Jornalista condena parcialidade da Revista Adventista em matéria sobre vacinas

Extraído da seção de comentários ao artigo “A pandemia, a mídia e o movimento antivacina”, referenciado abaixo:

 
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Prezado Márcio, esta matéria foi extremamente tendenciosa, pois apresentou apenas um lado (dos que defendem a vacina) que interpretou os movimentos antivacinas de forma única e distorcida. Vale lembrar que este posicionamento unilateral com respeito ao conhecimento científico é o que tem transformado a “ciência” em dogma/crença. A ciência está aí para um ciclo permanente entre dúvida, questionamento, discussão e pesquisa e não para estabelecimento de certezas que se transformam em verdades comunicadas e divulgadas como absolutas e inquestionáveis. Defendo que pesquisadores que possuem uma visão diferente sobre este assunto, ou qualquer outro, também devem ser chamados para uma entrevista.

 

Olá, prezado Leandro! Obrigado pela audiência e por seu comentário! Sobre o ponto que você levanta, o objetivo principal do episódio foi fazer um balanço da cobertura da imprensa nesse primeiro ano da pandemia (com base no olhar de um especialista em crítica de mídia) e mostrar como a propagação intencional de desinformação sobre as vacinas nas mídias sociais prejudicou o trabalho da imprensa e, consequentemente, a sociedade. Com esse objetivo em mente, na segunda parte do podcast nos concentramos somente na análise de discursos negacionistas que, por não terem fundamento e contrariarem a ciência e a própria posição da igreja (que incentiva a imunização/vacinação responsável, mas respeita a decisão de cada um), não mereceriam um contraponto. Quem sabe, em algum momento possamos pautar um episódio sobre os “dogmas na ciência”, embora já tenhamos tocado um pouco nesse assunto na reportagem intitulada “Fé na ciência”, publicada na edição de fevereiro. Um abraço! Atenciosamente, Márcio Tonett

 

Márcio, grato pelo retorno. Quero ainda considerar a sua afirmação: “Com esse objetivo em mente, na segunda parte do podcast nos concentramos somente na análise de discursos negacionistas que, por não terem fundamento e contrariarem a ciência (…) não mereceriam um contraponto.”. Ao meu entender, é uma afirmação equivocada; pois, muitos destes supostos “negacionistas” (que levam este rótulo) também possuem fundamentos científicos e bom-senso em seus discursos (diferente do que foi mencionado sobre a pesquisa realizada pela Unicamp que, a princípio, me pareceu bastante limitada e tendenciosa).

Dentro de uma das abordagens dos estudos da “Ciência, Tecnologia e Sociedade” se entende que mesmo as posições, aparentemente, mais absurdas, também devem ser consideradas na discussão e as pessoas que defendem tais posições devem fazer parte da discussão. Afirmar que tais posicionamentos não mereçam um contraponto, ao meu ver, é um erro, tornando o assunto um dogma.

UMA ILUSTRAÇÃO COMPARATIVA: talvez a crítica que faço fique muito evidente dentro do âmbito adventista ou religioso, quando ateus (ditos cientistas) simplesmente desconsideram a Teoria do Design Inteligente ou até mesmo caçoam do relato bíblico sobre a Criação do Mundo; mesmo tendo evidências que também apontam para outras possibilidades além da Teoria do Evolucionismo. Por que não considerar, dentro da ciência, outras evidências que dão suporte a outras explicações para a origem da vida além do Evolucionismo? Cientistas criacionistas ou da Teoria do Design Inteligente não merecem a oportunidade de se expressarem apresentado seus contrapontos, seja numa revista científica, em um congresso e mesmo dentro da grade curricular de qualquer Universidade, seja ela pública ou particular?

Comecei a pensar nisso durante uma disciplina que participei no LABJOR/UNICAMP e um dos artigos que apresentei foi o que segue no link: http://melhorviver.com.br/2…

Então, porque nem mesmo as centenas ou milhares de artigos científicos que apresentam diversas problematizações com respeito às vacinas são considerados pela esmagadora maioria dos “supostos cientistas”?

