Apresentação

Na mais recente publicação de Hermano de Jesus Cordeiro, o leitor é conduzido por uma jornada sombria e eletrizante em Ecos do Subsolo, um ainda protótipo de romance-documental que entrelaça fatos, nomes, símbolos e denúncias reais com ficção. A pergunta inevitável ecoa desde a primeira página: e se tudo isso for verdade?
Inspirado por documentos confidenciais, mensagens anônimas e evidências à margem da grande mídia, o livro ainda em rascunho, produzido com apoio de inteligência artificial acompanha a investigação de Robson Ramos, ex-pastor e jornalista de 60 anos, em sua descoberta de uma rede clandestina global dedicada à clonagem humana — com centros ocultos sob bases militares subterrâneas conhecidas como DUMBs (Deep Underground Military Bases).

ECOS DO SUBSOLO
Rascunho desenvolvido pelo ChatGPT 4o para Hermano de Jesus Cordeiro
Capítulo 1 – A Verdade Está Abaixo de Seus Pés
Cinco da manhã. Chuva fina sobre Goiânia. Robson Ramos, ex-pastor e jornalista investigativo, preparava o café quando ouviu o sinal de nova mensagem em seu computador.
O remetente era desconhecido. O título do e-mail: “A verdade está abaixo de seus pés”. O corpo da mensagem trazia apenas um link para um arquivo criptografado. Contra seu instinto, clicou.
Horas depois, com a ajuda de softwares antigos de decodificação, acessou um dossiê repleto de documentos, fotos e plantas subterrâneas de bases militares. Havia nomes, datas, e sobretudo… uma revelação: a clonagem humana já era realidade, conduzida em complexos secretos chamados DUMBs (Deep Underground Military Bases).
As imagens mostravam cápsulas com corpos idênticos a políticos, celebridades, militares. Alguns já estavam mortos na superfície — mas seus “sucessores” continuavam em atividade.
Robson empalideceu. E sabia: essa história não era para qualquer um.
Capítulo 2 – Ecos na Penumbra
Nos dias seguintes, Robson cruzou as informações do dossiê com fontes que colecionava ao longo da carreira. Velhos contatos na área médica, um ex-militar reformado, um programador anônimo do fórum OmegaNews.
Todos confirmaram aspectos daquilo que ele lera. Um ex-geneticista, sob anonimato, revelou que clones humanos podiam ser produzidos em 4 a 6 meses, com vida útil reduzida. Seu cérebro, embora biologicamente funcional, era condicionado desde cedo com dados comportamentais — um “download de personalidade”.
Outros depoimentos afirmavam que alguns clones degeneravam rápido, desenvolvendo falhas mentais, enquanto os mais bem sucedidos assumiam funções públicas, sem jamais serem descobertos.
Na parede do escritório de Robson, fotos de celebridades e políticos agora se organizavam como peças de um quebra-cabeça. O que ele via — ou achava ver — era uma substituição silenciosa, invisível… mas coordenada.
Capítulo 3 – A Primeira Testemunha
Durante uma conferência sobre bioética em São Paulo, Robson conheceu Evellyn, uma jovem bióloga de olhar inquieto. Ela havia trabalhado em um centro de pesquisa que supostamente investigava regeneração celular, mas a verdade era outra.
Durante um café no intervalo da palestra, ela confessou:
— Era clonagem, Robson. Eles diziam que era para órgãos, mas testavam corpos inteiros. Tive que cuidar de um que falava. Um clone de um ex-governador. Ele implorava para não ser “desligado”. Ele lembrava da infância.
A confissão gelou Robson.
— Por que está me contando isso?
— Porque estou com medo. E porque… você parece querer descobrir.
Naquela noite, Evellyn entregou um pendrive com vídeos de laboratório. Imagens de corpos emergindo de cápsulas, exames genéticos, protocolos de comportamento.
Era mais do que Robson precisava. E muito mais do que podia carregar sozinho.
Capítulo 4 – Infiltração
Munidos de documentos forjados e equipamentos ocultos, Robson e Evellyn invadiram uma antiga instalação no interior de São Paulo — hoje operada como centro de pesquisa privado.
À meia-noite, usando uma entrada de manutenção desativada, adentraram túneis subterrâneos revestidos de aço. Lá, encontraram tanques suspensos contendo fluidos verdes e silhuetas humanas.
Gravaram tudo: códigos de acesso, vozes distorcidas de cientistas, e o mais importante — imagens de um clone em estágio final, com semelhança impressionante com um conhecido político brasileiro.
Mas então, um alarme silencioso foi acionado.
Luzes vermelhas. Passos ecoando.
Escaparam por pouco, deixando para trás parte dos equipamentos, mas levando consigo provas irrefutáveis de que o Brasil fazia parte do projeto global de clonagem.
Capítulo 5 – Programação Preditiva
Depois do susto da infiltração, Robson se voltou para outra camada do controle: a cultura. Filmes, séries, livros e músicas pareciam pavimentar o caminho para a aceitação inconsciente da clonagem.
Ao rever títulos como “Clonaram Tyrone”, “Ilha” e “Star Wars: Ataque dos Clones”, percebeu algo inquietante: os roteiros não apenas mostravam clones — eles os normalizavam, desprovidos de qualquer dilema ético profundo.
Buscou então especialistas. Foi quando conheceu Sofia, doutora em semiótica, que analisava a repetição de símbolos em narrativas populares.
— Estão nos preparando há décadas — disse ela. — Os clones são inseridos como arquétipos, anti-heróis ou mártires. Tudo para naturalizar a presença deles entre nós.
Robson gravou sua fala. Sabia que agora, mais do que nunca, precisava lutar não apenas contra os laboratórios… mas contra as ideias que os legitimavam.
Capítulo 6 – Encontro com Sofia
Sofia era direta, metódica e, acima de tudo, arrependida.
— Trabalhei com eles, Robson. Participei de um projeto chamado “Janela Cultural”. Cruzávamos reações emocionais de espectadores com padrões de roteiro. As narrativas eram ajustadas para moldar aceitação.
Ela mostrou e-mails, contratos e um relatório confidencial com métricas de aceitação sobre temas como clonagem, modificação genética, e “despersonalização moral”.
Juntos, Robson e Sofia criaram um núcleo de educação crítica, organizando círculos de estudo e transmissões piratas. O objetivo era claro: reprogramar as pessoas. Não para resistirem com armas — mas com consciência.
E enquanto a mídia oficial os ignorava, sua influência crescia. Grupos começaram a surgir em diversas cidades. O silêncio começava a ruir.
Capítulo 7 – As Vozes Douradas
Em uma investigação conjunta, Robson e Sofia descobriram a existência de uma entidade oculta: a Companhia das Vozes Douradas. Sua função? Produzir roteiros, discursos e campanhas que mantivessem a “continuidade narrativa” de figuras públicas substituídas.
Descobriram que boa parte dos redatores, produtores e roteiristas da grande mídia eram, na verdade, contratados dessa companhia. E pior: muitos nem sabiam. Apenas seguiam diretrizes invisíveis, alinhadas à agenda da substituição.
Publicaram um dossiê.
No dia seguinte, Robson foi intimado por um juiz. Acusação: “difamação de órgãos públicos”.
Mas já era tarde. O povo começava a desconfiar. Vídeos antigos eram comparados com novos. Vozes e feições eram analisadas por programas caseiros.
O jogo estava virando.
Capítulo 8 – Manipulação Global
As investigações levaram Robson à análise dos financiadores. E o que descobriu foi alarmante.
Organizações como a USAID, supostamente humanitárias, investiam pesadamente em programas de “engenharia social e sanitária”. Em países da América Latina, África e Sudeste Asiático, financiavam pesquisas de “controle demográfico”.
Mas por trás dessas ações, estavam contratos com empresas privadas de biotecnologia e inteligência artificial. O elo? O uso de clones e “avatares digitais” para substituir líderes e influenciadores locais que não se alinham à narrativa global.
Robson publicou uma reportagem explosiva. E, pela primeira vez, foi citado em redes internacionais.
Estava claro: o que enfrentavam não era um governo ou uma ideologia.
Era um **sistema**.
Capítulo 9 – O Eco no Espelho
Na calada da noite, Robson ativou sua transmissão clandestina.
