"A Igreja de Roma apresenta hoje ao mundo uma fronte serena, cobrindo de
justificações o registro de suas horríveis crueldades. Vestiu-se com
roupagens de aspecto cristão; não mudou, porém. Todos os princípios
formulados pelo papado em épocas passadas existem ainda hoje. As doutrinas
inventadas nas tenebrosas eras ainda são mantidas." O Grande Conflito,
pág. 576.
O Que o Ano 2000 Significa para a Igreja Católica
1. O Ano Santo de 2000, no qual a Igreja celebra o segundo milénio do
nascimento de Jesus Cristo, seu Senhor e Salvador, é um "ano jubilar"
e um "ano litúrgico". Estes dois aspectos não podem ser separados,
mas deverão dar vida a um único espaço de tempo, no qual se fundem, de
maneira harmoniosa, o dado cronológico presente no número 2000 e a dimensão
de mistério, própria da celebração sacramental do mistério de Cristo.
O ano do jubileu segundo a Escritura
2. Para explicar aos fiéis o significado e os valores do "Ano
Santo", costuma-se fazer referência à instituição do "ano
jubilar" do povo de Israel. Segundo o livro do Levítico, o 50° ano, ou
seja, o ano sucessivo a "sete semanas de anos" (Lv 25,8), era uma espécie
de grande ano sabático: as terras deviam repousar e, por isso, não eram
cultivadas; os campos e as casas alienadas tornavam ao primitivo proprietário,
os escravos eram libertados e os devedores insolventes perdoados.
A instituição do "ano jubilar" inspirava-se em princípios de justiça
social e recordava as origens de Israel, quando a terra prometida foi dividida
entre as doze tribos (cf. Js 13-21): a terra, pertencendo a Deus, não podia ser
cedida totalmente; a distribuição inicial do país não podia ser abolida pelo
acúmulo das propriedades de glebas em poucas mãos; os Hebreus, libertados por
Deus da escravidão do Egito, não podiam ser escravos de patrões terrenos.
3. A celebração do "Ano Santo" recorda também o "ano de graça",
inaugurado por Jesus na sinagoga de Nazaré (cf. Lc 4, 16-20), e o "ano de
misericórdia", que o vinhateiro pediu ao proprietário da vinha, na
expectativa de que o figo estéril desse fruto (cf. Lc 13, 5-9).
Jesus é o Messias, o Ungido do Senhor que, segundo a palavra profética, foi
"enviado para evangelizar os pobres [...] e para proclamar um ano de graça
do Senhor" (Lc 4, 18-19; cf. Is 61, 1-2).
Jesus é também, de maneira manifesta, o vinhateiro da parábola que pede ao
proprietário - o Pai, rico de misericórdia (cf. Ef 2,4) - um "ano de
misericórdia", na expectativa de que o figo estéril - o homem infiel à
Aliança - produza frutos de santidade e de justiça.
O ano 2000, caracterizado pelo grande sinal do segundo milénio do nascimento do
Messias Salvador, é aquele "ano de graça" e aquele "ano de
misericórdia", sempre actuais, nos quais o homem é chamado a acolher a
boa nova e a se converter a Deus. Se não houver acolhimento da Palavra e
conversão, não se pode falar de um verdadeiro ano de graça, nem de um ano de
misericórdia e nem tampouco de um ano jubilar.
O "Calendário do Ano Santo de 2000" e as suas características
4. O "Calendário do Ano Santo de 2000" é um instrumento com o
qual, seguindo o ritmo do ano litúrgico, são indicadas as principais celebrações
que acontecerão durante o "ano jubilar": da missa da noite do Natal
do Senhor (24 de Dezembro de 1999), quando terá lugar a abertura do Ano Santo,
até o dia 6 de Janeiro de 2001, solenidade da Epifania, data do encerramento do
Grande Jubileu em Roma.
5. As celebrações possuem uma índole tríplice:
- litúrgicas, constituindo a trama essencial do Calendário, cujos pontos
culminantes são a Páscoa do Senhor (23 de Abril) e, em harmonia com o projeto
do Grande Jubileu, o ciclo da Manifestação do Senhor com as solenidades do
Natal (25 de Dezembro), da Epifania (6 de Janeiro) e a solenidade da Anunciação
do Senhor (25 de Março);
- jubilares, relacionadas com as tradições próprias dos anos santos, que
implicam sobretudo celebrações penitenciais e peregrinações de fiéis, que,
habitualmente, pertencem a uma mesma comunidade eclesial ou possuem particulares
laços profissionais ou existenciais (jubileu dos trabalhadores, dos
desportistas, dos doentes, dos prisioneiros...);
- eclesiais, referentes às tradicionais "Dias" (Dia dos jovens, das
famílias...) ou a acontecimentos habituais da vida da Igreja (congresso eucarístico
internacional, congresso mariológico-mariano internacional...), ou relacionadas
ainda com eventos e situações que a Igreja deverá comemorar e viver, segundo
as indicações traçadas pelo Santo Padre na carta apostólica Tertio Millennio
Adveniente, como a memória dos "novos mártires" (cf. TMA, n. 37).
