Uma Espada Como de Fogo
Arthur G. Daniells, de 44 anos de idade,
presidente da Conferência Geral, trabalhou até tarde da noite de 30 de
dezembro de 1902. Durante uma pausa de poucos momentos, ele conversou
primeiro o seu jovem assistente administrativo e depois com I. H. Evans,
gerente geral da Review and Herald Publishing Company. Era uma noite
quente do inverno em Michigan, calma e sem neve, e os dois homens bem
podiam estar relaxados e à vontade em sua conversação. A Review, a
maior e mais moderna Casa Publicadora de Michigan, estava ainda
excepcionalmente bem. O velho ano havia produzido um grande lucro e o novo
ano prometia ser tão brilhante quanto o anterior.
Dois
quarteirões acima, na rua Washington, o sino do tabernáculo anunciava a
reunião de oração, e Daniells provavelmente deu uma olhada em seu relógio
para descobrir que eram sete e meia. Se assim foi, esse foi o último ato
regular que Daniells realizaria aquela noite. Momentos mais tarde as luzes
se apagaram; do outro lado da rua veio um brilho sombrio e lúgubre que
era inconfundível para qualquer um que tivesse visto fogo do sanatório.
O principal prédio da Review and Herald estava em chamas.
Quando
Daniells e Evans conseguiram chegar à rua, toda a sala de impressão
estava em chamas. Era uma visão violenta, quebrada por explosões periódicas
das janelas dos escritórios superaquecidos. Do lado de fora, podia-se
ouvir o som da maquinaria caindo, bem como o desmoronamento do segundo
andar. Dentro de uma hora a Review and Herald Publishing Company havia se
reduzido uma pilha de carvão e tijolos espalhados, com prensas
adventistas quebradas jazendo entre as derretidas chapas de impressão do Living
Temple de Kellogg.
Perdido.
Dentro de um devastador ano as duas maiores instituições da igreja
Adventistas do sétimo dia tinham desaparecido na fumaça, e o comandante
Weeks, do corpo de bombeiros de Battle Creek, resumiu tudo tão bem como
outro poderia ter feito: "Há alguma coisa estranha com os
incêndios dos ASD, em que água despejada age mais como
gasolina". (Citado em uma carta de B. P. Fairchild a A. L. White,4 de
dezembro de 1965.)
Por
semanas uma sinistra lembrança pairou sobre Battle Creek, tornando impossível
esquecer o que tinha acontecido. Durante o incêndio uma grande pilha de
carvão havia pegado fogo. Ela permaneceu queimando até fevereiro,
produzindo uma coluna de fumaça que, silenciosamente, fazia lembrar a
advertência de Ellen White: "a menos que haja uma reforma,
calamidade surpreenderá a Casa Publicadora, e o mundo conhecerá a razão".
(Testimonies, vol. 8 pág. 96) E agora isto havia acontecido, e a
mensagem ficou pintada no céu de Michigan por semanas.
"Por
muitos anos tenho carregado um pesado fardo por nossas instituições",
a Sra. White escreveu após ter recebido o triste telegrama. "Algumas
vezes tenho pensado que não deveria mais assistir a grandes assembléias
de nosso povo, pois minhas mensagens parecem deixar pouca Impressão nas
mentes de nossos irmãos dirigentes após as reuniões terem
terminado". Contou ela muito pesarosamente como deixava tais reuniões
"opressa como um carro carregado de molhos". (Special Testimonies,
série B. Nº 6, pág. 56)
A
mensagem de fumaça sobre Battle Creek traduzia uma questão muito
simples: seguiria o povo de Deus, mesmo com sacrifício de seus próprios
planos e preferências, as instruções dadas por Sua mensageira?