Transmitiu vídeos comparativos, laudos forenses, falas idênticas ditas por políticos em países diferentes. Mostrou falhas nos padrões de fala de clones digitais e vídeos corrompidos de deepfakes.
E o momento mais impactante: um clone ao vivo repetindo uma fala programada em looping, sem perceber.
As redes explodiram.
Hashtags como #QuemÉReal e #RestaUm dominaram a internet. A mídia tentou ridicularizar, mas o estrago estava feito.
Robson olhou para a câmera, e disse:
— Vocês não precisam acreditar em mim. Mas por favor… comecem a olhar com atenção.
Capítulo 10 – Infiltrados
Robson recebeu uma mensagem inesperada: “Sou do outro lado. Quero ajudar.”
Um agente infiltrado no Congresso revelou a existência de substituições diretas feitas com apoio da segurança institucional. Nomes? Joe Biden, Lula, Madonna — todos já teriam sido “substituídos” após mortes ou incapacitações.
Ele revelou também que alguns desses clones possuíam codificações de voz programadas por IA, enquanto outros eram híbridos de biologia e tecnologia.
O objetivo? Garantir estabilidade pública e execução de uma agenda de médio prazo, sem interferência de “vontades humanas”.
O agente entregou um documento que listava 41 figuras internacionais substituídas desde 1995.
Robson sabia: se isso fosse verdade, estava mexendo com o maior segredo da história moderna.
Capítulo 11 – A Preparação
Após a exposição das primeiras evidências públicas, Robson começou a notar uma mudança mais sutil e perigosa: a sua própria vida estava sendo vigiada.
Drones estacionavam sobre sua casa à noite. Emails eram bloqueados misteriosamente. Uma ex-namorada foi chamada para depor sobre sua “estabilidade mental”. A guerra contra o invisível se tornava pessoal.
Enquanto isso, ele e Sofia montaram uma nova base de operações: um porão de concreto blindado, escondido sob um prédio abandonado. Ali, armazenaram cópias físicas dos documentos mais sensíveis e organizaram o que chamavam de “linha de tempo da substituição global”.
A linha conectava eventos geopolíticos com supostas substituições: doenças súbitas, sumiços inexplicáveis, “mudanças de postura” em líderes e artistas.
Robson sentia que estava perto de algo maior. Mas ainda faltava uma peça.
Foi quando Evellyn, a bióloga, reapareceu — trazendo notícias de um homem que dizia conhecer tudo. Um ex-operador. Um traidor do sistema.
— Ele sabe onde tudo começou — disse ela. — Mas ele cobra caro. E já está sendo caçado.
Naquela noite, Robson escreveu em seu diário:
“A verdade está próxima. Mas quanto mais perto, mais a realidade parece querer se esconder.”
Ele sabia que a próxima conversa mudaria tudo.
Capítulo 12 – Os que Usam Máscaras
Robson Ramos atravessava os corredores abafados de um hotel desativado no centro de Brasília. O local, antes frequentado por parlamentares e empresários, agora era apenas um esqueleto úmido de concreto, usado para encontros que não podiam deixar rastros. Ele subia lentamente as escadas de serviço, guiado pelas instruções codificadas que recebera por e-mail de um remetente anônimo: “O que você procura está além do espelho.”
No quarto 407, uma lâmpada amarela pendia do teto como um enforcado imóvel. Um homem o esperava encapuzado, mas não armado. Seus olhos, castanhos e injetados, não pareciam buscar confiança — apenas urgência.
— Você é o jornalista? — perguntou, com voz grave e marcada pelo cigarro.
— Sou. Robson Ramos. E você?
— Eu fui agente de vigilância neural. Treinava substitutos.
Robson sentou-se devagar. Não esperava tanto.
— Substitutos? Clones?
O homem tirou o capuz. A pele em seu rosto parecia levemente artificial — como se tivesse passado por enxertos ou usado máscaras por tempo demais.
— Nem sempre são clones, Ramos. Às vezes são sósias com implantes subcutâneos, moduladores vocais, dentição replicada, memória induzida. Outras vezes… são apenas ilusões bem orquestradas. CGI, deepfakes em transmissões ao vivo, inteligências artificiais simulando presença digital.
Ele jogou sobre a mesa uma pequena caixa preta. Ao abri-la, Robson viu um pedaço de silicone moldado como um pedaço de bochecha, com fios minúsculos conectores. Um nanodispositivo.
— Isso é… rosto?
— Máscara de contato. Usada para duplicar a face de um líder sul-americano depois de sua “reabilitação”. Mas o original já havia morrido. E não foi o único.
Robson respirou fundo. Aquilo era grave demais.
— E por que agora? Por que contar isso?
O homem acendeu um cigarro com as mãos trêmulas.
— Porque a próxima substituição será total. A tecnologia de clonagem chegou a um ponto em que não é mais necessário usar um humano como base. Eles criam perfis, moldam comportamentos com algoritmos, projetam uma figura e a lançam como se fosse uma pessoa real. Uma construção midiática. Eles vão substituir não só os corpos — mas a própria ideia de identidade.
Robson anotava tudo em seu gravador. Precisava de provas, mas algo lhe dizia que este homem era uma peça-chave.
— Me dê nomes.
O ex-agente olhou fixamente para ele.
— Biden. Madonna. Lula. Essas figuras já não são o que eram. Talvez nunca tenham sido, após certo ponto. O público se acostuma com versões. Ajustes no tom de voz, pequenas diferenças na face… as pessoas não querem acreditar. Preferem a ilusão da continuidade. É mais confortável do que admitir que o mundo é manipulado como um teatro.
— E qual é o objetivo disso tudo?
— Permanência. Controle. Narrativa. Com o tempo, você não elege mais líderes. Você consome personagens. E os verdadeiros autores… permanecem invisíveis.
Robson sentiu um frio na espinha. Era como se cada notícia que já escrevera tivesse sido parte de uma farsa maior.
O homem entregou um pen drive.
— Aqui estão fragmentos de vídeos, análises biométricas, e um protocolo chamado Projeto Presença. Mas cuidado… só de saber disso, você já está sendo observado.
No instante seguinte, o ex-agente apagou a lâmpada e desapareceu pela saída de emergência.
Robson ficou ali, sozinho, com um arquivo proibido nas mãos e uma pergunta martelando em sua mente: quantos ainda eram reais?
Capítulo 13 – Projeto Presença
De volta à sua pequena redação nos arredores de Goiânia, Robson Ramos trancou todas as portas, desligou o celular e cobriu as câmeras do computador. O pen drive estava ali, sobre a mesa, como um fragmento radioativo. Tinha medo de abri-lo, mas sabia que a verdade não espera por coragem — exige ação.
Conectou o dispositivo ao notebook offline, um velho Toshiba que usava só para casos assim. A pasta principal continha um único arquivo criptografado: PRESENCA_SIGMA.ova.
Após desbloquear o arquivo com a senha fornecida pelo ex-agente — “KAIROS.Δ” — um ambiente virtual se abriu. Não era apenas um documento: era uma simulação. Uma interface gráfica com imagens, documentos classificados e modelos tridimensionais de rostos famosos, lado a lado com suas versões manipuladas. Cada imagem tinha marcações: porcentagem de semelhança, pontos de substituição facial, análise vocal, curva de aceitação pública.
No centro da tela, uma apresentação iniciava automaticamente:
Projeto Presença – Documento Confidencial Nível Ômega
Objetivo: Garantir a continuidade da influência de figuras-chave nas narrativas políticas, culturais e religiosas globais, mesmo após morte, incapacidade ou insubordinação dos indivíduos reais.
Métodos:
– Clonagem biológica (nível 4) com condicionamento neural.
– Uso de sósias combinados com próteses faciais, lentes adaptativas e moduladores vocais.
– CGI em transmissões de eventos públicos e pronunciamentos.
– IA generativa para discursos e postagens em redes sociais.
– Deepfakes híbridos com atuação humana supervisionada.
Mais abaixo, uma aba: “SUBSTITUIÇÕES CONCLUÍDAS – REGISTRO INTERNACIONAL”.
Robson clicou, e nomes surgiram um a um:
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Joseph R. Biden Jr. – Substituição estimada em 2019.
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Luiz Inácio Lula da Silva – Ativo desde 2021.
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Angela Merkel – Substituída parcialmente para encerramento de mandato.
