ESPAÇO JOVEM
Muitos Deuses, Nenhuma Esperança
Guilherme Silva
Era sábado à noite. Passava em frente a um hotel, no centro de
Tatuí, quando notei uma aglomeração próximo à porta de entrada.
Diminuí a velocidade do carro e pude ver garotas, com uma expressão de
ansiedade munidas de canetas, cadernetas e máquinas fotográficas,
entre outros apetrechos que caracterizam as "fãs-de-carteirinha".
Soube mais tarde que elas aguardavam, havia várias horas, a chegada do
cantor sertanejo Daniel. As mais afortunadas conseguiram, depois do
longo plantão, um autógrafo ou (a glória!) uma foto com o ídolo.
A expressão fã, segundo o Dicionário Aurélio, vem do inglês e é
uma abreviação de fanático, "admirador exaltado de certo artista
de rádio cinema, televisão, etc". Tipos fanáticos sempre
existiram. Porém, o fã é mais recente. Conforme a definição do
dicionário, ele surge com o desenvolvimento dos modernos meios de
comunicação.
Assim, a superexposição de
determinado personagem, na televisão ou em outro meio, que atua como um
palco hiperdimensionado, é um dos principais requisitos para a
proliferação do culto à personalidade. Outro aspecto que
contribui para a popularização dessa forma de "culto" é a
perda da esperança no paraíso divino. A partir do movimento iluminista,
que pretendia substituir a fé pela razão, a religião e a idéia de
uma vida eterna, no Céu, foram colocadas em descrédito. O Céu foi
trazido à Terra, e o culto à criatura assumiu o espaço do culto ao
Criador.
Hoje, os astros e estrelas que brilham nas telas do cinema e da TV e
são cultuados por milhares de pessoas, configuram o que se pode chamar
de paganismo tecnológico. Algo muito parecido com as antigas
tradições pagãs de adorar o Sol, a Lua e as estrelas. Segundo o
pensador francês Edgar Morin, Hollywood, no mundo atual,
substitui o antigo Olimpo, onde os gregos acreditavam ser a habitação
de seus deuses.
É evidente que o paganismo contemporâneo apresenta diferenças,
quanto à forma, da idolatria da antigüidade. Mas a essência continua
sendo a mesma. O amor dedicado aos novos deuses se torna um empecilho
para o desenvolvimento da relação com o único Deus. De acordo com
Ellen white, "tudo que divide as afeições ou arrebata da alma o
supremo amor de Deus ou se interpõe para evitar a ilimitada e inteira
confiança em Deus, assume o caráter e toma a forma de um ídolo no
templo da alma." - Mensagens Escolhidas, vol. 3, pág.
330.
Esse novo paganismo, que interfere na relação entre Deus e o ser
humano, aliado ao descrédito na promessa bíblica da vida eterna, no
Céu, produz, na sociedade atual,
a valorização do presente, em detrimento do passado e do futuro.
A Bíblia diz que o Deus verdadeiro e Seus mandamentos são eternos e
imutáveis. "Jesus Cristo, ontem e hoje, é o mesmo" afirma o
apóstolo Paulo, em Hebreus 13:8. Os
deuses forjados pela indústria do entretenimento, pelo contrário, são
deuses do efêmero. A todo momento surgem novos astros e estrelas que se
sobrepõem aos anteriores. "O show não pode parar" é
a lógica que domina o espetáculo.
Essa lógica ultrapassa a ficção das telas e se instala no
dia-a-dia. À medida que o momento presente é supervalorizado,
reforça-se o descrédito na promessa divina da vida eterna,
formando-se, então, um círculo vicioso.
O verdadeiro cristão, pelo contrário, tem necessidade de meditar
naquilo que Deus realizou, no passado, para conhecê-Lo melhor, no
presente, e confiar em Suas promessas, quanto ao futuro. Conforme Ellen
White, "nada temos que recear quanto ao futuro, a menos que
esqueçamos a maneira em que o Senhor nos tem guiado, e os ensinos que
nos ministrou no passado." - Testemunhos Seletos, vol. 3,
pág. 443.
Quando se perde a memória dos feitos de Deus e a confiança em Sua
atuação no futuro, surge um deus limitado ao presente, incapaz de
atender às necessidades humanas. Esse deus se manifesta apenas por meio
das sensações e dos sentimentos, promovendo a excitação dos
sentidos. Na adversidade o deus do presente não apresenta resposta.
Diante da tragédia e da morte, ele se cala.
Os falsos deuses existiram em todas as épocas, após o pecado, sob
formas variadas, com o único fim: desviar a mente do que é divino e
prendê-la ao mundano. Hoje, a
idolatria está inserida nos meios de comunicação, que estimulam o
culto à personalidade, e contagia até mesmo religiões que se dizem
cristãs, na medida em que perdem de vista o Deus que atua na
História.
Os deuses do mundo podem trazer boas sensações, mas são incapazes
de conceder a recompensa prometida pelo verdadeiro Deus: "O mundo
passa, com tudo aquilo que as pessoas desejam, porém quem faz a vontade
de Deus vive para sempre" (1 João 2:17 BLH).
- Guilherme Silva é estudante de jornalismo e assistente
de editoria na Casa Publicadora Brasileira. |