Esta
era uma pergunta à qual John Harvey Kellogg parecia estar muito perto de
responder irrevogavelmente. Ele havia sido advertido repetidamente por
Ellen White de que suas novas idéias teológicas levariam a ele e a todos
que seguiam a um terreno perigoso. A igreja organizada tinha se recusado a
imprimir seu manuscrito. Ele havia agido por conta própria, e agora os
destroços da Review and Herald. Publishing Company jaziam debaixo de uma
coluna de fumaça de carvão que manchava o céu hibernal. Por qualquer
padrão de julgamento havia aqui numa mensagem para o Dr. Kellogg; porém
ele estava para demonstrar o poder de uma escolha que, tendo rejeitado a
verdade, agora levava cada vez para mais longe dela. Um dos seus primeiros
atos após o incêndio foi levar seu manuscrito para uma publicadora de
fora para ser impresso.
Kellogg
tinha iniciado um desafio direto aos líderes da igreja, e logo tornou-se
claro que o jogo deveria envolver mais de que só a impressão de um livro
- deveria, na realidade, envolver o controle da própria conferência
geral.
A
igreja Adventista do sétimo dia estava organizada como sistema democrático.
As igrejas de locais elegiam os oficiais por maioria de voto.
Periodicamente eles também elegiam membros para reuniões da assembléia
da associação, onde os delegados representavam suas igrejas ao eleger
oficiais da associação e uma comissão executiva para associação.
Associações locais, por sua vez, enviavam representantes para reuniões
de eleitorado onde oficiais da união eram eleitos. E a conferência
geral, periodicamente, abria
uma sessão formal, onde o mesmo processo democrático era empregado para
eleger a liderança mundial.
Era
um sistema exeqüível, semelhante aos governos democráticos por todo
mundo, mas partilhava com estes de uma realidade comum: não era imune a
manipulação por parte daqueles que eram experimentados politicamente e
altamente organizados. Deste modo um grupo local bem estruturado podia
enviar para as reuniões de eleitorado da associação
delegados que podiam não representar realmente o pensamento da
igreja como um todo, mas que podiam falar de um ponto de vista particular
ou de teologia e tão habilmente que mesmo a direção de uma grande
associação poderia ser significativamente afetada. E há todos os indícios
de que em 1903 John Harvey Kellogg estava seguindo este preciso padrão de
raciocínio.
Desconcertantes
conflitos começaram a se desenvolver em Battle Creek. Facções políticas
centralizadas no sanatório, com o tempo passaram a lutar até mesmo pelo
controle do tabernáculo de Battle Creek; corriam rumores intensos; velhas
amizades se rompiam. O tabernáculo Dime começou a apresentar os sintomas
clássicos de uma igreja em problemas.
Entretanto,
havia sinais de que Kellogg estava também tentando depor a presidência
da conferência geral. De 1901 à 1903, não havia presidência formal da
conferência geral; em vez disso tudo havia uma assembléia de vinte e
cinco homens que escolhiam um "líder".
Sob
circunstâncias ideais este tipo de organização devia ter funcionado
bastante bem, mas continha uma deficiência prontamente visível para
qualquer pessoa com habilidade política e um pouco de ambição: já não
era a sessão da conferência geral que escolhia o presidente mundial da
igreja e lhe conferia um mandato; ele era apontado por outros vinte e
quatro homens. Controlando 13 deles, poder-se-ia colocar no posto qualquer
um que se desejasse.
Kellogg
não era conhecido por perder tais oportunidades, e 1902 e 1903 provaram não
ser a exceção. Ele começou uma campanha intensa para remover para A. G.
Daniells da presidência da conferência geral, e embora seu plano
finalmente falhasse, o Dr. alistou uma liga de homens poderosos influentes
que apoiavam sua teologia e pensavam que as opiniões dele deveriam ser
promulgadas na igreja da maneira mais ampla possível.
Eles
eram "homens de proeminência", como Daniells mais tarde os
descreveria - ministros, médicos, e educadores que "abertamente
tomaram sua posição em favor do livro e de seus ensinamentos". (A.
G. Daniells, The Abiding Gift of Prophecy, p. 336)
E
perto da chegada do verão tanto Daniells como Ellen White ficaram
chocados ao saber que este grupo de mentes fortes e persuasivas estavam
fazendo questão de ir em busca do único recurso que igreja não podia se
dar ao luxo de perder - sua juventude.