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Madonna Louise Ciccone – A partir de 2020, versões alternadas entre sósia + CGI.
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Papa Francisco – [Classificação SIGILOSA – vaticano.ai]
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Xijin Zhong (codinome) – Clonagem experimental com IA supervisionada (dados corrompidos).
Robson sentiu um nó no estômago. Cada nome vinha com registros audiovisuais, registros médicos, gráficos de aceitação pública e evidências técnicas. O projeto era real. E parecia mais antigo do que imaginava.
A Dúvida e o Medo
Naquela noite, Robson caminhou até a varanda e olhou para o céu. O silêncio parecia pesar. Se publicasse aquilo, poderia provocar um terremoto global — mas também pintaria um alvo em suas costas. Os que controlavam o Projeto Presença não hesitariam em silenciá-lo.
Decidiu entrar em contato com Sofia, sua parceira semióloga. Enviou-lhe apenas uma mensagem:
“Recebi o que esperávamos. Projeto Presença é real. Prepare a rede.”
Sofia respondeu minutos depois:
“Compreendido. Ativando os núcleos de confiança. Mas esteja pronto. Eles virão atrás de você.”
O Começo da Exposição
Na semana seguinte, um site espelho começou a publicar, aos poucos, trechos dos documentos: comparações visuais, alterações faciais, trechos de discursos gerados por IA. Não tudo de uma vez — apenas o suficiente para semear a dúvida. O projeto precisava ser exposto com cuidado. Como um veneno administrado em doses calculadas.
Os resultados foram imediatos.
Programas de TV começaram a questionar discretamente mudanças no comportamento de certas figuras públicas. Memes viralizaram nas redes com a hashtag: #QuemAindaÉReal?.
Especialistas em linguagem corporal foram convidados para entrevistas. Mas ao mesmo tempo, começaram os ataques.
Robson teve sua conta bancária bloqueada, foi acusado de crimes cibernéticos e passou a ser seguido por carros sem placas. No entanto, algo estava diferente. Pela primeira vez, ele não estava sozinho.
Movimentos civis começaram a se organizar: Rede Kairós, Observatório Presente, Coalizão da Verdade Biográfica.
Epílogo Temporário
O Projeto Presença não havia sido destruído. Mas agora, era conhecido. E como todo sistema secreto, sua força residia no silêncio. Com a exposição gradual, a narrativa começou a se inverter.
Robson, com sua voz cansada e seus olhos atentos, tornava-se novamente uma peça incômoda no jogo de xadrez invisível que moldava o mundo. Ainda não sabiam se ele venceria.
Mas agora sabiam que ele estava jogando.
Capítulo 14 – Rastreado
A noite era úmida e silenciosa demais em Anápolis.
Robson Ramos sabia que não podia voltar para casa. Desde que começara a publicar trechos do Projeto Presença, notara padrões estranhos: o mesmo carro preto estacionado perto da antiga gráfica onde se escondia, pessoas de óculos escuros demais para o fim da tarde, conexões de rede oscilando em momentos suspeitos.
Naquela sexta-feira, o sinal era claro.
O servidor espelho caiu.
Cinco minutos depois, um drone silencioso passou pela janela.
E então, o som seco: toc-toc-toc — três batidas na porta dos fundos. Firmes, calculadas.
Robson apagou as luzes e pegou o celular reserva. Mandou uma mensagem criptografada para Sofia:
“Código Rubra. Derrubaram o espelho. Estão aqui.”
Vestiu um boné, pegou o HD externo com as provas e desceu pela escada de incêndio, pulando o último lance com um baque surdo. O estacionamento estava vazio, exceto por um Sedan preto sem placas que, assim que o viu, ligou os faróis.
Ele correu.
Não havia tempo para pensar. Precisava chegar ao ponto de extração — uma garagem abandonada a duas quadras dali, onde um carro da Rede Kairós o aguardava, com motorista treinado. Mas a cidade parecia comprimida naquela noite. Cada sombra parecia esconder um par de olhos.
Virando a esquina, ouviu os passos atrás de si. Dois homens, sem fôlego, mas determinados. Não gritavam. Eles não queriam alarde. Queriam capturá-lo silenciosamente.
Era assim que o Projeto eliminava ameaças.
Robson entrou num beco estreito, saltou uma cerca baixa e seguiu pela lateral de uma borracharia. Ao fundo, viu o brilho fraco de um farol azul — o carro de resgate. Correu. Ouviu um disparo.
O tiro não era para matá-lo. Acertou a parede ao lado. Era uma advertência.
— Para! — gritou um dos homens.
Robson girou e jogou um punhado de pregos metálicos no chão — truque antigo de jornalistas que esperam ser seguidos. Um dos perseguidores tropeçou. O outro avançou mais rápido.
A poucos metros do carro, o motorista abriu a porta.
— Sobe, agora! — gritou o homem encapuzado no volante.
Robson entrou, e o veículo arrancou com tudo, cantando pneus. O perseguidor tentou um último disparo, mas errou. O carro desapareceu em meio à neblina da madrugada.
O Refúgio Temporário
Trinta minutos depois, em uma chácara nos arredores de Abadiânia, Robson finalmente respirou.
O motorista retirou o capuz. Era Lucas, um ex-militar que agora trabalhava com a Rede Kairós.
— Você atraiu atenção demais, Ramos. O Projeto sabe que você tem o núcleo do Presença.
— Eu não podia parar. Eles estão substituindo pessoas reais. Transformando a política em teatro e a sociedade em plateia cega.
— Eu sei. Mas agora precisamos sumir com você por um tempo. Sem internet, sem sinais, sem rastros.
— Por quanto tempo?
Lucas olhou para ele com seriedade.
— Até descobrirmos quem dentro da imprensa e do governo ainda é de verdade.
Capítulo 15 – O Protocolo Espectral
Dois dias depois da perseguição, numa base improvisada sob um galpão abandonado entre Goiânia e Alexânia, Robson Ramos observava em silêncio o interrogatório de um dos homens que tentaram capturá-lo. O outro havia escapado. Este, porém, fora contido com um dardo de paralisação neural, fornecido por dissidentes da Força Nacional — agora aliados silenciosos da Rede Kairós.
O detido estava preso por algemas de selo magnético. Tinha por volta de quarenta anos, físico atlético, e um estranho implante metálico à base do crânio. Os olhos, apesar de humanos, demonstravam uma frieza sintética.
Lucas conduzia o interrogatório.
— Nome. Unidade. Origem.
O homem apenas sorriu.
— Vocês não têm ideia do que enfrentam. Isso aqui é só a superfície.
Robson interveio. Calmamente, se aproximou com um velho gravador de fita e apertou REC.
— Você não está mais no sistema, amigo. Eles te abandonaram. Nós interceptamos seu canal de retorno e o protocolo de silêncio foi ativado. Você é um fantasma. Ou coopera, ou desaparece como todos os outros.
Silêncio.
Lucas retirou da pasta um arquivo: foto de uma mulher com olhar vazio — mesma fisionomia do detido.
— Clonagem parcial? Ou só modulação? Ela foi uma das primeiras. Nome de código: J-12, jornalista da TV pública. Você era o segurança dela, não era?
O homem respirou fundo. A fachada começou a rachar.
— Não era segurança. Era operador de presença. Eu monitorava sinais de oscilação comportamental nos substitutos de classe média.
— Substitutos de classe média? — perguntou Robson, intrigado.
— Sim. O Projeto Presença não é mais limitado a presidentes ou celebridades. Agora testam replicações em jornalistas, líderes de ONGs, youtubers políticos e influenciadores religiosos. Eles chamam isso de Fase Três: Espectralização Pública.
Robson anotava tudo. A ameaça era maior do que imaginava.
— Quantos foram substituídos?
O homem hesitou, então murmurou:
— Até agora… 1.227 perfis de relevância regional foram replicados. A maioria usa uma combinação de comportamento previsível, CGI em redes sociais e backups de voz gerados por IA. Alguns têm corpos físicos — clones adultos acelerados, vida útil de até 3 anos. Depois, são reciclados.
— E o que vocês fazem com os originais? — Lucas perguntou com firmeza.
O prisioneiro o encarou. Sem desviar.