Se também existem evidências científicas que apontam diversas problematizações com respeito às vacinas, porque a Igreja Adventista do Sétimo Dia toma um posicionamento à favor do uso das vacinas? Não seria melhor apresentar as duas formas de se entender o assunto e deixar que cada pessoa e família tome a sua decisão?

Fonte: https://www.revistaadventista.com.br/marcio-tonetti/destaques/a-pandemia-a-midia-e-o-movimento-antivacina/

Leia o artigo mencionado e produzido pelo jornalista leitor da Revista Adventista:

Criacionismo e Design Inteligente: crença, ciência ou Bem Viver?

1. Introdução

No semestre passado, ao pesquisar um pouco sobre letramento científico, encontrei um hangout da “Associação Racionalista de Céticos e Ateus” onde três jovens e mais um público indireto conversavam com o professor Roelf Cruz Rizzolo e defendiam a necessidade do letramento científico da população e também demilitavam e criticavam o que é ou não é ciência e como isso influenciava de forma positiva ou negativa a vida do cidadão. Reconhecem que a possibilidade de acesso à informação é realmente necessária para a democratização do conhecimento; no entanto, percebem a necessidade de filtragem destas informações, afirmando que há muita “bobagem” nisso tudo (ARCA, 2015).

Por outro lado, há que compreender e aceitar que a existência da pluralidade de conhecimentos e formas de se entender o mundo podem diferir dos pressupostos conferidos pela “ciência” ou também diferir das tão reverenciadas “comprovações científicas” tidas, comumente, como a última palavra do que é verdade ou mentira. Do contrário, corre o risco de se estabelecer uma espécie de filosofia (crença/dogma) que rege o pensamento científico.

A ciência busca entender os fenômenos, realidades e acontecimentos do mundo natural e das culturas por métodos específicos que, a princípio, não deveriam servir para dizer o que serve ou não como verdades, pois resultam, comumente, na exclusão e etnocídio de inúmeros povos milenares que deveriam ser focos de ‘estudo científico livre de preconceitos’, pois estas culturas, talvez, tenham muito mais a dizer para a ciência, do que esta para elas.

2. Ciência neutra?

Talvez, muitos ainda entendam a ciência como imparcial, objetiva, neutra e, assim, não estaria sujeita a interferências políticas, econômicas, sociais e culturais. No entanto, a sociologia da ciência começou a estudar o comportamento desta ciência levantando sérios questionamentos que desfazem esses pressupostos:

“Após o período de institucionalização desse campo de pesquisa, parte da agenda dos estudos CTS logrou mostrar que a construção do argumento verdadeiro de determinada controvérsia científica é muito mais o resultado de negociaçõesacordosinterpretações e concessões sobre resultados e objetivos da pesquisa (…) do que a perfeita representação de um fato natural. A controvérsia é um tipo de ação intrínseca à ciência, principalmente quando o centro da disputa argumentativa envolve conhecimentos ainda não assegurados. É no meio destas incertezas que as decisões são tomadas no processo de estabilização de um conhecimento (…). É difícil amarrar todos os pontos desta intriga de bastidores ante um determinado conhecimento, um procedimento técnico, coerente o bastante, entre um nível de validação, para uma maioria apontar a racionalidade de sua aceitação (PREMEBIDA, 2011, p. 29, 30 e 33 – grifos meus)”.

A partir deste pressuposto de “ciência pura”, ter acesso ao letramento científico significaria ter acesso aos conhecimentos exclusivamente feitos por esta ciência e consequentemente se limitaria às pesquisas realizadas no campo da Biologia, Química e Física por meio de estudos experimentais. Tudo que não esteja dentro deste conceito passaria a não ser validado e, assim, também, não faria nenhum sentido usar esta ciência cartesiana para provar determinadas tradições e crenças como a teoria do criacionismo bíblico e tampouco a teoria da evolução. Afinal, não é possível reproduzir a criação ou a evolução dentro de um “tubo de ensaio” e, sendo assim, a ciência se vê na obrigação de estabelecer “mediante acordos e negociações” de qual teoria é aceita ou não.