Para aqueles que se dedicam a grandes mudanças no
"status quo", os jovens têm sido sempre um atraente alvo de
oportunidade. Se a mudança não puder ser efetuada na primeira tentativa,
há sempre a esperança de atingir a juventude, cuja fascinação por idéias
novas e não convencionais podia ser usada com vantagem em produzir uma a
"próxima geração" mais complacente. (Essa tática estava
justamente se tornando evidente na Europa Oriental, onde forças
empenhadas em mudanças políticas haviam tentado mudar o sistema e
fracassado, havendo então começado um apelo agressivo à juventude; o
tempo mostraria quão eficaz seria a sua técnica).
Ellen White estava plenamente ciente do poder que a
juventude poderia conferir à igreja; falava entusiasticamente sobre o
grande "exército" jovem que levaria o evangelho a "todo o
mundo", (Educação, pág. 271) e ela reconheceu imediatamente
o problema quando se tornou claro que as forças de Kellogg estavam começando
a olhar com interesse para os jovens da igreja.
A
primeira insinuação daquela tática foi revelada quando o livro de
Kellogg saiu do prelo. O Living Temple foi imediatamente promovido
enviado para associações locais justamente a tempo das campais de verão,
e "esforços vigorosos" foram feitos para envolver a juventude
em difundi-lo para venda. (Daniells, loc. cit.) O pastor Daniells notou a
nova manifestação com grande preocupação. "Vi sementes sendo
disseminadas entre centenas de jovens em nossas principais instituições",
declarou. Alguma coisa que ele "firmemente cria que deveria produzir
como resultados profundos desgostos a centenas de nossos irmãos." Idem.
Kellogg
estava também usando jovens de uma maneira política. Em novembro de 1903
Ellen White escreveu para o pastor S. N. Haskell, advertindo o de que os
estudantes estavam sendo arrolados em uma campanha para escrever cartas
destinadas a produzir pressão política favorável ao sanatório.
"No
sanatório em Battle Creek, os estudantes e auxiliares tinham sido
encorajados pelo gerente a escrever para seus pais e amigos e falar das
coisas maravilhosas que estavam sendo feitas na instituição", ela
disse - coisas que lhe haviam sido reveladas como estando muito longe de
ser maravilhosas. (Carta de Ellen G. White a S. N. Haskell, 28 de novembro
de 1903)
Ela
constantemente se preocupava com os jovens estudantes do sanatório, que
estavam ouvindo a nova teologia dos professores a quem respeitavam, e os
perigos eram tão grandes que ela abertamente advertia os pais a manterem
seus filhos longe de Battle Creek.
Ainda
em 1901, em resposta a sua preocupação, o colégio havia sido fechado e
a escola mudada para uma nova região de Berrien Springs, deixando em
Battle Creek somente as classes relacionadas com a medicina, que eram
dadas no sanatório. Entretanto, o alvará de funcionamento do colégio de
Battle Creek não havia expirado, deixando a possibilidade teórica de
reabrir o campus em qualquer tempo que alguém assim quisesse fazer, e
agora, ao se acalorar a batalha, Kellogg apoderou-se dessa prática como
meio de atingir jovens da igreja.
Brochuras
atrativas foram impressas anunciando a reabertura do colégio de Battle
Creek “uma necessidade”, afirmava ele, para se obter a aprovação de
detalhes técnicos relacionados à escola de medicina. A equipe de
recrutadores entrou em campo. Planos grandiosos para a nova instituição
foram expostos e aos jovens se falou "das grandes vantagens do
preparo neste colégio de Battle Creek, agora reaberto". (Daniells,
op. cit., p. 34)
Era
um desafio que fez com que Ellen White se pusesse de pé em alarme:
"Como nós poderíamos consentir ter a flor de nossa juventude
chamada para Battle Creek a fim de receber sua educação, quando Deus tem
dado advertência após advertência de que eles não devem ir para lá",
bradou ela. Alguns dos instrutores "não entendem o real fundamento
da nossa fé. ...Não permita Deus que uma palavra sequer de encorajamento
seja proferida para chamar nossos jovens ao lugar onde eles serão
corrompidos por representações falsas e calúnias concernentes aos
testemunhos, e à obra e caráter dos ministros de Deus". (Special
Testimonies, série B, nº 2, página 21,22)
Assim,
as questões controvertidas, de acordo com a Sra. White, eram duas: a crença
no espírito de profecia e apoio para o ministério da igreja organizada.
