel da religião na política dos Estados Unidos.

Os comentaristas da mídia, especialmente em países do norte da Europa, de tradição protestante, classificam as visões evangélicas de Bush como fundamentalismo cristão, e há até quem as compare ao fundamentalismo islâmico de Osama bin Laden.

A discussão reflete tanto a muito difundida oposição à guerra na Europa quanto uma cisão mais profunda entre um continente onde a fé religiosa está em baixa e os Estados Unidos, país no qual os valores religiosos têm hoje, provavelmente, um papel político mais importante que nunca.

O presidente alemão Johannes Rau, filho de um pastor protestante e ele mesmo num homem declaradamente religioso, reagiu com aspereza esta semana, em entrevista na TV, a informações na imprensa de que Bush acreditava que derrotar o presidente iraquiano Saddam Hussein era parte de um plano divino.

"A mensagem de George Bush é completamente unilateral. Não creio que as pessoas recebam um sinal de Deus para que libertem outras pessoas", disse. "Em ponto nenhum da Bíblia há um apelo por cruzadas".

O ministro do Exterior belga Louis Michel, crítico declarado da guerra, disse antes do começo das hostilidades, no mês passado, que via um avanço do fundamentalismo cristão em Washington, acrescentando que "isso evidentemente é um ponto de partida perigoso."

O primeiro-ministro francês Jean-Pierre Raffarin, perguntado sobre a matéria de capa de uma revista semanal norte-americana, cujo tema era Bush e Deus, respondeu à revista Le Point que "de maneira alguma se pode pedir a Deus um voto de confiança."

"Creio que as crenças religiosas de George Bush sejam genuínas", disse o cardeal Karl Lehman, que preside a Conferência dos Bispos Alemães, a uma publicação católica. "Mas a maneira descuidada com que ele usa linguagem religiosa não é mais aceitável no mundo moderno".

fONTE: http://br.news.yahoo.com/030404/16/bdzo.html


Análise - De dissidentes a cruzados

José Vidal-Beneyto

Durante a longa luta pela conquista das liberdades nas décadas de 70 e 80, alguns setores do mundo do trabalho e da cultura na Europa Central e Oriental tiveram uma atuação capital, sob o nome de dissidentes. Vaclav Havel na Tchecoslováquia, Giorgy Konrad na Hungría, Lech Walesa, Jacek Kuron e Adam Michnik na Polônia se destacaram por sua combatividade. A impugnação do totalitarismo por meios pacíficos, a reivindicação da paz, dos direitos humanos e da tolerância eram as divisas da política que defendiam. Apoiados nela, transformaram-se na vanguarda do movimento de refundação democrática no mundo.

Hoje, 20 ou 30 anos depois, esquecido esse ideário, estão oficiando como cruzados da guerra. Havel, em sua polêmica no jornal "New Yorker" com David Remnik ; Michnik em seu debate com Bernard Guetta ; e Konrad em seus artigos no "Frankfurter Allgemeine Zeitung" citam os conhecidos argumentos de Powell a favor da invasão do Iraque. Os principais são: a necessidade de nos protegermos das ameaças do terrorismo islâmico, tão evidentes depois do 11 de setembro; a urgência de acabar com Saddam Hussein e eliminar as armas de destruição maciça em seu poder; a obrigação de nos solidarizarmos com os Estados Unidos, a quem tanto devemos.

Mas, caro Michnik, cabe estabelecer uma democracia a partir do alto e através da violência, quando os poderes impostos e as bombas são essencialmente antidemocráticos? Além disso, a demagogia do antiamericanismo é a desculpa que utilizam os que querem ocultar os desígnios da facção de extrema-direita que cerca Bush filho, cuja ideologia tem três eixos fundamentais: o messianismo nacionalista, o integralismo religioso e o fundamentalismo liberal. Essa é exatamente a opção em que se situa a extrema-direita no plano internacional. Basta ler os textos de Haider, Perle, Wolfowitz, Mégret, Bossi, etc. para comprová-lo.