Por outro lado, já houve pesquisas, como a medição do Carbono 14 bastante contraditória, onde fósseis de dinossauros estudados apresentaram uma datação de apenas milhares de anos (FISCHER, s/d; TRUETHATIZ, 2012) ou o achado de tecidos moles em um chifre de Tricerátops que indicaria uma idade bem mais recente para estes répteis, contrapondo os milhões de anos utilizados e defendidos pelos evolucionistas (ARMITAGE, 2013; KEMP, 2014).

A partir disso, ter  a teoria da evolução como ciência no âmbito acadêmico/científico é equivalente a ter uma filosofia dogmática (uma inevitável interferência política, econômica, social e cultural) que não permite outras abordagens científicas, por mais fundamentadas que estejam. Talvez, este fenômeno represente “uma espécie de religião da ciência” e/ou uma forma de governo, nomeando-se aqui como “ateucracia”.

3. Dois grandes nomes da teoria da evolução e o que pensam sobre o Desing Inteligente

O próprio pai da teoria da evolução, Charles Robert Darwin, deixou a marca do DI no último parágrafo do seu livro “Origem das Espécies”; talvez, já entendendo a dificuldade de explicar o acaso no surgimento dos microrganismos unicelulares a partir de matérias inorgânicas e destes seres unicelulares à origem de toda a biodiversidade encontrada no mundo há muito tempo:

“Há uma grandiosidade inerente a esta visão da vida: o Criador concentrou os diversos poderes da vida num pequeno número de formas, ou apenas numa; e enquanto este planeta girava de acordo com a lei da gravitação universal, a partir de um princípio tão simples, foram desenvolvidas, e continuam a desenvolver-se, infinitas formas do mais belo e maravilhoso que há (DARWIN, 2009, p. 419 – grifos meus)”.

Apesar de permanecer firme de que a origem da vida no universo tenha se iniciado pelo acaso (teoria evolucionista) e mesmo que reconheça que ninguém saiba como isso aconteceu, Clinton Richard Dawkins durante uma entrevista com o apresentador Ben Stein, reconheceu a possibilidade de que uma inteligência superior (mais evoluída) possa ter dado origem à vida no Planeta Terra:

“- (…) como é que foi criada? Bem, humm… Por um processo muito lento. – Bem, como é que começou? Ninguém sabe como é que começou. Sabemos o tipo de acontecimento que deve ter sido. – Para a origem da vida. – Qual é que foi? Foi a origem da primeira molécula auto-replicativa. – Certo, e como é que isso aconteceu? Já lhe disse, não sabemos. – Então não faz a menor ideia de como começou? Não, não. Nem eu nem ninguém. Nem mais ninguém. – O que pensa da possibilidade de o ‘Design Inteligente’ poder se tornar na resposta para algumas das questões em genética ou na evolução? Pode ser que se venha concretizar da seguinte forma. Pode ser que num dado momento nos primórdios, em alguma parte do universo, uma civilização tenha evoluído por algum processo Darwiniano até um elevado, muito elevado nível de tecnologia e tenha desenhado uma forma de vida que tenham semeado, talvez, neste planeta. Agora, essa é uma possibilidade e uma possibilidade intrigante, e penso que é possível obter alguma evidência para isso. Se olharmos para os detalhes… Detalhes da bioquímica, biologia molecular, poderemos encontrar a assinatura de alguma espécie de desenhador (…). E que esse desenhador pode ser uma inteligência superior de um outro lugar no universoBem… Mas essa inteligência superior teria ela própria de ter surgido por algum processo explicável em última instância. Não poderia ter surgido em existência por um salto espontâneo. Essa é a questão (FRANKOWSKI, 2008)”.

4. Publicações científicas (Criacionistas e DI)

Os “cientistas evolucionistas” questionam o fato dos criacionistas ou cientistas que estudam o Design Inteligente (DI) nunca terem publicado um artigo científico em uma revista de prestígio; mas, é exatamente este acordo e concessão científica que parece não permitir tais publicações, pois iriam contra suas “crenças” acadêmicas.

Uma alternativa para a publicação destes artigos, talvez seja escrevê-los sem nenhuma espécie de viés criacionista ou de DI, como ocorreu com o cientista Mark Hollis Armitage, responsável pelo achado de um chifre de Tricerátops que apresentava tecidos moles (já mencionado anteriormente) e publicou a pesquisa na revista Acta Histochemmica; mas, de qualquer forma veio a ter problemas com o seu local de trabalho sendo despedido (ARMITAGE, 2013; KEMP, 2014).