Enviar jovens para Battle Creek seria expô-los ao ataque de ambos
assuntos.
Havia
uma crescente possibilidade de que eles fossem expostos também a outro
perigo. No início da história do adventismo, o afastamento da doutrina básica
havia sido acompanhado por estranhos padrões de comportamento, e agora
problemas semelhantes pareciam estar surgindo. "Havia idéias
confusas do amor livre", o pastor L. H. Christian recordaria mais
tarde, "e havia práticas imorais por alguns daqueles que
apresentavam a doutrina de um Deus impessoal difundido através da
natureza", e a doutrina da carne Santa. Os detalhes daquele capítulo
de vergonha não devem agora ser contados, mas aqueles que conheceram os
fatos compreenderam a verdade destas palavras:
'Teorias
panteístas não são apoiadas pela palavra de Deus. ...
As trevas são seu elemento, a sensualidade sua esfera. Elas
gratificam o coração natural, e dão margem à inclinação." -
Review and Herald, 21 de janeiro de 1904, pág. 9. - L. H. Christian, Fruitage
Spiritual Gifts, págs. 291,292.
Aqueles
que aceitaram as idéias de Kellogg pareciam adotar um modo de evangelismo
agressivo que, se contrariado, poderia rapidamente se tornar em
hostilidade. Uma noite o pastor Daniells estava voltando para casa de uma
reunião de concílio outonal da Comissão da Conferência Geral. Era
outubro de 1903; o assunto no livro de Kellogg (agora impresso, contra a
recomendação denominacional) tinha se tornado uma controvérsia intensa e agitada na
igreja.
Daniells
parou debaixo de uma brilhante lâmpada na rua, para falar por uns poucos
minutos com um obreiro que cria nas opiniões de Kellogg e que estava
fazendo "tudo ao seu alcance" para difundir o livro. Os dois
homens conversaram por algum tempo, não hesitando em tentar converter um
ao outro, quando de repente o obreiro tornou-se áspero. "Você está
cometendo maior erro de sua vida", ele vociferou. "Após todo
este tumulto, algum dia desses você despertará para encontrar a si mesmo
reduzido a pó, e um outro estará liderando a causa."
"Realmente
não creio na sua profecia", Daniells replicou, então deixou escapar
um comentário posterior, na linguagem de um homem que parece ter
vislumbrado por um instante alguma coisa maior do que a sua própria
carreira. "De qualquer forma, eu preferia ser reduzido a pó fazendo
o que em minha alma creio estar certo, a andar com príncipes, fazendo o
que minha consciência me diz estar errado."
Então
ele se voltou em direção à porta da frente de sua casa para salvar o
que podia de descanso daquela atribulada noite, meditando, sem dúvida,
sobre as estranhas mudança de comportamento que acompanhavam a incursão
de seus amigos nesta nova teologia. - Daniells, op. Cit., págs. 336-337.
Aquele,
se alguém parasse para pensar sobre ele, era um dos maiores perigos que a
igreja agora enfrentava. Em última análise, a mensagem do adventismo
tinha sempre incluído o aspecto de comportamento. Temei a Deus e dai-lhe
glória. Lembra-te do dia do sábado, para o santificar. Bem-aventurados
aqueles que obedecem aos Seus mandamentos. Àquele que vencer. Àquele que
vencer...
Nada
havia de cômodo na mensagem adventista para alguém que se interessava em
aceitar o cristianismo apenas em parte. "Os que estiverem vivendo
sobre a terra quando a intercessão de Cristo cessar no santuário
celeste, deverão, sem mediador, estar de pé na presença do Deus Santo.