Os aspectos catequético, missionário e social, são oportunamente realçados
no Calendário, no qual são previstas celebrações particulares, que visam
sensibilizar os cristãos e a opinião pública acerca desses importantes temas
do Magistério eclesial.
6. Estes três tipos de celebração coincidirão com frequência, de maneira
que uma mesma celebração litúrgica se revestirá de uma pluralidade de
aspectos. É necessário, portanto, que em cada celebração eles sejam
propostos e vividos de maneira harmoniosa e segundo a hierarquia dos valores: o
aspecto litúrgico, na medida em que se refere ao mistério de Cristo, deverá
ter sempre o máximo relevo; o aspecto jubilar, objetivando o acolhimento da fé
e a conversão, deverá ser proeminente em relação ao aspecto associativo, que
deverá ser preparado e celebrado espiritualmente.
Um Calendário "sacramental"
7. O ano litúrgico é celebração, no contexto do ano solar, do mistério
integral de Cristo: "da Encarnação e Natividade até à Ascensão e à
expectativa da feliz esperança e do retorno do Senhor". Os sacramentos,
por sua vez, são "sinais santos", "ordenados à santificação
dos homens, à edificação do Corpo de Cristo e, enfim, para dar glória a
Deus". Possuindo sempre uma referência aos mistérios salvíficos
realizados por Cristo, eles configuram o discípulo ao Mestre. Por isso, no
"Calendário do Ano Santo de 2000" é prevista a celebração solene
de todos os sete sacramentos: do Baptismo de crianças (9 de Janeiro); do
Baptismo de adultos, da Confirmação e da Eucaristia na Vigília Pascal (23 de
Abril); da Penitência na terça-feira da Semana Santa (18 de Abril) e nas
celebrações penitenciais próprias do Jubileu; da Unção dos enfermos na memória
de Nossa Senhora de Lurdes (11 de Fevereiro), "Dia dos doentes"; da
Ordem sagrada na solenidade da Epifania (6 de Janeiro) para as ordenações
episcopais e no Quarto Domingo de Páscoa (14 de Maio) para as ordenações
presbiterais; do santo Matrimónio no 28° Domingo do tempo ordinário (15 de
Outubro), em concomitância com o "Jubileu das famílias".
Deste modo, o "Ano do Grande Jubileu" propõe-se como um ano no qual
os fiéis, plenamente orientados ao Pai por Cristo no Espírito, participam, com
plena fé e com um novo ardor, na celebração dos sacramentos, fontes inexauríveis
de graça e de salvação.
Um Calendário romano
8. O "Calendário do Ano Santo de 2000" é eminentemente romano.
Por motivos históricos, a partir do momento em que o acesso dos fiéis a
Jerusalém e aos lugares santos começou a ser difícil, Roma tornou-se a
principal meta de peregrinação. Bonifácio VIII (+1302), que promulgou o
primeiro "Ano Santo" da história em 1300, com a bula Antiquorum habet
(22 de Fevereiro de 1300), imprimiu ao ano jubilar uma forte caracterização
romana.
O carácter romano do "Calendário do Ano Santo de 2000" é dado:
- pelo facto de que o Santo Padre é o Bispo de Roma, Sucessor do Apóstolo
Pedro e, portanto, participante do primado que o Senhor lhe conferiu para o
serviço da Igreja universal. No Calendário, no entanto, não é explicitamente
indicada a presença do Santo Padre nas celebrações do Grande Jubileu; ela será
indicada em cada caso pelo Departamento das Celebrações Litúrgicas do Sumo
Pontífice;
- pelas memórias insignes das quais Roma é guardiã: em primeiro lugar, as dos
Santos Apóstolos Pedro e Paulo, que nela anunciaram a Boa Nova e, com o martírio,
deram testemunho fiel do Senhor Jesus; em seguida, as dos inumeráveis Mártires
que, a começar pelos Protomártires Romanos (séc. I), confessaram a sua fé em
Cristo com a palavra, a conduta e o sacrifício da própria vida.
Um Calendário universal
9. A singular condição da cidade de Roma, sede episcopal do Romano Pontífice,
e o facto de que, pela primeira vez, o Jubileu se celebra simultaneamente em
Roma, na Terra Santa e nas Igrejas locais, fazem com que o Calendário não seja
apenas romano, mas dirigido à Igreja inteira. Portanto, o Calendário é
apresentado como modelo para que, através do exemplo indicativo das celebrações,
se torne instrumento de comunhão para toda a Igreja, envolvendo as Igrejas
locais, de maneira que todos os fiéis, ao celebrarem o mistério de Cristo,
possam sentir a unidade na fé.