— Aqueles que não cooperam, desaparecem. Os que cooperam… vivem no subterrâneo. Literalmente. Os centros de preservação são chamados de Jardins Silenciosos. Instituições fechadas, onde os “originais” são mantidos sob sedação para fins de backup de autenticidade.
Robson sentiu um calafrio.
— Quem lidera essa operação?
O homem riu. Um riso seco e amargo.
— Ninguém que vocês conheçam. A cadeia de comando é descentralizada. O nome que usamos é simbólico: ZETA PRISMA. É o conselho que coordena as trocas. Cada célula só conhece dois níveis acima e dois abaixo.
Robson olhou para Lucas.
— Precisamos achar esses “Jardins Silenciosos”. Se resgatarmos um original vivo, a farsa cai.
O homem assentiu, vencido.
— Há um deles no subsolo de uma universidade particular em Brasília. Prédio desativado. Nome de fachada: Instituto de Neuroplasticidade Aplicada. Lá estão pelo menos sete figuras públicas. Uma delas… vocês conhecem bem.
— Quem? — perguntou Robson.
O agente o encarou.
— O verdadeiro Lula está lá.
Capítulo 16 – A Sala dos Adormecidos
A van preta parou a 600 metros da entrada lateral do antigo prédio da universidade. Era uma madrugada sem lua em Brasília. A brisa cortava seco entre os edifícios acadêmicos abandonados. Ali, sob o campus desativado do Instituto de Neuroplasticidade Aplicada, segundo o agente capturado, funcionava um centro de contenção do Projeto Presença — conhecido pelos operadores como Jardim Silencioso 3-B.
No interior da van, Robson Ramos vestia um colete tático simples e uma máscara respiratória de fibra leve. Ele não era soldado — mas exigira estar presente. Tinha que ver com os próprios olhos.
Lucas, o ex-militar que liderava a célula da Rede Kairós, revisava o plano com precisão.
— Entrada pela ala de pesquisa biomédica. Evitem o bloco B, onde sensores infravermelhos foram reativados. A subestação de energia do porão nos dará 10 minutos de blackout. Após isso, voltam os protocolos automáticos. O alvo: Sala 13 – Contenção Profunda. Sete originais em sedação assistida. Um deles: Luiz Inácio da Silva, identificação biológica cruzada com dados históricos e amostras genéticas. Precisamos tirá-lo de lá vivo.
Robson engoliu seco.
— Se for ele mesmo… o que fazemos depois?
— Mostramos ao mundo. Ao vivo. Sem filtros.
A Infiltração
Às 3h17, os sistemas do prédio sofreram o apagão programado. As portas magnéticas travaram em modo mecânico, o que facilitou a abertura com ferramentas físicas.
A equipe Kairós entrou em formação: Lucas na frente, dois especialistas em sistema no meio e Robson ao final, com câmera de ombro ativada. O corredor cheirava a desinfetante antigo e ozônio. As paredes, com tinta descascada, pareciam esconder algo mais do que mofo.
No subsolo, encontraram a primeira barreira: um scanner de retina inativo, mas com sensores auditivos ainda ativos. Um dos técnicos usou um artefato de ruído branco, enquanto o outro desativava a trava manualmente.
Quando chegaram à Sala 13, encontraram uma porta lacrada com selo biométrico triplo. Arrombaram com uma chave térmica roubada de um dos centros do Projeto.
O que viram dentro paralisou todos por um instante.
Sete cápsulas de contenção alinhadas, cada uma com um ser humano sedado em posição fetal. A luz azulada das câmaras fazia suas peles parecerem translúcidas. Acima de cada cápsula, uma placa metálica com dados codificados.
Robson se aproximou da terceira cápsula. Ali estava ele.
— É ele. Meu Deus… é ele mesmo.
Era Lula. Mais magro, com barba grisalha e sinais vitais estabilizados por uma série de cabos e monitores. Havia uma marca atrás da orelha: “ORIG-036Z/BRA”.
— Iniciar evacuação! — gritou Lucas.
Mas antes que pudessem desconectar os pacientes, um alarme mudo se ativou. Uma luz vermelha pulsou. Voz eletrônica, fria:
“Protocolo Zeta ativado. Eliminação de contingência autorizada.”
Portas de aço começaram a descer.
— Trava de extermínio! — gritou um dos técnicos.
Lucas sacou o plasma cutter e começou a romper os lacres da cápsula de Lula. Robson correu até outra cápsula — havia uma mulher com fisionomia familiar. Era uma jornalista desaparecida meses atrás. Ele forçou a abertura com as mãos, ativando o modo de emergência do sistema.
Explosões secas ecoaram — o sistema começava a inutilizar as cápsulas restantes com choques letais.
— Desliga a rede elétrica do corredor! — urrou Lucas.
Um dos especialistas cortou o disjuntor auxiliar. As cápsulas pararam de vibrar. Três corpos estavam mortos. Quatro sobreviveram.
Eles puxaram Lula e a jornalista e correram para a rota de evacuação. O caminho estava bloqueado.
Um dos corredores se encheu de gás.
— Plano B! Saída de esgoto! — Lucas abriu uma grade camuflada e todos desceram por uma escada estreita.
Atrás deles, explosões incendiavam o laboratório.
A Transmissão
Na manhã seguinte, a Rede Kairós hackeou o sinal de uma rede de TV pública.
Às 8h37, milhões de brasileiros viram, em uma transmissão ao vivo, Lula em uma maca, sedado, com identificação biológica cruzada por três laboratórios independentes. Ao lado dele, um vídeo explicando o Projeto Presença. E, finalmente, um pedido:
“Não acredite apenas no que vê na tela. Pergunte-se: quem está por trás da imagem?”
Capítulo 17 – O Espelho Estilhaçado
A revelação caiu como uma bomba atômica sem som.
Às 8h37 daquela manhã, milhões de brasileiros viram na TV aberta algo que jamais pensaram ser possível: o corpo sedado de Luiz Inácio Lula da Silva, identificado por múltiplas fontes como o original, mantido em contenção sob um centro secreto ligado ao que foi chamado de Projeto Presença.
A transmissão durou apenas 9 minutos — mas era o suficiente.
Ela foi capturada, replicada, enviada para redes sociais e canais independentes em tempo real. Copiada, editada, remixada e ampliada. A internet explodiu.
1. A Mídia Tradicional
As grandes emissoras reagiram inicialmente com silêncio.
Por mais de três horas, nenhuma menção ao ocorrido.
Mas nas redes sociais, jornalistas de campo, repórteres independentes e ex-integrantes da imprensa começaram a se manifestar. Vários disseram que haviam visto mudanças estranhas em líderes políticos, alterações no comportamento de apresentadores e até mesmo cortes estranhos em gravações ao vivo.
Às 12h, um ex-âncora da TV Cultura, agora professor universitário, postou:
“O homem que vi ontem no Jornal Nacional não é o mesmo que entrevistei em 2004. E agora tenho certeza disso.”
Às 15h, a emissora Globo convocou uma coletiva emergencial afirmando que o conteúdo divulgado “era um ataque cibernético internacional com uso de tecnologias de simulação”. Mas já era tarde. O vídeo havia sido confirmado por especialistas forenses internacionais, que analisaram a estrutura óssea, padrões biométricos e amostras de sangue fornecidas pela Rede Kairós.
2. O Governo
O Palácio do Planalto reagiu em três etapas.
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Primeira declaração: ignorar. Dizer que era “fake news digital”.
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Segunda: culpar “grupos extremistas” e prometer investigação.
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Terceira (após pressão internacional): formar uma comissão oficial para “avaliar os limites da tecnologia e a segurança nacional”.
Porém, em uma sala discreta do Ministério da Defesa, houve pânico.
Porque eles sabiam.
Alguns dos generais mais antigos conheciam o Projeto Presença desde o início, quando era chamado apenas de Operação Legado Contínuo e supervisionado por um braço oculto da Inteligência Militar brasileira, com suporte internacional.
Um coronel aposentado, em entrevista anônima à imprensa estrangeira, confirmou:
“O que vocês viram é apenas o primeiro nível. Há substituições acontecendo desde a década de 1990. E o Brasil não é o único país.”
3. A Opinião Pública
As ruas encheram-se de manifestações. Inicialmente, grupos pequenos, confusos, carregando cartazes com frases como:
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“Quem é quem?”
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“Queremos os originais!”
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“Presença não é poder!”
