A Bíblia, Nosso Credo

Ellen G. White

Quando Cristo veio para falar as palavras de vida, o povo comum O ouvia alegremente; e muitos, mesmo dos sacerdotes e príncipes, creram nEle. Mas os principais do sacerdócio e os primeiros homens da nação estavam decididos a condenar e repudiar-Lhe os ensinos. Fossem embora frustrados todos os seus esforços para encontrar acusações contra Ele, e sem mesmo poder fugir à influência do poder e sabedoria divinos, que acompanhavam Suas palavras, encerraram-se, todavia, no preconceito; rejeitaram a mais clara evidência de Seu caráter messiânico, receosos de que fossem constrangidos a se tornarem Seus discípulos. Estes oponentes de Jesus eram homens que o povo desde a infância fora ensinado a reverenciar, a cuja autoridade se havia acostumado implicitamente a curvar-se. "Como é", perguntavam, "que nossos príncipes e doutos escribas não crêem em Jesus? Não O receberiam estes homens pios se Ele fosse o Cristo?" Foi a influência desses ensinadores que levou a nação judaica a rejeitar seu Redentor.

O espírito que atuava naqueles sacerdotes e príncipes, é ainda manifesto por muitos que fazem alta profissão de piedade. Recusam-se a examinar o testemunho das Escrituras concernente às verdades especiais para este tempo. Apontam para o seu número, riqueza e popularidade, e olham com desdém os defensores da verdade, sendo estes poucos, pobres e impopulares, tendo uma fé que os separa do mundo.

Cristo previu que o fato de acatar da autoridade a que se entregavam os fariseus e escribas não cessaria com a dispersão dos judeus. Com o olhar profético viu a obra de exaltação da autoridade humana, com o fim de reger a consciência, a qual tem sido para a igreja uma tão terrível maldição, em todos os tempos. E Suas tremendas acusações aos escribas e fariseus, bem como as advertências ao povo para que não seguisse aqueles guias cegos, foram registradas como aviso às gerações futuras.

A Igreja Romana reserva ao clero o direito de interpretar as Escrituras. Sob o fundamento de que unicamente os eclesiásticos são competentes para explicar a Palavra de Deus, é esta vedada ao povo comum. Conquanto a Reforma fizesse acessível a todos as Escrituras, o mesmíssimo espírito que Roma manteve impede também as multidões nas igrejas protestantes de examinarem a Bíblia por si mesmas. São instruídas a aceitar os seus ensinos conforme são interpretados pela igreja; e há milhares que não ousam receber coisa alguma contrária ao seu credo, ou ao ensino adotado por sua igreja, por mais claro que esteja revelada nas Escrituras.

Apesar de achar-se a Bíblia cheia de advertências contra os falsos ensinadores, muitos há que estão prontos a confiar ao clero a guarda de sua alma. Existem hoje milhares de pessoas que professam ser religiosas, e no entanto não podem dar outra razão para os pontos de sua fé, a não ser o haverem sido assim instruídas por seus dirigentes espirituais. Passam pelos ensinos do Salvador, quase sem os notar, e depositam implícita confiança nas palavras dos ministros. São, porém, infalíveis os ministros? Como poderemos confiar nossa alma à sua guia, a menos que saibamos pela Palavra de Deus que são portadores de luz? A falta de coragem moral para sair da trilha batida do mundo, leva muitos a seguirem as pegadas de homens ilustrados; e, pela relutância em examinarem por si mesmos, estão-se tornando desesperançadamente presos nas cadeias do erro. Vêem que a verdade para este tempo é claramente apresentada na Bíblia, e sentem o poder do Espírito Santo acompanhando sua proclamação; permitem, todavia, que a oposição do clero os desvie da luz. Embora a razão e a consciência estejam convencidas, estas almas iludidas não ousam pensar diferentemente do ministro; e seu discernimento individual, os interesses eternos, são sacrificados à incredulidade, ao orgulho e preconceito de outrem. -- O Grande Conflito, págs. 595-597.

O Poderio do Credo

Roma privou o povo da Escritura Sagrada e exigiu que todos os homens aceitassem seus ensinos em lugar da própria Bíblia. Foi obra da Reforma restituir a Palavra de Deus aos homens; não é, porém, sobejamente verdade que nas igrejas modernas os homens são ensinados a depositar fé no credo e dogmas de sua igreja em vez de nas Escrituras? Falando das igrejas protestantes, disse Carlos Beecher: 

"Horrorizam-se com qualquer palavra rude contra os credos, com a mesma sensibilidade com que os santos padres se teriam horrorizado com uma rude palavra contra a incipiente veneração dos santos e mártires, por eles fomentada. ... As denominações evangélicas protestantes por tal forma ataram as mãos umas às outras, bem como suas próprias, que, em qualquer dessas denominações, um homem não pode absolutamente se tornar pregador, sem, de alguma maneira, aceitar outro livro além da Escritura Sagrada. ... Nada há de imaginário na declaração de que o poderio do credo está começando hoje a proibir a Bíblia tão realmente como o fez Roma, se bem que de maneira mais sutil." - Sermão sobre A Bíblia Como um Credo Suficiente, pronunciado em Fort Wayne, Indiana, a 2 de fevereiro de 1846.