Suas vestes devem estar imaculadas, o caráter liberto do pecado, pelo
sangue da aspersão. Mediante a graça de Deus e seu próprio esforça
diligente, devem eles ser vencedores na batalha contra o mal. Enquanto o
juízo de investigação prosseguir no céu, enquanto os pecados dos
crentes arrependidos estão sendo removidos do santuário, deve haver uma
obra especial de purificação, ou de afastamento de pecado, entre o povo
de Deus na Terra." O Grande Conflito, pág. 424.
O
adventismo tinha levado as pessoas mais longe do que jamais haviam ido
antes, ao próprio âmago do céu, um compartimento onde uma luz ofuscante
pairava sobre um lugar chamado o propiciatório, e onde também se tornava
a descobrir uma constante eterna chamada à lei de Deus. Aqui o ato final
no plano da salvação estava agora em andamento; deste lugar vinha não
somente misericórdia, mas um novo desafio ao comportamento humano, e um
poder, nascido da fé, para viver uma vida vitoriosa. "Mediante a graça
de Deus e seu próprio esforço diligente, devem eles ser vencedores na
batalha contra o mal." Idem.
Esta
era a contribuição singular do adventismo para o mundo, a mensagem final
que colocava o arremate sobre a reforma. Por séculos os cristãos tinham
acreditado que a salvação vem da fé em Cristo. Aceitando completamente
isto, os adventistas extraíram das Escrituras uma nova dimensão que
sondava as próprias profundezas da fé: através da fé em Cristo a vida
toda poderia ser trazida em harmonia com a lei divina que mantinha o
universo unido.
E
tudo isto foi dito com um senso de urgência, como se o tempo disponível
para que uma pessoa realizasse isso fosse muito curto.
"Estamos
nos preparando para encontrar Aquele que, acompanhado por uma comitiva de
santos anjos, está prestes a aparecer ns nuvens do céu para dar ao fiel
e justo o toque final da imortalidade. Quando Ele vier não irá nos
limpar de nossos pecados, remover de nós os defeitos de caráter, ou
curar-nos de nossas enfermidades de temperamento e disposição. Se esta
obra for realizada por nós, será totalmente completada antes daquele
tempo. Quando o Senhor vier, aqueles que são santos, serão santificados
ainda." (Testimonies, Vol. 2, pág. 355).
Em
1868 num dia de verão Ellen White tinha escrito pensamentos semelhantes
em uma carta de aniversário para seu filho, na qual o amor de mãe tinha
se combinado com o inconfundível desafio da velha mensagem do advento:
"Não te enganes. Deus não Se deixa escarnecer. Nada senão a
santidade te preparará para o céu. ... O caráter celestial deve ser
adquirido na terra, ou jamais poderá ser adquirido" Testemunhos
Seletos, Vol. 1, pág. 245.
Havia
um idealismo sobre o adventismo, alguma coisa além mesmo dos sonhos dos
reformadores, que haviam iluminado o mundo com a mensagem de fé
reavivada. Lutero, Calvino, Knox - todos tinham vivido no tormentoso fim
da longa noite da história, todos empurrando para trás as sombras a seu
próprio modo, conforme as forças que lhe eram dadas por Deus. Mas agora
o dia, que começara tão cheio de promessas no século dezesseis, havia
terminado há muito.
A
história humana estava perto do fim, e os adventistas do sétimo dia
tinham uma mensagem que nunca dantes havia sido dada ao mundo. Esta geração
poderia viver durante o processo do juízo investigativo - poderia viver
para ver Jesus voltar.
Conseqüentemente
a atenção adventista tendia a se focalizar em objetivos que não mais
podiam ser postos em algum futuro confortável e distante. Para eles o
desafio era agora, e eles procuravam na bíblia exemplos do que Deus
esperava do povo que devia ser transladado ao céu sem passar pela
sepultura.