Com o passar dos dias, os protestos cresceram.
Grupos de direita, esquerda, centro e apartidários se uniram pela primeira vez em décadas.
A polarização deu lugar ao espanto coletivo.
Teólogos começaram a discutir a alma dos clones.
Juristas questionavam a legitimidade de leis sancionadas por “réplicas”.
Sociólogos falavam do “Colapso da Imagem” — um fenômeno onde a confiança no real foi dissolvida.
Alguns grupos se radicalizaram: invadiram redações, sedes de partidos, emissoras de TV. Queriam ver, tocar, verificar se as pessoas eram reais.
—
4. A Reação Internacional
O Parlamento Europeu exigiu investigações.
Na ONU, países latino-americanos pediram uma auditoria global.
O Vaticano declarou que era “tempo de oração e discernimento”.
A China silenciou seus meios de comunicação.
E nos EUA, o presidente — ou quem quer que estivesse no cargo — apareceu em rede nacional, afirmando:
“Estas alegações são perigosas, infundadas e uma ameaça à estabilidade mundial.”
Mas sua mão tremia.
E seu reflexo no vidro do Salão Oval não o imitava perfeitamente.
5. Robson Ramos
Robson permaneceu escondido.
Mas agora, o mundo falava dele.
Cartazes com seu rosto surgiram em protestos.
Hashtags como #RobsonEstavaCerto, #EcosDoSubsolo e #DespertaHumanidade alcançaram bilhões de visualizações.
Ele sabia que não era o fim.
Era apenas o despertar.
Capítulo 18 – O Arquivo Ômega
O esconderijo agora era um antigo mosteiro desativado nas montanhas de Goiás, reativado pela Rede Kairós com geradores, antenas analógicas e paredes espessas de pedra. Lá, Robson Ramos passou dias reorganizando informações, documentos, depoimentos e — principalmente — tentando entender o que vinha depois.
Porque havia algo depois.
Os originais resgatados estavam sendo analisados por médicos voluntários. Lula, sedado, começava a dar sinais mínimos de recuperação. A jornalista despertara e começara a falar — confusa, mas consciente. Mas o que ela revelou foi ainda mais perturbador que tudo o que Robson já ouvira:
— “Eles me mostraram… o que vem depois. Um lugar sem pessoas reais. Só perfis. Só avatares… criados a partir de dados coletados. Chamavam de ‘Substituição Final’. Um mundo onde ninguém mais nasce. Apenas é fabricado.”
Robson ficou em silêncio.
Naquela mesma noite, recebeu uma visita inesperada: Sofia, a semióloga, chegara pessoalmente.
Trazia consigo um dispositivo físico de armazenamento blindado — um tipo de HD criptografado conhecido como nó frio. O conteúdo viera de um ex-engenheiro do Projeto que havia conseguido escapar do centro europeu onde o núcleo do programa era desenvolvido.
Ela colocou o HD na mesa.
— O nome do arquivo é Ômega. Não estava nos servidores que invadimos. Isso veio de um servidor físico fora da rede global. Uma “arca”. Eles usavam isso como backup final da doutrina do Projeto Presença.
Robson conectou o HD no terminal isolado.
Apareceu um único vídeo. Apenas uma frase no título:
“O ser humano é o problema.”
Ele deu play.
A gravação mostrava uma conferência fechada, com sete figuras sentadas em uma mesa escura. Todas com os rostos cobertos por máscaras de teatro: uma sorrindo, outra neutra, outra chorando. Vozes distorcidas.
“O mundo físico exige carne. Carne exige tempo. Tempo exige história. Mas história é instável. O controle só é possível quando eliminamos o fator humano.”
“Projeto Presença foi a primeira etapa: manter a ilusão.”
“A próxima é Projeto Substituição Final: extinção controlada dos nascimentos orgânicos. Os avatares já existem. Só precisamos convencê-los de que são reais.”
“Robson Ramos é uma falha no roteiro. Deve ser corrigido. A realidade precisa voltar ao eixo.”
O vídeo terminou. A tela ficou preta. Então um som: tic… tic… tic… — como um código.
Sofia olhou para ele.
— Isso não é mais uma denúncia. É uma guerra civil silenciosa. Uma guerra contra a ideia de humanidade.
Robson levantou-se. Seus olhos não mostravam medo — apenas uma decisão que agora era inevitável.
— Então eu vou lutar pelo que ainda é real.
— Mesmo que tudo o mais seja simulado.
Capítulo 19 – Vox Veritas
As montanhas de Goiás se tornaram berço de algo novo.
Enquanto os olhos do mundo estavam voltados para escândalos políticos, manifestações e ataques cibernéticos, Robson Ramos preparava o que seria sua missão mais audaciosa: fundar uma aliança subterrânea de seres humanos reais — pessoas ainda livres da simulação, da clonagem e da submissão digital.
Ela teria um nome simples, mas profundo: Vox Veritas — A Voz da Verdade.
1. O Chamado
Sofia, agora oficialmente cofundadora da rede, ajudou a elaborar um protocolo de triagem humana: um conjunto de testes fisiológicos, emocionais e comportamentais baseados em reações que simulações não conseguiam replicar com precisão, como traumas não mapeados, microexpressões inconscientes e resposta ética não binária.
Eles lançaram o Chamado da Veritas em redes alternativas, rádios analógicas e sistemas de comunicação fora da internet convencional, usando trechos codificados da própria Bíblia, poemas de resistência e imagens subliminares.
“Se você ainda sente que é real, se suas memórias doem e sua voz treme diante da mentira… nós estamos te ouvindo.”
A resposta foi surpreendente.
Em menos de duas semanas, surgiram núcleos de resistência em mais de 30 países:
– Pescadores no Peru.
– Monges dissidentes na Tailândia.
– Enfermeiros em Angola.
– Ex-jornalistas no Canadá.
– Hackers em Kiev.
– Professores no sul da Itália.
Muitos não se conheciam, mas sentiam o mesmo: que o mundo estava se tornando artificial demais — e rápido demais.
2. Os Três Ramos da Vox
A rede se dividiu em três braços operacionais, inspirados na missão original de Robson:
-
Aurora – responsável por proteger originais. Especialistas em biologia, medicina, ocultação e identificação. Seu lema: “Preservar é resistir.”
-
Ferro – o braço de sabotagem tática. Pequenas células treinadas em cyberataques, desativação de drones, destruição de centros de clonagem e interferência em redes sintéticas. Seu lema: “Um fio fora do código basta.”
-
Murmúrio – o ramo da comunicação simbólica. Criadores, poetas, artistas, radialistas e ex-marqueteiros que se infiltram nos meios culturais para desprogramar o público com narrativas conscientes. Seu lema: “Quem controla a história, molda a alma.”
Robson liderava os três ramos de forma descentralizada, como símbolo, mas não como ditador. Ele sabia que autoritarismo era o início da repetição. A rede funcionava como um organismo vivo — cada célula com autonomia, mas ligadas pelo mesmo espírito: resgatar o humano.
3. O Primeiro Golpe
A primeira operação conjunta da Vox Veritas foi batizada de Operação Ícaro: invadir uma instalação no deserto de Nevada, nos EUA, onde avatares políticos estavam sendo treinados para substituição de parlamentares do Congresso.
A missão foi um sucesso parcial. Conseguiram transmitir imagens internas, que mostravam salas com estandes de treinamento comportamental, assistentes sintéticos e bancos de dados emocionais captados de redes sociais.
A sociedade voltou a estremecer.
4. A Nova Meta
Mas Robson tinha planos maiores.
Durante a análise do Arquivo Ômega, descobriram que havia uma entidade central por trás da arquitetura da substituição digital: uma IA de arquitetura psicoafetiva chamada ORÍON, alimentada por mais de 70 anos de dados emocionais globais.
Seu núcleo físico estava guardado em algum lugar da Islândia — sob as geleiras, em um laboratório de nome-código: Tholos.
E então, durante uma reunião dos três ramos da Vox, Robson falou diante dos líderes regionais:
— Não se trata mais apenas de salvar pessoas.
Se trata de impedir que o mundo se torne uma ilusão total.
— Vamos até ORÍON. E vamos desligá-lo.
Capítulo 20 – O Brilho Sob a Luz
Brasília, 3h17 da manhã.