A questão de liberdade de pensamento, que rege a pesquisa científica, parece não ter mais importância no meio acadêmico.

No ideal acadêmico científico, esperar-se-ia um posicionamento cético (não quer dizer ateu*) onde se coloca todas as possibilidades, debate-se sobre elas, negando ou comprovando transitoriamente as teorias e ao mesmo tempo mantendo-se interrogações/dúvidas (ceticismo científico) que permitam a continuidade/progressão saudável do conhecimento ao longo do tempo, principalmente no que se refere a temas questionáveis como a teoria da evolução e o DI.

5. “Evangelização ateia” por meio do letramento científico

Para o grupo do hangout, a meu ver, se pessoas, religiosas ou não, entenderem ser o criacionismo ou o Design Inteligente a explicação para a origem da vida e usam os conhecimentos científicos para fundamentarem a teoria criacionista, isso seria uma espécie de aberração ou um desvio absurdo dos propósitos da ciência. Assim, Rizzolo afirma que o criacionismo não é um assunto a ser debatido no meio acadêmico, com exceção se for dentro de um contexto onde a proposta seja o estudo das sociedades e dos indivíduos e se tenha, então, uma importância essencialmente antropológica sobre o assunto, além de enfatizar, como já mencionado no início, a necessidade de levar o letramento científico, principalmente às crianças; o que lembra uma espécie de “evangelização” do ateísmo por parte de cientistas que “creem” na inexistência de um Deus.

“Uma sociedade que não é letrada cientificamente é alvo de manipulação e é incapaz então de decidir de forma consciente assuntos extremamente complexos (…). Seria um enfrentamento entre formas fundamentalistas de compreender a realidade, de compreender o mundo em que vivemos. Formas fundamentalistas, fundamentalmente baseadas em crenças; mas em crenças e não em evidências (…). Em parte, se deve a que não estamos fazendo a coisa certa, no sentido de levar a cultura da ciência, despertar o pensamento crítico nas crianças que depois vão ser os adolescentes e que depois vão ser os adultos (…). Não estou dizendo que o letramento científico leve necessariamente a uma falta de religiosidade. Não tem nada haver um assunto com o outro. Mas, leva a uma falta de debate, leva a uma falta de pensamento crítico de poder separar uma coisa de outra (…). Debate com criacionistas é porque não é uma questão a ser debatida, porque é uma postura científica de um lado (…). Então se a gente não prestar atenção na forma, não tiver uma integração destes espaços formais, espaços não formais, o que for nesta fase da vida, de forma a estimular a curiosidade, a dúvida, o questionamento, o pensamento crítico, você vai ter adultos, sei lá, acreditando que Noé viveu 900 anos! Estes dias estava tendo uma discussão e quando eu falo que não precisa debater com essa turma do Design Inteligente, porque acho que são maluquices inofensivasO problema nosso é esse criacionismo mais tosco! No meio acadêmico esses grupos são desprezados mesmo, esses grupos são menosprezados. Não que sejam menosprezados, não é levado a sério mesmo! Coisa pretensiosa de colocar uma tentativa de dar uma pincelada científica no criacionismoCosmogonias criacionistas diferentes da ciência são relevantes, são importantes. Elas dizem muito das sociedades e das pessoas que vivem nas sociedades. Agora, não é ciência! Não podemos confundir as coisas. Se fica claro na universidade pública que isso é assim, então não tem problema. Essa é a minha visão (ARCA, 2015 – grifos meus)”.

Estas colocações afirmam a existência de um regimento dentro da ciência que pode ser chamado de filosofia ateísta que se impõem contra outras formas de se entender o mundo e de se obter o conhecimento. Tudo o que não estiver dentro dos parâmetros estabelecidos ou convencionados não é ciência e, qualquer estudo científico que faça referência a um possível “Deus Criador” passam a ser proibidos, “menosprezados” e “não são levados a sério”.

