Prólogo
Mark Hanna era um homem vigoroso, calvo mas simpático, com
uma estreita franja de cabelo a emoldurar-lhe
a face, e que, quando falava, estava acostumado a ver resultados.
Há pouco tempo, por exemplo, ele sozinho quase havia colocado o William
McKinley na presidência americana. Começara agora um novo século. O
ano de 1900 rompeu tão brilhante como um novo dólar, e pelo que o
senador Hanna podia visualizar, o futuro rumava diretamente para as
estrelas. "As fornalhas estão incandescentes" exclamava.
"Os fusos estão entoando sua canção. A felicidade chega a todos
nós com a prosperidade!"
O recém apontado senador de Ohio não estava só naquela opinião.
Em 1º de janeiro de 1900, o futuro parecia tão cheio de promessas como
manhã da primavera. Por uma vez o mundo estava amplamente em paz. A
China, com suas centenas de milhares, ainda estava aberta para viagens,
e para o evangelho. Dentro da imensa massa de terra que seus filhos e
filhas chamavam grande Rússia, havia ainda um pouco de tempo. Admitimos
que a ampulheta estava perdendo areia rapidamente; grandes problemas
deveriam logo conclamar a grandes mudanças. Porém restavam ainda quase
duas décadas antes que o estampido do fogo de artilharia fora do palácio
de inverno do Czar mudasse para sempre o curso da história - e as
oportunidades para a obra de Deus. Mudanças enormes pairavam
precisamente além do amanhã, como a distante cor cinza do curso de um
vendaval que anuncia a primeira aproximação de uma inevitável
tempestade; no dia de Ano Novo de 1900, porém, poucas pessoas podiam
ver qualquer coisa a não ser a luz do sol.
"Se alguém não pôde fazer dinheiro este ano passado, seu
caso é sem esperança", exultava o editor de um jornal, e um clérigo
de Nova York dizia inflamado que "as leis estão se tornando mais
justas, os dirigentes mais humanos; a música está se tornando mais
doce e os livros mais sábios".
Uma das poucas vozes
discordes veio de uma senhora miúda de 72 anos de idade que por acaso
estava em New South Wales, Austrália, neste 1º de janeiro. Por vários
anos Ellen White estivera falando cada vez mais enfaticamente a respeito
de uma grande catástrofe que logo sobrevivia ao mundo, e embora suas
observações parecessem geralmente fora do padrão de seu tempo, ela
persistia nas mesmas com uma perseverança que atraía a atenção.
"Logo haverá morte e destruição, aumento e crime, e impiedade
cruel operando contra os ricos que se tem exaltado sobre os pobres. Os
que estão sem a proteção de Deus não encontrarão segurança em
nenhum lugar ou posição. Agentes humanos estão sendo treinados e estão
usando suas capacidades inventivas para colocar em operação a mais
poderosa maquinaria para ferir e matar... Que os recursos e os obreiros
sejam espalhados". Estranhas palavras, distintamente destoantes do
contexto da época, e muito menos fáceis de se ouvir do que os tranqüilizantes
pensamentos do reverendo Newell Hillis, que falou à sua congregação
em Brooklyn sobre os livros mais sábios e a música mais doce. Mas no
primeiro dia do novo século o povo teria feito bem em dar cuidadosa a
atenção às advertências de Ellen White, pois ela havia acertado
demasiada vezes no passado para permitir que alguém a ignorasse e
continuasse se sentindo realmente confortável.
Ninguém teria
possibilidade de saber disto naquela manhã do novo ano, mas as predições
da Sra. White estavam no limiar do comprimento. Naquele mesmo mês Lênin
seria liberto da detenção siberiana e correria através da Rússia em
direção à segurança da Europa ocidental. A Inglaterra, França e a Rússia,
preocupadas com o surgimento da aliança germânica estavam apoiando
algo chamado de a tríplice Entente. E em Zurich, um jovem estudante
colegial chamado Albert Einstein estava já escrevendo fórmulas
estranhas e cogitando a possibilidade de tornar a matéria em energia.
Dia de Ano Novo,1900
- em Shangai, navios a vapor britânicos volviam-se preguiçosamente em
suas bóias sobre o rio Huang-p'u, aquecendo-se sob o sol devaneador do
inverno. Em São Petersburgo a nobreza da Rússia deslizava em trenós
brilhantes ao longo das margens do rio Neva e então corriam para casa a
fim de se vestirem para a noite. Isto era o apogeu do que a sociedade
russa chamava de temporada, uma rodada de noites resplandecentes com
brancos vestidos de cetim e uniformes flamejante de condecorações - de
festas onde "ninguém pensava em partida antes das 3 horas da manhã"
e os oficiais permaneciam até que o céu estivesse colorido com as
tintas pérola, rosa e prata da alvorada.
Ano Novo...
e em Berlim, o conde Alfredo von Schlieffen já sabe que quando a
guerra chegar, ela penetrará através das suaves e planas campinas da Bélgica.
Ele sabe, porque os mapas já estão traçados.
E nos escritos da Igreja Adventista as palavras se desdobram numa
final, desesperada proposta por reconhecimento, antes que seja tarde
demais: "Agentes humanos estão sendo treinados e estão usando
suas capacidades inventivas para pôr em operação a mais poderosa
maquinaria para ferir e matar... Que recursos de obreiros sejam
espalhados".
Para o mundo parece
ser manhã, mas na ampulheta da história o pôr do sol está perto, e a
luz do sol que aquece o primeiro dia de 1900 é o último áureo momento
da oportunidade para se trabalhar em paz, que rapidamente se desvanece
com a chegada da noite.
O trabalho de Deus pode ainda ser feito sob a luz do sol, mas o
tempo é curto. Agora somente uma pergunta realmente importa:
Corresponderá o povo de Deus?
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