Um presságio antes do fim
No ano 70 d.C., Jerusalém já vivia dias de angústia. A cidade estava sitiada pelas legiões romanas, a fome consumia famílias inteiras e a esperança parecia cada vez mais distante. Foi nesse cenário que, segundo antigas testemunhas, os céus da Judeia se transformaram em palco de visões aterradoras.
Entre os vários relatos preservados, um chama a atenção pela dramaticidade. O escritor latino conhecido como Pseudo-Hegesipo, no século IV, afirma que “depois de muitos dias apareceu uma certa figura de tamanho tremendo, que muitos viram”. Não era um homem comum, tampouco um animal. Era algo colossal, monstruoso, que pairava como uma sombra sobre a cidade. A aparição foi considerada um sinal do céu, um aviso de que algo ainda mais terrível estava por vir.
Exércitos entre as nuvens
Logo após essa visão colossal, o espetáculo no céu se intensificou. O mesmo Hegesipo descreve que carros e tropas armadas apareceram repentinamente nas nuvens, como se exércitos invisíveis marchassem no ar e cercassem cidades inteiras.
Essa parte do relato encontra paralelo direto no que escreveu Flávio Josefo, testemunha ocular da guerra: “Antes do pôr do sol, viram-se carros e tropas de soldados, em suas armaduras, correndo pelas nuvens e cercando cidades” (Guerra dos Judeus VI.5.3). Para ele, não havia metáfora ou alegoria — eram acontecimentos registrados como fatos testemunhados por muitos.
O bispo Eusébio de Cesareia, três séculos depois, confirma em sua História Eclesiástica que “viram-se carros e tropas armadas em pleno ar, por toda a região”, preservando o impacto dessa visão coletiva.
O choque das tropas celestes
Se Josefo fala de tropas em marcha, o historiador romano Tácito vai ainda mais longe. Escrevendo em sua História (V.13), ele afirma que foi vista no céu “a visão de exércitos em conflito e de armas cintilantes”. Não apenas movimentos de guerra, mas batalhas travadas entre forças invisíveis, um choque cósmico refletido nas nuvens.
Para os romanos, acostumados a interpretar presságios, a mensagem era clara: os deuses estavam abandonando Jerusalém. Para os judeus que resistiam dentro da cidade, era um sinal de terror, uma confirmação de que o juízo se aproximava.
Um prenúncio apocalíptico
A sequência é impressionante:
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Primeiro, a figura gigantesca que paira como sombra sobre a cidade (Hegesipo).
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Depois, os exércitos em marcha nas nuvens (Josefo e Eusébio).
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Por fim, a batalha celeste entre exércitos inimigos (Tácito).
Os sinais no céu se tornaram parte inseparável da memória da queda de Jerusalém. Foram lidos como o cumprimento das palavras de Jesus: “Haverá grandes sinais do céu” (Lucas 21:11).
Mais do que história, uma advertência
Seja visto como fenômeno sobrenatural, ilusão coletiva ou símbolo de guerra espiritual, o relato permanece impactante. Em plena guerra, quando homens já se matavam nas ruas, o próprio céu pareceu travar uma batalha sobre a cidade santa.
O surgimento da figura gigantesca e a guerra nos céus ficaram marcados como presságio do juízo divino — um anúncio que, segundo a tradição cristã, não se limitava àquele tempo, mas apontava também para o futuro, quando novamente o céu se abrirá e exércitos celestiais antecederão a vinda gloriosa de Cristo.