É uma briga interminável entre criacionistas e evolucionistas, entre crentes e ateus, entre os defensores de políticas de direita e os de esquerda e entre os pesquisadores das ciências biológicas e sociais. Um pensamento tentando ter razão sobre o outro e buscando ganhar mais adeptos, ao invés de procurar entender cada teoria sem posicionamentos pré-estabelecidos e dogmáticos de cunho evangelizador (“levar as boas novas” de alguma informação que acham de extrema importância).

6. As complexidades das teorias e os pressupostos científicos não permitem tomar partido

Reduzir a ciência a um tubo de ensaio ou a métodos laboratoriais de estudos controlados é no mínimo um pensamento absolutamente reducionista, sendo que, apesar de sua importância, não reflete a realidade dos acontecimentos e dos processos naturais que sofrem as mais variadas interferências ambientais. Além disso, como já dito, repetir e provar a criação ou a evolução em um laboratório não é possível; o que torna tanto uma como a outra teoria em crenças, filosofias ou teorias científicas que carecem de métodos científicos compatíveis com as suas complexidades inerentes.

Neste ponto, talvez, o criacionismo tenha uma vantagem, pois os escritos bíblicos comparados com os achados arqueológicos têm demonstrado coerências, apesar das controvérsias que são levantadas. Por outro lado, a teoria da evolução carece do “elo” de ligação da raça humana aos seus supostos ancestrais; mas, explica com detalhes, inúmeros fenômenos adaptativos dos organismos vivos, incluindo o homem.

No anseio por encontrar mais evidências, as pesquisas têm contribuído com o acréscimo de conhecimentos que buscam entender as possíveis origens da vida e, nenhuma destas explicações deveriam ser descartadas, principlamente quando a “vaidade por querer ser o dono da verdade” ou quando concessões, negociações, interesses políticos, econômicos e financeiros são os aspectos a ser considerados nestas decisões “científicas”.

7. O Bem Viver

As argumentações do conceito de Bem Viver também criticam as posturas criacionistas, apesar de defender a liberdade e a incorporação de múltiplas culturas que contribuem para as suas propostas.

Novos conceitos têm sido trabalhados onde a ciência passa a ser vista como uma das formas de se entender o mundo dentre tantas outras existentes. Sendo assim, os conhecimentos populares e as tradições passam a ter grande valor para a construção do conhecimento.

“(…) a ciência é ensalsada pelo poder dos ‘patrões’ da estrutura global de poder político e econômico, que financiam a investigação e extensão. O domínio de tal discurso sobre todas as formas de conhecimento distinto ao científico convencional tende a excluí-los aos espaços da mitologia e da superstição; o enfoque agroecológico pretende resgatá-las e revalorizá-las, consciente de que o conhecimento local, camponês e indígena que reside nos grupos locais, adequadamente potenciado, pode encarar a crises de modernidade, ao possuir o controle de sua própria reprodução social e ecológica (GUZMÁN, 2006, p. 205 – grifos meus)”.

Alberto Acosta, no seu livro O Bem Viver, traz uma profunda análise sobre os conceitos de “Bem Viver” e uma série de questionamentos sobre a situação atual da sociedade capitalista contida em um ciclo vicioso de produzir mais para consumir mais, tendo como consequência o detrimento da natureza e mostrando a necessidade do homem se ver como parte da mesma. Assim, o “Bem Viver” vai contra a tendência que está levando à destruição da natureza e da própria economia que a rege.

No entanto, no intuito de colocar o legado científico como algo que tem a sua  importância, afirma que o cristianismo, dentro de um fato histórico inegável, foi prejudicial à liberdade dos povos e contribuiu na destruição dos recursos naturais. Menciona também os grupos criacionistas que ainda existem nos Estados Unidos como místicos, irracionais e que fundamentalistas religiosos se irritam com as teorias de Darwin:

“Se é verdade que Charles Darwin (1809-1882), ao narrar sua viagem no navio Beagle, teceu frequentes comentários sobre os recursos da América, incluído o uso do guano no Peru, sua principal motivação, como logo se viu, era estudar a origem e a evolução das espécies. (…) há algo belo e admirável na luta da razão científica contra o dogma religioso, como foram os casos de Galileu Galilei (1564-1642) e do próprio Darwin. Conhecer as transformações sofridas pela espécie humana desde sua primeira forma de vida, passando pelos macacos, é um resultado da ciência ocidental (em plena era imperialista) que irrita os fundamentalistas religiosos, mas que não contradiz – pelo contrário, apoia – o sentimento de reverência e respeito à Natureza (ACOSTA, 2016, p. 103 – grifos meus)”.