Porque ser contra a destruição do Iraque e criticar as 14 negativas de Bush a assinar qualquer acordo internacional em defesa da justiça global e da proteção do planeta não é ser antiamericano, mas combater pelos princípios e os ideais da democracia americana. Porque, querido Adam, ser contra o populismo chauvinista com que a televisão do sr. Murdock inunda os Estados Unidos dia após dia e que é a perversão de qualquer possível identificação comunitária não é ser antiamericano, e levantar-se contra a ignomínia do roubo corporativo promovido pela Enron e pelas empresas de auditoria que legitimaram suas infâmias e que justificam o assalto à poupança popular a que estão procedendo tantas grandes empresas é um dever de cidadania; como o é denunciar a indecência de que algumas empresas pertencentes aos grupos Carlyle, Halliburton, Unocal, etc., próximos ao clã Bush, tenham dividido antecipadamente o orçamento para a fabricação das armas com que se está destruindo o Iraque e dividam posteriormente os fundos destinados a sua reconstrução.

E isso continuará se não o pararmos. Bush disse no ano passado em West Point, repetiu e escreveu depois, e esta guerra o confirma. O único poder político-militar que cabe no mundo é o dos Estados Unidos; os demais devem situar-se em sua constelação. Esse autocratismo integralista que alimenta todos os outros fundamentalismos nos leva diretamente ao caos. Vamos lhe opor uma ordem internacional justa e viável, que confirme os direitos humanos e a legalidade internacional. Para esse objetivo a Europa, que não pode existir plenamente sem seus países do centro e do leste, é um componente essencial. Mas a Europa com todos os outros países e os Estados Unidos em primeiro lugar, queira ou não o sr. Bush filho. Os antigos dissidentes não podem faltar neste projeto.


Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves
Fonte: http://noticias.uol.com.br/midiaglobal/elpais/ult581u458.jhtm


06/04/2003 - 10h55

EUA tiveram de "inventar" inimigo para atacar Iraque, diz filósofo

JOÃO BATISTA NATALI
da Folha de S.Paulo

Paul Virilio, 70, urbanista e filósofo francês, afirma que, para o novo conflito no Iraque, os Estados Unidos precisaram "inventar" o inimigo. A invenção ocorre pela propaganda e sobretudo pelo aparato de comunicação que permitiu essa guerra on-line.

Em entrevista à Folha, diz que "o campo de percepção de uma guerra é mais importante que o campo de batalha propriamente dito". Ou seja, a atual guerra privilegia a conquista do espaço virtual, tanto quanto a conquista do espaço territorial iraquiano.

Virilio é um pensador de extrema originalidade e nem sempre de fácil compreensão. Caminha contra a corrente e atropela sólidos consensos globalizados.

Não acredita, por exemplo, que a tecnologia de ponta na área da informação tenha algo a ver com o progresso. Ele argumenta que em verdade constroem-se obstáculos perigosos às liberdades.

A coalizão anglo-americana, diz Virilo, ameaça a democracia, porque o combate on-line acaba desembocando numa "sincronização das emoções", que conduz à perda coletiva do espírito crítico e, no momento seguinte, ao risco da idolatria.

É mais grave que a padronização das opiniões a que se chegou no século 20. Sem a opinião diversificada, o processo democrático já está comprometido.

Entre outros diagnósticos, ele diz que a ciência deixou de ser um agente de civilização para se tornar um instrumento militar.

Além de obras sobre arquitetura e urbanismo, Paul Virilio publicou 16 ensaios filosóficos, quatro deles traduzidos no Brasil pela Estação Liberdade e Editora 34 ("Estratégia da Decepção", "Velocidade e Política", "A Bomba Informática" e "O Espaço Crítico").

Leia a seguir entrevista concedida à Folha:

Folha - A respeito do conflito no Kosovo, o sr. escreveu ter sido instituída uma "estratégia da desinformação". Os Estados Unidos mobilizariam agora algo semelhante?

Paul Virilio -
Utilizei a expressão em meu livro "Estratégia da Decepção". A palavra decepção foi usada em seus dois sentidos: o "desinformar", mais próximo do significado em inglês, e o "decepcionar", mais próximo do significado em francês [e em português".