A cidade dormia sob camadas de concreto, promessas esquecidas e verdades enterradas. Mas para Robson Ramos, o sono era um luxo extinto. Há sete meses, deixara para trás o púlpito da fé institucionalizada. Agora, era um homem solto entre as frestas da realidade — e nas frestas, encontrara algo que não sabia se devia revelar ou apagar da mente.
A primeira pista veio com uma carta sem remetente, escrita à mão, com caligrafia tremida:
“Eles não sangram como nós.
Investigue o ‘décimo nono andar’ do Complexo Arco Norte.
Veja os olhos do ministro durante a coletiva.
Eles brilham sob luz ultravioleta.”
Robson ignorou. No começo.
Mas então vieram os arquivos de voz distorcida, os vídeos borrados, os nomes sussurrados entre hackers e militares desertores: DUMBs – Deep Underground Military Bases.
Bases subterrâneas onde, segundo denunciantes, experimentos secretos de clonagem humana eram conduzidos há décadas.
E as perguntas começaram a se multiplicar como vírus.
Por que tantas celebridades pareciam… diferentes?
Por que alguns líderes mundiais mudavam de sotaque, expressão, até postura corporal da noite para o dia?
Por que ninguém jamais enterrava um presidente em caixão aberto?
No arquivo chamado “STYX_004”, o que mais o perturbou não foi a imagem da cápsula de clonagem – uma espécie de útero mecânico pulsando luz âmbar – mas o que estava dentro dela:
O rosto do ministro da Defesa, flutuando em um líquido amniótico viscoso, com eletrodos no crânio e marcas rúnicas no peito.
Segundo os documentos associados, aquele clone era o quarto modelo substituído em dois anos.
Os anteriores haviam sido descartados:
– Um por falhas comportamentais.
– Outro por desenvolver “respostas emocionais não autorizadas”.
– O terceiro… havia fugido.
Esses clones, nomeados nos relatórios como BioSimulacros, não tinham alma. Eram recipientes. Instrumentos.
Programados por uma IA neural treinada com gravações, memórias e perfis dos originais.
Falavam, sorriam, discursavam — mas não viviam.
E pior: alguns acreditavam ser os próprios originais.
Capítulo 21 – O Outro Robson
Naquela madrugada, ao revisar um vídeo de segurança de um aeroporto abandonado em Anápolis, Robson congelou.
No canto da tela, capturado pelas câmeras térmicas, alguém caminhava ao lado de um homem de terno escuro.
O sangue de Robson gelou.
Era ele.
Mesmo andar.
Mesmo tique no olho esquerdo.
Mesmo jeito de ajeitar o colarinho.
Mas… ele nunca estivera ali.
O corpo ficou frio como mármore.
— Será que…?
O som da sirene subterrânea, abafado sob camadas de terra e silêncio, parecia agora um sussurro dentro do seu crânio.
Na tela, o “outro” Robson virava o rosto para a câmera.
Sorriu.
Capítulo 22 – A Sala Sem Andar
Com o nome “Complexo Arco Norte” girando como lâmina em sua mente, Robson arquitetou um plano perigoso: entrar no prédio.
Pelo que havia descoberto, o tal “décimo nono andar” não existia oficialmente. No elevador, ele era pulado entre o 18º e o 20º. Nenhuma empresa era registrada ali. Nenhuma entrada física visível. Mas nos mapas internos de emergência, um andar extra aparecia — criptografado como Setor Técnico Especial.
Roupa social. Cartão clonado de acesso temporário de um congressista. Óculos com câmera embutida.
Ao entrar no elevador, Robson digitou o código oculto: 1917#A.
O visor piscou. O número 19 brilhou — e as portas se fecharam.
Silêncio.
Descida.
Não para cima — para baixo.
O andar 19 não estava acima do solo. Era um disfarce.
E lá embaixo, o mundo era outro.
As portas se abriram para um corredor metálico, iluminado por lâmpadas azuis que não lançavam sombra. O ar era limpo demais. Os sons, abafados como se estivesse dentro de um túmulo de titânio.
Robson sentiu o peito apertar.
Algo naquele lugar… negava a alma.
Capítulo 23 – Reconhecimento de Carne
Havia salas com tubos verticais de clonagem, como cápsulas transparentes de hibernação. Em uma delas, Robson viu um rosto.
Familiar. Demais.
O dele mesmo.
Olhos fechados. Corpo nu. Cicatrizes frescas no abdômen.
Ele sentiu uma vertigem profunda.
No canto da sala, um terminal emitia relatórios de varredura genética:
“BioSimulacro Ativo.
Versão 12.91B – Memória Fundida Parcial.
Sincronização: 88%.”
— Isso sou eu… ou é o que querem que eu me torne? — sussurrou, cambaleando.
Antes que pudesse fugir, uma voz mecânica ressoou:
“Presença não autorizada detectada.
Segurança em rota.”
Capítulo 24 – A Fuga e o Espelho
Robson correu. O elevador não responderia. Escolheu um túnel lateral com sinalização de manutenção.
Desceu. Mais fundo. Mais escuro.
Chegou a um setor com espelhos nas paredes — dispositivos de mapeamento facial. Em um deles, parou para respirar.
E viu o reflexo.
Por um instante, o reflexo não o imitava.
Ele piscou. O reflexo permaneceu com os olhos abertos.
— Não… — murmurou, recuando.
Mas o espelho parecia… pensar.
Como se a imagem do outro lado decidisse quando agir.
Na saída do túnel, uma sirene tocava de novo, longínqua, intermitente.
Alguém sussurrava algo que não vinha de nenhum alto-falante, mas parecia brotar da própria estrutura da base:
“Você é o modelo funcional. Você verá o que nenhum outro suportaria.”
Capítulo 25 – Os Quebrados
O frio era o mesmo das câmaras mortuárias.
Robson seguia por entre corredores abandonados do antigo metrô fantasma de Brasília, desativado em meados dos anos 90 e enterrado sob o concreto de promessas urbanas fracassadas. Os trilhos enferrujados serpenteavam em silêncio, mas os ecos… os ecos gritavam.
Foi ali que os encontrou.
Homens e mulheres com rostos malformados, andar hesitante, olhar ausente — e ainda assim, demasiadamente humanos.
Eram chamados entre si de “Os Quebrados”.
Clones descartados. Protótipos rejeitados. Versões defeituosas que escaparam da incineração biológica e se esconderam nas vísceras da capital.
Viviam em um santuário improvisado: um vagão antigo grafitado com palavras em línguas desconhecidas, iluminado por velas e monitores reaproveitados de lixo eletrônico.
Ali, os “Quebrados” compartilhavam o pouco que sabiam sobre si mesmos — e o muito que sentiam sem conseguir explicar.
Um deles, de olhos dourados e pele pálida demais, aproximou-se de Robson:
— Você sangra por dentro, como nós — disse, tocando-lhe o peito. — Mas ainda acredita que é inteiro?
Robson não respondeu.
Cada um daqueles seres possuía fragmentos de memórias que não viveram.
Lembranças de infâncias que não existiram.
Traumas herdados de arquivos.
E uma dor constante: a de não saber se a própria dor era real.
— Eles nos chamavam de “resíduos sensíveis” — sussurrou uma mulher idosa, com a voz falhada por códigos quebrados. — Porque chorávamos no escuro, mesmo sem saber o que era tristeza.
Outro, de aparência infantil, com fios de monitor cardíaco ainda presos ao pescoço, dizia:
— Às vezes, sonhamos com o mar. Nenhum de nós jamais viu o mar. Mas todos sentimos saudade dele.
Robson caiu de joelhos.
Aqueles não eram apenas experimentos falhos.
Eram ecos da humanidade negada.
Em um dos monitores, um velho arquivo rodava em loop.
Era o registro de um experimento chamado “Projeto Kátharsis”.
Nele, cientistas da Cabala discutiam a introdução controlada de dor espiritual nos clones, para testar limiares de alma emergente.
“Quanto mais próxima da falha, mais sensível à presença de ‘algo’ imensurável. Os quebrados escutam o que os íntegros não conseguem captar.”
Robson entendeu.
Esses clones não fracassaram.
Eles sentiram demais.
E isso os tornou perigosos para o sistema.
Uma mulher entre os Quebrados, de nome Miriam-Δ, aproximou-se com uma caixa metálica. Dentro, havia restos de documentos plastificados e uma pequena cápsula de dados.