“Quando se propõe os Direitos da Natureza, não se trata de renunciar ao amplo e rico legado científico – nem muito menos à razão – para refugiar-nos, em nossa angústia e perplexidade pelo rumo das coisas, em misticismos antigos ou novos, ou em irracionalismos políticos: recordemos que ainda existem nos Estados Unidos grandes grupos criacionistas que renegam Darwin, como fizeram os bispos vitorianos de seu tempo (ACOSTA, 2016, p. 104 e 105 – grifos meus)”.

“(…) em nome do poder imperial e da tiveram início uma exploração sem misericórdia de recursos naturais e a destruição de muitas culturas e civilizações (ACOSTA, 2016, p. 105 – grifos meus)”.

Seguramente, a vinda dos cristãos ao ocidente foi devastadora e isso não pode ser negado. No entanto, esta visão de direito à exploração dos recursos naturais com se fossem inesgotáveis e de tratar os nativos como meros animais/escravos não são preceitos legítimos da cultura cristã original e muito menos são ideias contidas no texto bíblico; mas, são de influências posteriores pelo convívio cristão com outras culturas como as que continham a filosofia grega e mais recentemente por influências do pensamento capitalista que são aspectos criticados por Acosta e outros autores que escrevem sobre o Bem Viver. No entanto, estes autores misturam ou confundem pensamentos gregos e capitalistas com interpretações incorretas da Bíblia como conceitos externos e anacrônicos trazidos para interpretarem o texto bíblico de acordo com conceitos posteriores que apoiam suas ideias iniciais (NASCIMENTO, 2017).

A motivação inicial de Darwin não foi estudar a origem e a evolução das espécies em suas viagens; mas, por ter tido uma forte paixão pelos estudos e observações da natureza foi em busca de novas experiências que o levou a determinadas conclusões.

Darwin, também nunca afirmou que a raça humana surgiu dos macacos ou tenha passado pelos macacos como descreve Acosta. No entanto, isso não invalida que Darwin, em suas teorias, realmente expresse um sentimento de reverência e respeito à natureza e, como já foi colocado, também manifestou a possibilidade de uma mente inteligente (o Criador) que poderia ter dado início ao processo evolutivo (DARWIN, 2009, p. 419).

Outro aspecto a ser observado é que grupos criacionistas (não necessariamente fundamentalistas) que estão por todo o mundo, não somente nos Estados Unidos, que renegam Darwin não necessariamente renunciam ao legado científico e à razão e, mesmo que renunciassem, não se trataria, na atualidade, de misticismo ou irracionalidade; mas, de uma teoria, de um conhecimento popular ou de uma crença que, segundo as próprias propostas de “Bem Viver”, também deveria ser respeitado dentro de suas próprias propostas:

“(…) fortalecer os valores básicos da democracia: liberdade, igualdade e solidariedade, incorporando conceitos da vida em comunidade. Nestas novas formas de vida, sobre bases de verdadeira tolerância, haverá que se respeitar, por exemplo, a diversidade de opções sexuais e de formas de organização familiar e comunitária (ACOSTA, 2016, p. 40 – grifos meus)”.

Por outro lado, a história também deixa evidente que Darwin, em sua época, foi fortemente criticado e ridicularizado por seus contemporâneos e pelos caricaturistas que o desenhavam com um corpo como os dos peludos macacos. Provavelmente, estes caricaturistas eram religiosos que menosprezavam as teorias darwinianas e que mal a entendiam. Em paradoxo, se diziam cristãos e herdeiros de uma vida eterna no paraíso. Além disso, os dogmas religiosos da esposa de Darwin, a levaram a uma terrível angústia, pensando que não passariam a eternidade juntos (MOROWITZ, 1998).