"Por
meio da transladação de Enoque, o Senhor tencionava ensinar uma lição
importante", Ellen White escreveu. "ensinava-se aos homens que
é possível obedecer à lei de Deus, que vivendo embora em meio dos
pecadores e corruptos, eram capazes, pela graça de Deus, de resistir a
tentação, e tornar-se puros e santos. ... O caráter piedoso deste
profeta representa o estado de santidade que deve ser alcançado por
aqueles que hão de ser "comprados da terra" (Apocalipse 14:3),
por ocasião do segundo advento de Cristo". (Patriarcas e Profetas,
pág. 85). E aquele padrão parecia ser uma parte da missão da igreja.
Enoque
tinha vivido na terra antes da sua destruição pela água, e sua própria
vida foi uma mensagem de misericórdia, mostrando o poder de Deus para
salvar. Agora uma destruição ainda maior se aproximava, e o mundo
merecia uma última visão clara do caráter de Deus. "Como Enoque,
advertirão o mundo da segunda vinda do Senhor, e dos juízos que cairão
sobre os transgressores; e pela sua santa conversação e exemplo condenarão
os pecados dos ímpios" (Idem, pág. 86).
Em
1902 havia ela novamente lembrado aos adventistas que "nem todos os
livros escritos poderiam substituir uma vida santa. O homens acreditarão,
não o que o ministro pregue, mas o que a igreja pratique em sua vida."
Testemunhos Seletos, Vol. 3, pág. 290.
Apesar
de tudo, os adventistas tinham feito uma das mais ousadas afirmações
jamais feitas na fé cristã. Eles reclamavam ter uma nova visão dos mais
profundos recessos do céu, onde se encontrava a norma pela qual Jesus
estava agora julgando o mundo. Os adventistas tinham redescoberto a lei, e
agora precisavam fazer alguma coisa com ela: ou tinham de vivê-la, através
do poder de Deus, ou desenvolver as melhores desculpas do mundo para o
pecado.
Havia
um perigo real de que eles pudessem ser tentados a escolher a última
alternativa. A norma que se revelava no santuário era, afinal,
excessivamente alta. Ellen White advertiu contra esta possibilidade em
termos que são difíceis de ser mal entendidos. "ninguém diga: Não
posso remediar meus defeitos de caráter. Se chegardes a esta decisão,
certamente deixareis de alcançar a vida eterna". (Parábolas de
Jesus, pág. 331).
No
importante ano de 1888, ela havia escrito pensamentos semelhantes.
"Por meio dos defeitos do caráter, satanás trabalha para obter o
domínio da mente toda, e sabe que, se esses defeitos foram acariciados,
será bem sucedido. Portanto, está constantemente procurando enganar os
seguidores de Cristo com seu fatal sofisma de que lhes é impossível
vencer" (O Grande Conflito, pág. 489).
Era
uma alarmante advertência, dirigida aos perigos que resultariam se os
adventistas alguma vez decidissem desculpar-se perante a lei em vez de
guardá-la; contudo, como sempre, sua mensagem terminaria com uma nota de
esperança: "Ninguém, pois, considere incuráveis os seus defeitos.
Deus dará fé e graça para vencê-los" (Idem).
E
a confortante garantia é dada: "Se está no coração obedecer a
Deus, se são feitos esforços nesse sentido, Jesus aceita esta disposição
e esforço como o melhor serviço do homem, e supre a deficiência, com
Seu próprio mérito divino. Ele não aceitará os que alegam ter fé nEle
e, no entanto são desleais ao mandamento de Seu Pai". Mensagens
Escolhidas, Vol. 1, pág. 382
.
Assim,
parecia ser uma missão especial para o povo que se chamava Adventistas do
Sétimo Dia, que sabiam tanto sobre o que devia logo acontecer ao mundo.
Por séculos os cristãos tinham proclamado a mensagem de fé, agora os
adventistas estavam levando avante essa mensagem a seus mais distantes
limites, exigindo da fé o máximo que ela poderia trazer: Uma mensagem de
Elias, uma mensagem que começou na terra e terminou no céu. Qualquer
coisa que desafiava essa mensagem de vitória e testemunho pessoal também
questionava a própria missão da igreja.