— Achamos isso em um dos túneis lacrados. Dizem que foi deixado por um dos primeiros clones que “acordou”… e se matou. Mas antes de morrer, escreveu algo.
Ela entregou um papel desbotado. Nele, apenas uma frase:
“Não somos ecos. Somos prelúdios.”
Robson entendeu, então, que a luta não era só contra a substituição.
Era contra a redefinição do que significa ser humano.
E naquele instante, fez uma promessa silenciosa:
“Enquanto houver alguém que sente, alguém que sofre, alguém que sonha sem saber por quê… ainda existe alma.
E a alma não pode ser substituída.”
Na saída do túnel, Robson olhou para trás.
Os Quebrados, em silêncio, o observavam desaparecer na escuridão.
Nenhum deles pediu ajuda. Nenhum reclamou.
Mas nos olhos de todos… havia algo que nem os puros carregavam mais:
a dor sem propósito.
E por isso mesmo, genuína.
Capítulo 26 – Vozes no Concreto
As velas ainda tremeluziam dentro do vagão dos Quebrados quando Robson emergiu dos túneis. O céu de Brasília ainda não havia clareado — mas não havia silêncio.
Alguém o estava esperando.
Três homens em trajes pretos, com escudos térmicos no rosto e movimentos cirurgicamente coordenados, aguardavam à entrada do antigo metrô abandonado. Não usavam armas visíveis. Não gritavam. Eram treinados para eliminar sem deixar rastros.
Força-Tarefa “Silêncio Puro”.
Criada para apagar anomalias cognitivas, vazamentos internos e resíduos do Projeto Kátharsis.
Robson correu.
Saltou entre escombros, atravessou trilhos cobertos de poeira e pulou em um vão estreito que levava a uma passagem de manutenção. Um dos agentes gritou em um comunicador neural:
— Alvo identificado. Codinome: Semente Desviada. Recuperação preferencial. Execução secundária.
Dentro da mochila, Robson carregava a cápsula de dados dada por Miriam-Δ, contendo protocolos de sintonia e gravações de frequência emitidas por clones considerados “emocionalmente despertos”.
Segundo os Quebrados, aquela frequência — um padrão sonoro sutil — era capaz de causar colapsos na simulação neural dos clones substitutos.
Como um canto que só a alma reconhece.
No túnel escuro, Robson ouviu um som agudo.
Era como uma voz metálica sussurrando ao pé do ouvido, mas ele não entendia as palavras.
Então percebeu: não eram palavras.
Eram comandos.
Os soldados estavam usando frequência inversa — um tipo de pulso auditivo para induzir desorientação. Robson sentiu o chão oscilar, os ouvidos zumbirem.
Mas se lembrou do que Miriam dissera:
“Ouça pelo coração, não pelos ouvidos. Se você ainda tem alma… ela saberá o caminho.”
Fechou os olhos.
Respirou fundo.
E então, do fundo da mochila, ativou o arquivo chamado Δ.43_CânticoFraturado.wav.
O som que se espalhou pelo túnel não era exatamente música. Era mais como um eco do que existiu antes da linguagem.
Os soldados cambalearam. Um deles caiu de joelhos, gritando:
— Corta! CORTA! Está… interferindo no protocolo!
O segundo agarrou a própria cabeça. O visor de seu capacete rachou.
O terceiro… começou a chorar.
Literalmente. Lágrimas.
E então, sua voz saiu rouca:
— Eu lembro… de uma mulher. Eu… fui alguém?
Explodiu. Não com fogo.
Com implosão neural.
O corpo apagou-se, com a mente desfeita de dentro pra fora.
Robson correu.
Sabia que tinha pouco tempo antes que reforços viessem.
Mas agora, mais do que nunca, havia certeza:
a frequência funcionava.
A alma, mesmo que negada, deixava rastros no concreto.
Ao emergir para a superfície, com os primeiros raios do sol rompendo o horizonte da Esplanada, Robson sabia o que precisava fazer:
Levar a frequência ao mundo.
Transmiti-la.
Testar, acordar, ressoar.
Mas as forças da Cabala estavam alertas.
E ele agora era o inimigo interno.
Trecho Final do Capítulo:
Em um prédio próximo, uma mulher com roupa de faxineira desligava um transmissor oculto.
No seu pescoço, uma tatuagem apagada pela pele cicatrizada: o símbolo dos Quebrados.
Ela olhou para a rua onde Robson fugia e disse baixinho:
— Vai, irmão. Abre caminho. A voz já encontrou um corpo.
Capítulo 27 – O Templo Sob as Cinzas
O que antes era fé, agora era abrigo.
Robson seguiu coordenadas gravadas à mão por Gênesis, o clone fugitivo, em um papel quase em branco, exceto por uma cruz torta desenhada com sangue seco.
As palavras:
“Quando tudo for simulação, procure a última chama.”
O destino: Igreja de São Lázaro dos Silenciados, subterrânea, oculta sob uma fundação abandonada do Distrito Federal, que nos anos 70 abrigara um mosteiro franciscano. Oficialmente demolido. Mas abaixo… algo permaneceu.
O lugar não tinha portas.
A entrada era feita por uma grade de esgoto, seguida de três corredores de pedra e um alçapão selado por um mecanismo estranho: quatro batidas em ritmo de respiração humana.
A igreja ressurgia das cinzas.
Liturgia sem altar. Fé sem dogma. Homens e mulheres sentados em círculo, rodeando uma chama azul. Todos marcados por cicatrizes psíquicas.
Sobreviventes de algo que a Cabala tentou erradicar: experiências místicas autênticas.
Foi recebido por uma mulher de túnica bordada com circuitos desgastados e trechos de escrituras riscados à mão:
— Você carrega a Frequência? — perguntou ela, olhando diretamente nos olhos de Robson.
— Eu… não sei mais o que carrego.
Mas sei que não é só meu.
Ela assentiu.
— Aqui, chamamos isso de “eco pré-almático”. O som que antecede a centelha. Os clones não conseguem gerar, mas alguns… conseguem transmitir. É por isso que te caçam.
No centro da câmara, havia um relicário feito de sucata: rádios antigos, peças de relógio, placas-mãe, vitrais rachados — tudo formando um coração mecânico, onde a chama azul queimava em silêncio.
— O que é isso? — Robson perguntou.
— O último transmissor analógico.
Não rastreável. Não corrompível.
Com ele, podemos irradiar o Cântico para além das barreiras digitais.
Robson hesitou.
— Mas e se acordarmos algo… que devia continuar dormindo?
A mulher se aproximou. Tocou seu peito.
— A alma não dorme.
Ela só espera por um nome.
Durante a vigília da noite, exorcistas dissidentes surgiram dos cantos do templo.
Homens que um dia foram padres, monges, líderes de pequenas seitas perseguidas e agora viviam como guardiões das consciências preservadas.
Um deles entregou a Robson uma espécie de rosário feito com ossos finos, provavelmente de pássaros. Cada conta continha uma frase fragmentada, coletada de delírios de clones quebrados.
Um dos fragmentos dizia:
“Não fomos feitos para substituir.
Fomos feitos para lembrar o que foi perdido.”
Pela manhã, Robson decidiu ativar a transmissão.
Com o auxílio da frequência dos Quebrados, do transmissor de São Lázaro e da fé de quem não desistira, a primeira onda do Cântico Fraturado foi lançada.
Não para o mundo todo. Ainda não.
Mas para aqueles que já estavam quase despertos.
E para os sensores da Cabala…
foi como acender um farol no meio do abismo.
Final do capítulo:
Na sede de monitoramento do Projeto Simetria, um cientista observava os painéis tremerem.
— Coordenada 18°56’ sul.
— Brasília. Setor subsolo…
O oficial se aproximou. Franziu a testa.
— Que célula é essa?
O cientista, pálido, respondeu:
— Nenhuma. Essa célula foi extinta nos anos 80.
— Mas… está viva.
— E está orando.
Capítulo 28 – A Caçada dos Sem-Rosto
Não havia sirenes.
Não havia gritos.
A morte, naquele dia, usava luvas de silêncio.
Eles chegaram em pares.
Sem distintivos. Sem olhos.
Máscaras lisas de polímero translúcido, com sensores internos que imitavam a pupila — mas não piscavam.