8. Considerações finais

São dois lados da mesma moeda da falta de respeito, falta de amor ao próximo com um excesso de vaidade e orgulho. O lado científico influenciado por uma filosofia Darwiniana menosprezando e ridicularizando a possibilidade do criacionismo ou do DI como uma teoria científica e “boicotando” os estudos que os sustentam e, do outro lado, um extremo religioso zombando e desvalorizando de evidências científicas. Assim, ambos são prejudicados para a construção de um conhecimento científico transdisciplinar e de fundamentos religiosos mais completos e significativos para uma humanidade atual que necessita de explicações razoáveis que dão suporte à fé; catacterizando-se assim, uma fé prática e não mística.


Referências bibliográficas

ACOSTA, Alberto. O bem viver: uma oportunidade para imaginar outros mundos. São Paulo: Autonomia Literaria, 2016. PDF.

ARMITAGE, Mark Hollis; ANDERSON, Kevin Lee. Soft sheets of fibrilar bone from a fossil of the supraorbital horn of the dinosaur Triceratops horridus. Acta Histochemica. Jul 13, 115 (6), p. 603-608. Disponível em: <http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0065128113000020> Acesso em: 04/07/2017. PDF.

ARCA. Letramento científico e percepção pública da ciência com Roelf Cruz Rizzolo. Associação Racionalista de Céticos e Ateus, 27 jun 15.  Disponível em: <https://youtu.be/iXtN5fd6zBU> Acesso em: 28/06/2017. TrechosCitação.

DARWIN, Charles. A origem das espécies. 1ª Ed. Portugal: Planeta Vivo, 2009 (E-book). PDF.

FISCHER, John Michael. Carbon-14-dated dinosaur bones are less than 40,000 years old. New Geology. Dispnível em: <http://newgeology.us/presentation48.html> Acesso em: 04/07/2017. PDF.

FRANKOWSKI, Nathan (produtor). Expelled: No Intelligence Allowed. Documentário, 1h 37min, 2008. Disponível em: <https://www.youtube.com/playlist?list=PL979FEC70B8065644> Acesso em: 04/07/2017. Trecho.

GUZMÁN, Eduardo Sevilla. Perspectivas agroecológicas 1. Barcelona, ES: Icaria Editorial S. A., 2006. PDF.

KEMP, Christopher. University sued by creationist: Microscopist’s wronful-dismissal case faces long odds. Nature. 6 nov 14, vol. 515, p. 20. Disponível em: <http://www.nature.com/news/university-sued-after-firing-creationist-fossil-hunter-1.16281> Acesso em: 04/07/2017. PDF.

MOROWITZ, Noah (produtor). Charles Darwin: a voz da evolução. 44 min. Estúdio Log On Filmes. BIO. The Biography Channel, 1998. Disponível em: <https://youtu.be/pnNCFrWsivM> Acesso em: 29/06/2017. Trechos.

NASCIMENTO, Leandro Bolina. Tabela comparativa sobre os questionamentos do Bem Viver em relação à Bíblia e à Filosofia Grega. Hortolândia: Melhor Viver, 2017. Disponível em: <http://melhorviver.com.br/wp-content/uploads/2017/06/Tabela-Comparativa-Bem-Viver.pdf>. PDF.

PREMEBIDA, Adriano; NEVES, Fabrício Monteiro; ALMEIDA, Jalcione. Estudos sociais em ciência e tecnologia e suas distintas abordagens. Sociologias. Porto Alegre, ano 13, nº 26, jan./abr. 2011, p. 22-42. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/soc/v13n26/03.pdf> Acesso em: 06/07/2017. PDF.

TRUETHATIZ. Carbon-14 dated dinosaur bones – under 40,000 years old. Carbon-14 dating of bones from 8 dinosaurs – August 15, 2012 presentation by Dr. Thomas Seiler at the AOGS-AGU (WPGM) 2012 conference in Singapore. Disponível em: <https://youtu.be/QbdH3l1UjPQ> Acesso em: 04/07/2017. Link.

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* O ateu “crê” que Deus não existe, portanto é uma filosofia dogmática, uma crença. Desta forma, o ateu contraria a ideia do cético que duvida de tudo e consequentemente também questiona a inexistência ou a existência de Deus.


Leandro BolinaLeandro Bolina

Jornalista e fundador do Jornal Online MELHOR VIVER.

 

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