A Nova Ordem Internacional, ou a Guerra à Liberdade de Pensar

O discurso da Casa Branca é uma nova versão do pensamento único · Não admite discussão nem dissidência

OSVALDO TCHERKASKI. Da Redação do Clarín.

Tempo estimado de leitura: 4'46''

Aquele que pensa é um terrorista. Ou melhor, quem agora se recusar a ver o mundo como a Casa Branca diz que é deverá enfrentar a possibilidade certa de morte e destruição. Esta foi a primeira frase da resposta militar que o alto comando norte americano lançou sobre o mundo inteiro logo após a devastadora operação suicida que terça-feira passado destruiu as Torres Gêmeas de Wall Street, símbolo e sede do capitalismo universal, e golpeou o Pentágono, símbolo e sede da superioridade militar norte americana.

O lançamento da segunda fase parece iminente e promete ser não só devastadora senão indiscriminada; em primeiro lugar contra o Afeganistão, onde se refugia o multimilionário saudita Osama bin Laden, caracterizado como o Satanás do século XXI, a quem se está responsabilizando pelo ataque terrorista com aviões de carreira norte americanos, senão que também pode incluir países como Iraque, Sudão e acaso Paquistão, que ocupa uma posição estratégica, ao sul do Afeganistão, segundo "vazamentos" difundidos na sexta-feira pelo diário "The New York Times."

Ao identificar o terrível ataque terrorista com o estalido da Terceira Guerra Mundial, o governo do presidente George Bush filho, deixa de lado sutilezas diplomáticas e acordos internacionais de respeito e neutralidade às fronteiras nacionais.

O mais impressionante dessa reação bélica, é que não se conhecem evidências nem resultados de investigações sobre as causas, origem e os responsáveis da tragédia do dia 11, como tampouco se conhece, ainda, quantas vidas foram ceifadas nos lugares atacados.

Por outro lado, tivemos e seguimos tendo nas imagens da TV uma cobertura que repete o modelo da Guerra do Golfo, de 1991: a transmissão em cadeia de imagens vistas desde o princípio, neste caso as que reproduzem "ao vivo" o impacto dos aviões contra as Torres Gêmeas, os resgates entre os escombros de um extremo de Manhattan, ou os rostos e gestos dos altos comandantes norte americanos ao fazer declarações. Salvo alguma exceção — no lugar de George Bush pai, George Bush filho, como presidente —, o elenco que desfila nas telas da TV é o mesmo daquela da cruzada contra Saddam Hussein.

Outra coincidência: como então, os diários norte americanos tampouco investigam o que sucedeu, nem recorrem a fontes independentes da máquina que se pôs em marcha, para elaborar a informação e entrever seu real sentido; atuam como a TV, segundo o disposto pelo alto comando de Washington, sua nova política exterior e sua inflamante doutrina estratégico-militar.

Sexta-feira, a redação do diário "O Globo", do Rio de Janeiro, analisava um vídeo que poderia revelar que as cenas que correrram o mundo mostrando um grupo de palestinos, no Líbano, festejando o atentado de terça-feira, eram de 1991, referentes à celebração da invasão do Kuwait por parte do Iraque.

Foi o que fez a CNN durante a Guerra do Golfo, ao pôr na tela pássaros cobertos de petróleo, como vítimas de um derramamento "provocado" pelo Iraque, porém que eram originalmente do desastre de 24 de março de 1989, no qual o navio "Exxon Valdez" derramou 42 milhões de litros de petróleo no Alasca, contaminando 1.600 km de costas e provocando a morte de milhares de animais.

Entretanto, aconteceu que nos Estados Unidos e na Alemanha foram detidos cidadãos de origem árabe, "identificados" como terroristas pertencentes ao grupo ou à organização que atuou no dia 11, que deveriam ser postos em liberdade porque restou evidente que não tinham nada a ver com os fatos. Quer dizer: basta ser árabe, professar a fé islâmica ou vestir sua indumentária tradicional para ser vítima de discriminação e ser exposto à agressão.

Ao mesmo tempo, o diário romano "la Repubblica" revelou em sua edição de sexta-feira, que após o Boeing ter sido desviado em Washington para atacar o Pentágono, houve uma chamada telefônica para a Casa Branca para advertir que o avião presidencial "Air Force One" seria atacado. O detalhe insólito, atribuído às conseqüências da globalização tecnológica, segundo o FBI, é que essa denominação do avião foi emitida no código secreto que a identifica.

As eventuais conexões ou ramificação no interior norte americano com o aparato logístico dos terroristas, que este detalhe permite concluir, nem sequer é mencionada como parte de uma investigação, cuja natureza mesma se desconhece. O célebre lingüista norte americano Noam Chomsky, mostrou uma vez mais sua coragem intelectual, ao declarar nestes dias que o horror que se abateu no dia 11 sobre seu país "é um presente" para a extrema direita, que sonha com impor um sistema total de controle e militarização do mundo.

Naturalizou-se rapidamente a noção de que na nova ordem mundial que se está erigindo, haverá supressão "inevitável" das liberdades individuais e da soberania dos Estados, e quem não se alinhar com os EUA será como suicidar-se. Em agosto de 1998, os EUA descarregaram uma chuva de mísseis sobre o Sudão e Afeganistão, em represália por atentados cometidos contra suas embaixadas no Quênia e na Tanzânia. Porém, um mês depois, soube-se que aquela decisão de bombardeio não se baseou em prova alguma.

A nova versão do pensamento único, que não admite discussão nem dissidência, como ocorreu durante a década de 90, ao impor-se a economia de mercado como opção excludente da humanidade, e que desde então lança ao sofrimento ou à morte por fome grande parte da população planetária, transformará também em delito pensar de outra maneira?

A vingança sangüinária e espetacular é tão arcaica e incivilizada quanto o fanatismo. Traduzidos aos termos do discurso, o fanatismo que move o terror e seus kamikazes, facilita as coisas, sobretudo torna desnecessário pensar: todos respondem a uma ordem simplista, esquemática e maniqueísta, onde o principal é odiar e sentir-se implacável. Washington decidiu adotá-lo como condição de eficácia para o combate contra o terrorismo em cada rincão do planeta?

Entre as modificações que aportaram na última década do século XX, figura o fato de que o poder de decisão passou da mão dos dirigentes políticos para as corporações de negócios. Com o que, como acaba de advertir o dramaturgo norte americano Arthur Miller, é um poder fora de controle.

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