Estamos todos desinformados e desapontados. Essa guerra vem mostrando ser uma catástrofe. É uma guerra acidental, preventiva, que escapou de sua natureza substantiva, clausewitziana [do pensador prussiano Carl Phillip Gottfried von Clausewitz (1780-1831)], que seria a guerra como o prosseguimento da política por outros meios.


Folha - Por que os EUA não conseguiram convencer o mundo de que precisavam derrubar Saddam?

Virilio -
Em verdade, os EUA "inventaram" o inimigo. Numa guerra tradicional, o inimigo se declara enquanto tal e, em resposta, declaramos a guerra contra ele. O extraordinário golpe que foi o atentado de 11 de setembro não possuía um inimigo "declarado".

É claro que a guerra no Afeganistão foi uma resposta mais ou menos lógica ao grupo de Osama bin Laden. Mas era ainda preciso dar um rosto ao inimigo. O presidente George W. Bush foi então levado a "inventar". Saddam não foi um inimigo "declarado". Ocorreu uma negação da verdade política própria aos conflitos armados.


Folha - Até que ponto a atual guerra não seria legível sem a mídia, já que a mídia é fundamental ao processo de invenção?

Virilio -
Em meu livro "Guerra e Cinema" escrevi que o campo de percepção de uma guerra é mais importante que o campo de batalha propriamente dito. Estamos agora em plena teletecnologia on-line. A conquista da telinha e a conquista do campo de percepção na esfera mundial se tornaram o objetivo da guerra em seu atual modelo, seja ela terrorista, como no WTC, seja ela internacional, com a do Iraque. Não estamos mais hoje em condições de separar o campo de batalha real e o campo de batalha on-line, virtual.


Folha - Esse campo virtual é também utilizado pelo lado iraquiano?

Virilio -
Com certeza. Há agora uma diferença importante com relação à Guerra do Golfo, de 1991, que eu abordei em ensaio chamado "L"Écran du Désert" ["A Tela do Deserto"]. Havia naquele momento uma fonte única de informação, que era o pool entre a CNN e o Pentágono. Isso gerou controvérsias por parte de agências, como a France Presse, que se sentiram excluídas do campo de batalha. Essas fontes estão hoje multiplicadas (Fox News, BBC, Al-Jazeera), o que torna a guerra mediática mais confusa.


Folha - Foi para acentuar a virtualidade que se incorpora às tropas o jornalista "encaixado" [dotado de câmara e equipamento de transmissão de textos e imagens"?

Virilio -
Trata-se em verdade de um "gadget" [bugiganga]. A partir do momento em que o governante designou seu inimigo -a relação de Bush com Saddam-, os jornalistas não estão mais livres de seus próprios atos. Se a guerra é ilegal do ponto de vista da ONU, se o inimigo foi inventado pelos norte-americanos, os jornalistas "encaixados" estão embarcados na ilegalidade dessa mesma guerra. O jornalista não tem liberdade em suas relações informativas com o inimigo. Em outras guerras essa liberdade existia. Como ela deixou de existir, como é que a informação pode ser livre? Não o é.


Folha - A informação se tornou um componente tático.

Virilio -
A informação que deveria ser "democrática" não o é mais. Caímos então nos mecanismos clássicos da propaganda.

Folha - O sr. disse, há três anos, que a informação on-line era bem mais do que a propaganda.

Virilio -
Obviamente. A informação é aquilo que chamei de "bomba informática". Digamos, para simplificar, que segundo a física há na matéria três dimensões: a massa, a energia e a informação. A guerra seguiu essas três etapas. Ela se definiu enquanto guerra como guerra de massa, com massas de soldados, com o século 19 e as guerras napoleônicas ou com as grandes guerras do século 20.

O militar estava na ofensiva, enquanto a defensiva era feita por meio de fortificações, que são minha especialidade inicial, como urbanista. As cidades eram fortificadas por imensas muralhas.