Para alcançar este objectivo, o Comité Central colocará à disposição das
Igrejas locais uma série de subsídios litúrgicos que, oportunamente adaptados
aos usos e tradições locais, constituirão um forte traço de união entre as
Igrejas locais e Roma.
Outro sinal da universalidade e da unidade da fé será dado pela pluralidade de
participação: cada celebração "romana" será universal porque
abrangerá representações das diversas nações e das distintas realidades
eclesiais.
O envolvimento dos fiéis de todo o mundo tornar-se-á possível também através
dos modernos meios de comunicação social, que promoverão a feliz participação
a tudo o que se celebrará em Roma durante o "primeiro Jubileu da era telemática".
Enfim, a universalidade será tornada visível também pelas celebrações em
todos os ritos litúrgicos. O "Calendário do Ano Santo de 200" não
podia ignorar essa admirável realidade eclesial, que manifesta a catolicidade
da Igreja. São previstas, portanto, celebrações nos ritos: sírio-oriental, sírio-antioqueno
(2), alexandrino-etiópico, copta, arménio, bizantino, ambrosiano e moçárabe.
Um Calendário ecuménico
10. Com referência ao grave problema da divisão dos cristãos, o Santo
Padre escreve na Tertio Millennio Adveniente: "Precisamente
sob a vertente ecuménica, este será um ano muito importante para juntos
voltarem o olhar para Cristo, único Senhor, com o compromisso de se tornarem um
só, nos termos da sua súplica ao Pai. O destaque da centralidade de Cristo, da
Palavra de Deus e da fé não deveria deixar de suscitar interesse e acolhimento
favorável nos cristãos de outras Confissões" (n. 41).
O "Calendário do Ano Santo do 2000" acolheu este desejo do Santo
Padre e da Igreja inteira. Nele já são
previstos alguns encontros importantes, num contexto ecuménico. Outros, como o
desejado encontro pan-cristão, poderão ser incluídos. Existem contatos com as
demais Igrejas e Comunidades eclesiais. Também as Igrejas locais são
convidadas a procurar, juntamente com os irmãos cristãos, possíveis formas de
celebrações comuns durante o Ano Santo, que possam tornar-se ocasião de
encontro, de oração e de diálogo entre todos os cristãos.
Um Calendário atento à piedade popular
11. Um calendário litúrgico, por sua natureza, não contém indicações
relativas aos exercícios de piedade. O "Calendário do Ano Santo de
2000", no entanto, apresenta-as. Deve-se-o ao facto de que não poucos
exercícios do "ano jubilar" - procissões, celebrações
penitenciais, adoração eucarística, Via Sacra - têm uma matriz popular.
Dessa forma, para as sextas-feiras da Quaresma e para outros dias marcados pelo
mistério da paixão de Cristo, o Calendário prevê o piedoso exercício da Via
Sacra, como também para algumas festas e memórias da Mãe do Senhor a recitação
do Santo Rosário.
É de desejar que as celebrações penitenciais do 2000, além de visarem a
conversão individual, tenham como objectivo o pedido de perdão pelos
comportamentos e maneiras de ser que exigem conversão (cf. TMA, nn. 34-36).
Um Calendário atento à figura e à missão da Mãe de Jesus
12. No evento comemorativo do Grande Jubileu do 2000 - a encarnação do
Verbo e o nascimento de Cristo - Maria de Nazaré teve um papel essencial: na
encarnação acolheu o Filho de Deus, em nome e representando o seu povo e a
humanidade; no parto, deu-o à luz, apresentou-o ao mundo, pôs-se ao serviço
da obra salvífica de Cristo. A carta Tertio Millennio Adveniente refere-se a
isso diversas vezes e observa que "a
afirmação da centralidade de Cristo não pode [...] ser separada do
reconhecimento do papel desempenhado pela sua santíssima Mãe" (n.
43).
Para realçar de maneira adequada o papel desempenhado pela Mãe do Salvador, a
forma mais simples e melhor é a de celebrar com a devida atenção, segundo o
ritmo do ano litúrgico, as festas da Virgem santíssima que têm uma relação
mais estreita com o mistério da encarnação do Verbo e do nascimento de
Cristo, na perspectiva deste ano jubilar.
Deste modo, o Jubileu de Cristo, espontaneamente, por força da união indissolúvel
do Verbo divino e da Virgem, justamente no mistério do Natalis Domini,
tornar-se-á também, por assim dizer, um Jubileu da Mãe.
ROGER CARD. ETCHEGARAY
Presidente do Comité Central
e do Conselho de Presidência
CRESCENZIO SEPE
Secretário Geral do Comité Central
e do Conselho de Presidência
Vaticano, 21 de Maio de 1998, Solenidade da Ascensão do Senhor
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