Quinta-feira, 15 de Junho de 2000

THE NEW YORK TIMES


Teoria economica explica opções religiosas

Por Virginia Postrel

Na quarta-feira, a Convenção Batista Sulista votou a favor de uma emenda à sua declaração oficial de fé que afirma que a Bíblia proíbe as mulheres de serem pastoras. Embora cada congregação batista seja autônoma e a convenção não possa impedir uma igreja local de ordenar ou contratar uma mulher como pastora, o pronunciamento oficial é geralmente considerado um símbolo importante do crescente conservadorismo da denominação.

Os críticos também consideram o gesto como um marketing de má qualidade. Numa pesquisa do Gallup de maio, 71% dos americanos que expressaram preferências religiosas disseram que eram favoráveis a "ter mulheres como pastoras, ministras, sacerdotes ou rabinas em sua própria fé ou denominação''.

Conseqüentemente, disse a organização Gallup, ao aprovar a nova declaração, os batistas sulinos estariam "fora de compasso com a expressiva maioria absoluta'' dos americanos religiosos.

Para Laurence Iannaccone, contudo, a votação batista faz parte de uma estratégia racional, não sendo necessariamente um sinal de maior conservadorismo. Iannaccone, da Universidade de Santa Clara na Califórnia, foi pioneiro na aplicação da teoria econômica à religião. Sua pesquisa examina de que maneira os indivíduos fazem escolhas racionais entre as alternativas religiosas e como as religiões competem naquele que é, graças à Primeira Emenda, o mercado mais livre da nação.

Entre as perguntas que ele explorou estão por que as igrejas rigorosas -aquelas que de alguma forma limitam as atividades dos membros fora da igreja- são fortes e como as igrejas conservadoras se adaptam quando as normas sociais se tornam mais liberais. As duas perguntas são relevantes aos problemas enfrentados pelos batistas sulinos, uma denominação moderadamente rígida que é o maior grupo protestante da nação.

O rigor pode se manifestar em restrições dietéticas, roupas distintivas, separação geográfica ou proibição de atividades como dança ou bebida. Também pode acarretar exigências como colocar os filhos na escola da igreja, observar dias santos exclusivos ou comparecer aos serviços de quarta-feira à noite, além dos serviços de domingo.

Tornar-se membro de um grupo rígido pode parecer irracional quando existem alternativas menos custosas. "Por que se tornar um mórmon ou um adventista do sétimo dia'' -quanto mais aderir a um assim chamado culto- "quando os metodistas e presbiterianos esperam de braços abertos?'', escreveu Iannaccone em "Why Strict Churches Are Strong'', um artigo de 1994 da revista "American Journal of Sociology".

Sua resposta é que os altos custos filtram e deixam de fora os ``aproveitadores'', os membros vadios que, do contrário, tirariam proveito dos benefícios da igreja sem contribuir com energia, tempo e dinheiro. Se todo mundo no grupo precisar pagar um preço visível, os aproveitadores não irão se dar ao trabalho de ingressar no grupo e um núcleo de pessoas empenhadas não acabará fazendo todo o trabalho. Inicialmente, o grupo poderá atrair menos membros, mas ficará mais forte com o passar do tempo. O caráter distintivo também dá as pessoas um motivo para afiliação e um senso de camaradagem. Por que fazer parte de um grupo religioso se ele é idêntico ao restante da sociedade?

Mas uma igreja não poderá sobreviver se o custo de afiliação for demasiado elevado, especialmente se quiser atrair membros de grupos sociais que têm outras oportunidades. Ao elevar os custos das velhas regras, a mudança social impõe um desafio expressivo aos grupos religiosos conservadores. É mais difícil os membros descobrirem um meio-termo feliz entre os ideais da igreja e as normas sociais, porque os dois estão agora muito afastados entre si. Opiniões ou práticas que em tempos passados estavam próximas da tendência principal se tornam transviadas -e custosas.

"Ao contrário do que imagina a maioria das pessoas, uma igreja conservadora de sucesso precisa se adaptar constantemente à mudança social'', disse Iannaccone. As igrejas que não evoluem perdem os membros, especialmente entre os jovens, e atraem menos convertidos. "O truque'', enfatiza ele, "é não se adaptar tão rapidamente ou tão completamente a ponto de perder todo o caráter distintivo''. Uma igreja de sucesso manterá aquilo que ele chama de uma "brecha ótima'' entre suas normas e as da sociedade. Em nenhum lugar isto é mais claro que no papel feminino em mutação.

Em um artigo de 1990, Iannaccone e sua mulher, Carrie A. Miles, uma psicóloga social, estudaram a reação da Igreja Mórmon ao movimento das mulheres. Eles combinaram uma cuidadosa análise da literatura da igreja desde os anos 50 até meados dos anos 80 com estatísticas sobre rituais em templo realizados por membros mais jovens e mais recentes e aqueles realizados pelos mais antigos. A estatística dos rituais mede o grau de compromisso religioso dos dois grupos demográficos.

Sua análise expôs o ato equilibrador da igreja: retórica severa no curto prazo e acomodação gradual a longo prazo. Esta estratégia é parecida com a maneira ótima de manter os membros mais antigos, sem alienar os mórmons mais jovens ou os novos convertidos.

Durante todo o período, a igreja defendeu o ideal de uma família chefiada por um marido, com uma esposa dona-de-casa em tempo integral e muitos filhos. Era mais provável que a literatura da igreja martelasse a questão do lar durante os anos 60 e 70, que durante os anos 50, quando as normas sociais gerais não eram muito diferentes das concepções dos mórmons. Mas com o correr do tempo, a igreja começou a permitir exceções à idéia de que as esposas não deveriam trabalhar: para viúvas e mulheres cujos maridos eram deficientes, para mulheres que rezassem por suas carreiras e tivessem a permissão de Deus e de seus maridos para trabalhar e, eventualmente, para mulheres cujos filhos estivessem crescidos.

Nos anos 80, a família ainda era um ponto primordial, mas o ideal do trabalho das mulheres tinha mudado. "Eles admitiram que as mulheres deveriam ter carreiras antes de terem filhos e depois que seus filhos estivessem crescidos, e que deveriam fazer coisas que mantivessem vivas as suas aptidões enquanto estivessem em casa com os filhos'', disse Miles. "E as mulheres mórmons estão trabalhando no mesmo ritmo que todas as outras pessoas''.

Para os batistas sulinos, a história é bem parecida. Longe de serem mantidas em casa, as mulheres batistas dirigem muitas das operações da denominação e têm aspirações de carreira semelhantes àquelas das não-batistas. Escolher como limite que as mulheres não podem exercer as funções de pastor, argumenta Iannaccone, é uma maneira barata de preservar ao caráter distintivo da igreja e, ao mesmo tempo, acomodar silenciosamente as mudanças sociais mais amplas.

``A mulher comum não quer ser sacerdote ou pastora'', disse ele. ``A mulher comum quer uma carreira e a igreja permitiu isso. Vinte ou 30 anos atrás, as pessoas conversavam seriamente sobre os homens serem as autoridades dentro de casa. Agora falam sobre 'liderança servil' e quando você esmiúça toda essa linguagem, ela é praticamente vazia de conteúdo. Elas não dizem que os homens deveriam sempre tomar as grandes decisões dentro de casa''.

Em um mercado dinâmico, mesmo as fés mais conservadoras precisam se adaptar àquilo que as pessoas querem. Mas isso não significa abrir mão de seu caráter distintivo.

Tradução: Vera de Paula Assis

Fonte: http://www.uol.com.br/times/nytimes/ny1506200005.htm 

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