Havia a Muralha da China, o Muro do Atlântico. A segunda dimensão mobilizada pela guerra foi a energia. A energia necessária para propulsionar a bola do canhão -que tornou obsoletas as muralhas- e até a bomba atômica, que esteve na origem do equilíbrio entre duas superpotências até o final do século 20.

Folha - E a informação?

Virilio -
A informação já existia em formas anteriores de guerras, com a espionagem ou a propaganda, com o reforço da fé religiosa nas Cruzadas. Mas hoje a dimensão informativa se torna primordial nos conflitos.

Folha - A informação não é mais instrumento de libertação?

Virilio -
Infelizmente, não. Albert Einstein dizia existirem três tipos de bombas: a bomba atômica, a bomba da informação e, para ele num futuro, a bomba demográfica.

Estamos hoje atravessando o momento da explosão da bomba da informação, da bomba da informática. Esta última é bem mais perigosa que a bomba da informação da qual falava Einstein, porque na época os computadores não estavam tão desenvolvidos. Agora, com a interatividade, com a comunicação on-line, assistimos à fusão de opiniões.


Folha - Haveriam outras "bombas" ainda a caminho?

Virilio -
Com certeza há algo que eu suponho que possa se tornar uma bomba genética, capaz de modificar o genoma e operar mudanças na raça humana.


Folha - O que sobrará então do cidadão, tal qual o concebemos desde o final do século 18?

Virilio -
A partir do século 19 assistimos à emergência de um fenômeno importante, que foi a padronização. Ocorreu a padronização dos objetos com a Revolução Industrial. Ocorreu uma padronização de opiniões, que falseia a democracia na medida em que a informação é apresentada de uma só maneira. Entramos agora no século 21 com algo bem mais agudo, bem mais grave, que é a "sincronização das emoções".


Folha - O sr. poderia explicar isso um pouco melhor?

Virilio -
A transmissão ao vivo, a ocorrência e a percepção dessa ocorrência em tempo real favorecem não só a padronização das opiniões, mas também a possibilidade de as emoções serem simultâneas. Não foi preciso esperar por uma guerra para que tal fenômeno surgisse.

Ele nasceu em experiências religiosas, com os telepastores. É algo que supera a dimensão da propaganda e se torna algo de perigosa importância cultural no plano globalizado. Podem existir ramificações positivas na sincronização das emoções, como o fato de, a 15 de fevereiro, 10 milhões de pacifistas terem saído às ruas em centenas de grandes cidades. Mas essa sincronização poderá mobilizar milhões de pessoas motivadas pelo ódio.


Folha - Pode-se falar em democracia quando a emoção está tão fortemente envolvida?

Virilio -
Estamos diante de uma ameaça, que é a democracia pela emoção, cujo primeiro exemplo foi fornecido pelos nazistas e pelo uso que eles fizeram das emissoras de rádio que orientavam manifestações simultâneas na Alemanha. Conhecemos relativamente bem os fenômenos de alucinação e loucura coletiva que implicavam essas cerimônias.


Virilio - Eu chamaria a atenção para o fato de não se tratar de algo conjuntural. É algo estrutural. Se a padronização da opinião já é uma ameaça para a democracia representativa, a padronização das emoções é uma ameaça definitiva contra qualquer projeto de democracia. Caminharíamos para aquela dimensão religiosa e irracional que existiu no paganismo.


Folha - A religiosidade tem sido um componente forte nos discursos de Bush e de Saddam.

Virilio -
É terrificante. Acredito que a "guerra preventiva" é uma forma de crime contra a humanidade. Ela não será a primeira batalha de uma 3ª Guerra Mundial, mas o primeiro passo para uma espécie de guerra civil globalizada.

Até aqui as guerras civis -e as mais mortíferas foram sempre as guerras de religião- estavam localizadas: a Comuna de Paris, a Guerra Civil Espanhola, a Bósnia. Mas agora ela se globaliza, por meio de apelos à guerra santa islâmica e os apelos paralelos à cruzada de Bush. É uma ameaça verdadeira contra a humanidade.

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/folha/mundo/ult94u54674.shtml
 

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