Aposentadoria do Papa
Já é Discutida Abertamente
no Vaticano

Jeff Israely

Cidade do Vaticano - Tendo sido ator na juventude, o papa João Paulo 2º sabe que um simples gesto pode tocar uma platéia. O papa sempre encontrou uma forma de fazer com que o mundo prestasse atenção aos seus gestos, fosse por meio de um aceno rústico para um homem do campo na Polônia comunista, em 1979, ou pelo ato de enfiar uma pequena nota manuscrita no Muro das Lamentações, em Jerusalém, duas décadas mais tarde. Mas, na semana passada, João Paulo, 81, foi quem ficou na platéia.

Sofrendo dem uma artrite no joelho direito e de sintomas de mal de Parkinson, o papa, pela primeira vez durante o seu pontificado, saiu da ribalta e deixou que outros conduzissem várias das mais importantes missas da Semana Santa. Segundo a versão oficial do Vaticano, o papa simplesmente está com um joelho problemático e por isso se movimentava vagarosamente em meio à rigorosa agenda da Semana Santa. Mas alguns membros do círculo interno da Igreja estão se perguntando se não se chegou a um limite neste pontificado de 23 anos, já que cada vez fica mais patente a fragilidade do papa.

A aposentadoria do Papa, um assunto que já foi um tabu, é uma possibilidade que tem sido ouvida abertamente em alguns círculos do Vaticano. Embora a aposentadoria papal seja permitida, segundo as leis da Igreja, ninguém renunciou ao papado desde Gregório 12, no século 15.

Após João Paulo ter se mostrado incapaz de liderar uma procissão no domingo, Vittorio Messori, um comentarista católico que já entrevistou o papa várias vezes, escreveu um artigo de primeira página para o jornal de Milão Corriere della Sera que traz as primeiras questões abertas sobre o assunto, provenientes da ala conservadora da Igreja. "Mesmo com toda a confiança no Espírito Santo, será que a Igreja pode conviver com tal incerteza?", questionou um cardeal, que não quis ser identificado.

Além das obrigações litúrgicas do papa, há também questões relativas ao seu controle sobre as atividades diárias do Vaticano, incluindo críticas segundo as quais ele estaria muito debilitado para responder de forma satisfatória aos recentes escândalos de pedofilia que atingiram a Igreja. Messori diz acreditar que o papa não tem planos para interromper as suas atividades, mas acrescenta: "Há muita gente no Vaticano se perguntando se ele é capaz de levar as suas tarefas a cabo".

Nos últimos anos, o papa foi altamente capaz de superar a saúde em declínio e cumprir uma pesada agenda de trabalho. Mas, na semana passada, a história foi diferente. O papa foi carregado até a Basílica de São Pedro em uma plataforma móvel. E, embora ele tenha participado das cerimônias da Páscoa e lido várias homilias do alto do seu trono aveludado, João Paulo 2º permaneceu à margem dos rituais da missa, que foi celebrada por cardeais proeminentes. Um dos gestos anuais mais apreciados pelo papa sempre foi a lavagem dos pés de 12 sacerdotes, na Quinta-Feira Santa, simbolizando o ato de humildade de Jesus perante os apóstolos nas vésperas da crucificação. Mas o frágil pontífice teve de deixar a lavagem cerimonial a cargo do secretário de Estado do Vaticano, cardeal Angelo Sodano, e do cardeal francês Roger Etchegaray.

Um oficial do Vaticano disse que tais exceções à tradição papal não têm precedentes. "Eles fizeram com que uma outra pessoa celebrasse a missa e depois passaram o microfone para o papa a fim de que ele dissesse algumas palavras mágicas - foi um fato estranho para o ritual católico", disse ele à Time. "Se uma pessoa não é capaz de celebrar a missa, ela não é capaz de celebrar a missa e ponto final. E não há indicações de que ele seja capaz de celebrá-la no ano que vem."

Um pontífice pode renunciar ao papado caso acredite que isso atenda aos interesses da Igreja. Em tal caso, um novo papa seria eleito pelo método tradicional, que consiste de um conclave do Colégio de Cardeais. Entre as questões mais difíceis em tal cenário está aquela sobre o papel desempenhado por João Paulo 2º na escolha do seu sucessor.

Mesmo assim, é possível que se esteja subestimando a capacidade de recuperação de João Paulo 2º, capacidade esta já demonstrada após uma tentativa de assassinato em 1981, uma cirurgia de câncer do cólon em 1992 e um fêmur fraturado em 1994. Os próximos testes pelo qual vai passar a sua saúde ocorrerão fora de Roma.

O papa agendou uma série de viagens ao exterior nos próximos meses, incluindo uma visita de dez dias, no final de julho, ao Canadá, ao México e à Guatemala. Se ele prosseguir com os planos de viagem, João Paulo talvez tenha de levar consigo uma cadeira de rodas, uma possibilidade que aparentemente não é motivo de embaraço para este que foi o primeiro papa a ser fotografado em um leito hospitalar.

Mais importante do que as pernas do pontífice é a sua mente. E esta, até o momento, parece estar bem. Messori, que recentemente estudou a história da saúde papal, diz que ele tem "fé na proteção do Espírito Santo". De todos os males que acometeram os papas nos últimos dois mil anos, diz ele, não há um só registro de que um pontífice tenha sido tomado pela demência. (Tradução: Danilo Fonseca)

Fonte: http://www.uol.com.br/time/ult640u116.shl

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