Nisso
jazia o perigo dos ensinos de Kellogg em 1903. "Essas doutrinas,
seguidas até suas conclusões lógicas, varrem toda a economia cristã",
a sra. White advertiu. "elas ensinam que as cenas justamente diante
de nós não são de suficiente importância para que se lhes dê atenção
especial" (Special Testimonies, Série B, n 7, p37).
A
igreja e o mundo estavam mergulhando numa profunda noite em direção a
alguma coisa chamada o fim do tempo da graça, antes do qual cada indivíduo
deveria ser examinado por Deus "com um escrutínio tão íntimo e
penetrante como se não houvesse outro ser na terra" (O Grande
Conflito, pág. 490). Quando esse evento chegasse, o destino de todos
seria eternamente decidido para a vida ou morte. Era um desafio impossível
de se exagerar.
Os
adventistas, contudo, estavam sendo embalados por teorias agradáveis
sobre a natureza de Deus, nas quais as tremendas verdades do santuário
desapareciam de vista e o Shekinah se tornava nada mais do que o brilho do
sol na primavera. Em seu desespero para advertir a igreja, alarmada pelo
poder fascinante do erro, Ellen White buscou alguma maneira de ilustrar quão
facilmente alguém poderia confundir o erro com a verdade, e ela recorreu
à ilusão ótica de dois trilhos da estrada de ferro, confundindo-se na
distância até parecerem ser um. "O trilho da verdade fica bem ao
lado do trilho do erro, e ambos os trilhos podem parecer ser um para as
mentes que não são operadas pelo Espírito Santo." Carta 211, 1903.
Então,
vendo alguns dos melhores intelectos da igreja apanhados na armadilha, e
levando outros para ela com a capacidade de eloqüência que tinha sido
uma vez devotada à mensagem adventista, ela clamou em quase total
desespero: "Minha alma fica grandemente perturbada quando vejo o
desenvolvimento dos planos do tentador, que não posso expressar a agonia
de minha mente. Precisa a igreja de Deus ficar sempre confundida pelos
ardis do acusador, quando as advertências de Cristo são Tão definidas e
claras?" Special Testimonies, Série B, n 2, pág. 23.
Junto
com a igreja que amava, Ellen White estava agora mergulhando numa crise tão
grande que ficava em dúvida se poderia sobreviver a ela. O ano de 1904 se
desvanecia rumo a 1905. Quatro preciosos anos haviam se passado, anos de
paz e abundância, e a igreja que deveria ter anunciado sua mensagem ao
mundo, lutava em vez disso contra ataques feitos às suas verdades mais
fundamentais. Sua maior instituição oscilava na iminência de se perder.
(Seria realmente perdida apenas poucos meses mais tarde, em 1906.)
O
Espírito de Profecia estava sob um crescendo de ataques, tanto aberta
quanto secretamente, por mentes capazes que eram mantidas, segundo boatos,
pelo dinheiro que entrava no sanatório de Battle Creek. Mesmo o tabernáculo
de Battle Creek, construído com o dinheiro doado por membros fiéis e
interessados cidadãos de Battle Creek era objeto de uma luta por
controle. E, nesse meio tempo, os erros estavam sendo oferecidos como uma
nova luz, de uma forma tão sutil que confundiam tanto os estudantes do
colégio quanto os obreiros amadurecidos. Como um navio, a igreja estava
agora se movendo através de um oceano traiçoeiro e nevoento, que Ellen
White viu estar cheio de icebergs.
No
Porto Arthur, o almirante Heihachiro ordena a frota japonesa para a formação
de batalha, solta seu alarido, e explode a frota báltica russa. A Rússia
entrega o sul da Manchúria; o Japão, com seu poder invencível ocupa a
Coréia. O equilíbrio do poder na Ásia cai, e as coisas nunca mais serão
as mesmas. Os eventos estão agora num movimento que não cessará até
que quase metade do mundo esteja fechado, por um tempo, para o evangelho.
Para
a igreja, os desafios estão justamente começando.
É
o tempo da segunda frente de ataque de satanás.
É
tempo de Albion Fox Ballenger.
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