Quando ensinadores fiéis expõem a Palavra de Deus, levantam-se homens de saber, pastores que professam compreender as Escrituras, e denunciam a doutrina sã como heresia, desviando assim os inquiridores da verdade. Não fosse o caso de se achar o mundo fatalmente embriagado com o vinho de Babilônia, e multidões seriam convencidas e convertidas pelas verdades claras e penetrantes da Palavra de Deus. Mas, a fé religiosa parece tão confusa e discordante que o povo não sabe o que crer como verdade. O pecado da impenitência do mundo jaz à porta da igreja. -- O Grande Conflito, págs. 388-389

Que é a Verdade?

A pergunta é: "Que é a verdade?" Não é quantos anos eu o tenho crido que o torna verdade. Deveis levar vosso credo à Bíblia e deixar que a luz da Bíblia defina vosso credo e revele suas deficiências e onde está a dificuldade. A Bíblia deve ser vossa norma, os vivos oráculos de Jeová devem ser vosso guia. Deveis cavar a verdade como a tesouros escondidos. Deveis descobrir onde está o tesouro, e então arar toda polegada desse terreno a fim de obter as pedras preciosas. Deveis explorar as minas da verdade em busca de novas gemas, de novas diamantes, e haveis de encontrá-los.

Sabeis como é com o poder papal. As pessoas não têm o direito de interpretar as Escrituras por si mesmas. Precisam de que alguma outra pessoa interprete as Escrituras para elas. Não tendes uma mente? Não tendes a faculdade do raciocínio? Deus não concedeu discernimento ao povo comum, assim como aos sacerdotes e maiorais? Quando Cristo, o Senhor da vida e glória, veio ao nosso mundo, se eles O tivessem conhecido, jamais O teriam crucificado. Deus recomendou que examinassem as Escrituras: "Porque vós cuidais ter nelas a vida eterna, e são elas que de Mim testificam." João 5:39.

Deus nos ajude a ser estudantes da Bíblia. Até que possais ver a razão para isso por vós mesmos e um "assim diz o Senhor" nas Escrituras, não espereis que homem algum interprete a Bíblia para vós. E quando podeis ver isto, vós o conheceis por vós mesmos, e sabeis que é a verdade de Deus. Direis: "Eu o li, eu o vi e meu próprio coração se apega a isso, e é a verdade que Deus proferiu para mim de Sua Palavra." Pois bem, é isso o que devemos ser - cristãos individuais. Precisamos ter uma experiência individual e pessoal. Precisamos converter-nos, como era o caso dos judeus. Se vedes uma pequena luz, não deveis recuar e dizer: "Esperarei até que meus irmãos a tenham visto." Se o fizerdes, continuareis nas trevas.

Deus nos ajude a ter conhecimento da verdade, e se tendes visto a verdade de Deus, dirigi-vos diretamente para a luz e deixai os obstáculos para trás de vós. Não façais da carne o vosso amparo; mas tende uma viva experiência por vós mesmos, e então vosso semblante brilhará com a glória de Deus. Tendes andado com Ele, e Ele vos tem sustido. Tendes lutado e pleiteado com Ele, e Ele tem permitido que Sua luz incida sobre vós. -- Fé e Obras, págs. 77 e 78.

Conclusão

Quando a Palavra de Deus for estudada, compreendida e obedecida, uma luz brilhante se refletirá sobre o mundo; novas verdades, recebidas e postas em prática, ligar-nos-ão, em fortes laços, a Jesus. A Bíblia, e a Bíblia tão-só, deve ser nosso credo, o único laço de união; todos os que se submeterem a essa Santa Palavra estarão em harmonia entre si. Nossos próprios pontos de vista e idéias não devem controlar nossos esforços. O homem é falível, mas a Palavra de Deus é infalível. Em vez de lutar uns com os outros, exaltem os homens ao Senhor. Defrontemos toda oposição, como o fez o Mestre, dizendo: "Está escrito." Ergamos o estandarte no qual está escrito: A Bíblia, nossa regra de fé e disciplina. Review and Herald, 15 de dezembro de 1885. -- Mensagens Escolhidas, Vol. 1, pág. 416