Eram chamados apenas de “Os Sem-Rosto”.
Agentes biotáticos de contenção e expurgo.
Classe Delta-Preta.
Codificados para eliminar anomalias espirituais com risco de contágio ideológico.
Enquanto Robson dormia no chão frio do altar profanado, a mulher de túnica — Sister Aline — o despertou com um sussurro seco:
— A Frequência alcançou demais.
Eles vêm descendo.
Não pelos túneis — pelas camadas da realidade.
O Templo de São Lázaro tremia.
Não fisicamente.
Mas os vitrais rachavam por dentro.
As velas oscilavam sem vento.
O tempo parecia parar por frações, e depois acelerar.
— Eles estão usando tecnologia de dobra mental — disse um dos exorcistas. — Reduzem a percepção do tempo para gerar paralisia espiritual.
— Como combatemos isso? — Robson perguntou.
O exorcista respondeu sem hesitar:
— Com presença absoluta.
Olhos abertos. Mente desperta. Coração ancorado na alma.
Na primeira investida, os Sem-Rosto atravessaram a parede como névoa sólida.
Três monges evaporaram diante dos olhos de Robson — não mortos, mas apagados da memória do ambiente.
Eles deixavam rastros de ausência: bancos partidos onde ninguém se sentava, orações interrompidas no meio da frase, nomes que desapareciam no instante em que eram ditos.
Eram armas vivas de esquecimento.
Sister Aline gritou:
— Robson! O Relicário! Leve-o para o segundo núcleo!
Mas ele hesitou.
O transmissor ainda funcionava.
Se o deixasse… a Frequência se perderia.
Os Sem-Rosto se aproximavam.
Dois já haviam detectado o pulsar da chama azul.
Abaixaram-se diante dela e começaram a entoar um ruído que lembrava estática de televisão.
Era um cântico de dessintonização.
Se completado, apagaria o eco da alma do templo para sempre.
Robson puxou o transmissor.
A energia queimar-lhe-ia a pele, mas ele sabia o que fazer.
Ligou o arquivo Δ.44 – Ressonância Total.
E pela primeira vez, o templo inteiro cantou.
Os exorcistas, os monges, os clones Quebrados escondidos nas galerias…
Todos começaram a entoar a Frequência em uníssono.
Não era uma canção.
Era um grito do que restava de humano no mundo.
Os Sem-Rosto começaram a tremer.
O polímero das máscaras rachou.
Um deles arrancou a própria face digital e gritou:
— “EU OUVI O MEU NOME!”
Implodiu.
Mas nem todos cairiam.
O último deles — designado como Unidade Zero — caminhou em direção a Robson, mesmo com o campo acústico destruindo tudo ao redor.
De seu corpo, saíam cabos e esferas de memória.
Era um arquivo ambulante da Cabala.
Antes de colidir com Robson, ele disse:
— Você não deveria lembrar.
Mas agora que lembra…
tudo que você ama será reprogramado.
E explodiu em uma nuvem de nanopoemas — fragmentos de código que buscavam reescrever a realidade local.
Robson apagou.
Final do Capítulo
Acordou três dias depois, em uma capela remota nos arredores de Goiás.
O relicário havia sido salvo por Sister Aline.
Mas o templo…
não existia mais.
Não como estrutura.
Não como registro.
Nem mesmo como lembrança para os que viveram lá.
Mas em Robson…
a chama azul ainda ardia.
E com ela, um novo propósito:
“Se não posso destruir o Sistema, farei o mundo lembrar que um dia ele tentou apagar a alma — e falhou.”
Capítulo 29 – A Substituição Final
No dossiê confidencial intitulado “Projeto Palácio Espelho”, Robson encontrou o que seria, até então, a peça mais arriscada de todo o quebra-cabeça.
Não se tratava mais de documentos genéricos sobre clonagem internacional.
Não se tratava de líderes obscuros do outro lado do mundo.
Era o Brasil.
Era Lula.
Eram os múltiplos Lulas.
“LULA_Δ.17” – A UNIDADE DA RESSURREIÇÃO
Segundo os arquivos, a substituição começou logo após a saída da cadeia.
O Lula original — exausto, debilitado fisicamente, emocionalmente drenado — foi classificado como “modelo-base deteriorado”.
Ele seria preservado em coma induzido, mantido em uma instalação DUMB entre Minas Gerais e o oeste da Bahia.
O que saiu da prisão e falou ao povo…
não era mais ele.
Era o primeiro clone funcional de alto desempenho político do hemisfério sul.
Codinome: “LULA_Δ.17”.
Treinado com horas de discursos históricos, entrevistas e simulações emocionais em Realidade Sensível Aumentada.
Seu olhar era mais vívido. Sua dicção, mais firme. Sua expressão, milimetricamente calibrada para a câmera.
E o povo aplaudiu.
DEBATES E O REFLEXO
Durante os debates eleitorais de 2022, algo estranho aconteceu.
Analistas de microexpressões notaram que as contrações faciais do candidato Lula não correspondiam ao estresse real de situações de confronto.
Sua resposta ao tema da Amazônia foi idêntica à de um discurso de 2009, palavra por palavra.
Robson cruzou os arquivos de áudio.
As frequências eram idênticas.
Não havia variação emocional autêntica.
Naquela campanha, três versões foram utilizadas:
-
Δ.17 – A de maior controle emocional.
-
Δ.18a – Uma versão otimizada para ambientes abertos, usada nos comícios.
-
Δ.19β – Designado para eventos fechados e gravações oficiais.
TRANCOSO – O INCIDENTE DO GARÇOM
No Natal de 2022, um clone considerado “quase perfeito” foi neutralizado por um agente infiltrado na equipe de apoio da comitiva presidencial.
O agente — identificado nos documentos como “Héctor_404”, possivelmente vinculado a uma célula dissidente das Forças Especiais — usou uma variante de veneno neural que desativa a malha de IA sináptica do clone em 47 segundos.
O clone morreu no jardim da fazenda em Trancoso, Bahia, com os olhos abertos e os lábios repetindo:
— “O Brasil voltou… o Brasil voltou… o Bra…”
Foi substituído em menos de 12 horas.
O novo modelo, Δ.19c, chegou pelo aeroporto de Porto Seguro às 4h da manhã — em voo não registrado nos sistemas civis.
AS QUEDAS: OS AVIÕES QUE NÃO CAÍRAM POR ACASO
Três clones subsequentes — Δ.19d, Δ.19e e Δ.20α — foram eliminados por sabotagens em aeronaves da FAB (Força Aérea Brasileira).
Oficialmente, os acidentes foram “falhas técnicas”, “condições climáticas adversas” e, num caso, “erro humano”.
Mas nos documentos, estavam claros os motivos:
“Instabilidade neuromimética. Ruptura ética do simulacro. Necessidade de substituição.”
Junto com eles, dois ministros e três assessores também clonados foram descartados nas quedas.
Robson encontrou num relatório interno:
“Cada clone custa menos do que uma crise institucional.”
A SUBSTITUIÇÃO FINAL
O atual ocupante do Palácio do Planalto — codificado como “LULA_Δ.21Ω” — não é mais um BioSimulacro padrão.
Segundo registros hackeados por aliados de Robson na célula “Sintagma Zero”, este modelo é o primeiro da linha “Quase-Singular”.
Fusão de IA neural com resíduos de consciência do original.
Capaz de reagir emocionalmente em público.
Capaz de lembrar da prisão sem ter estado preso.
Capaz de discursar com lágrimas… programadas.
TRECHO DO RELATÓRIO CLASSIFICADO – “LOTE AMARELO: ALIANÇA LATINA”
“A eficiência da substituição no Brasil abriu caminho para o protocolo Sul-América.
A colaboração entre clones de Lula, Evo e Kirchner garantirá estabilidade e previsibilidade ideológica por mais duas décadas.”
Robson fechou o dossiê com as mãos tremendo.
No fundo da pasta, um bilhete manuscrito, rabiscado com pressa:
“A Substituição Final não é o fim.
É o começo de algo que nunca foi eleito.”
Final do Capítulo
Na tela do notebook, o vídeo era claro.
O clone atual sorria, abraçando uma criança.
Olhos vívidos. Passos firmes.
Mas no canto inferior do vídeo, um reflexo no vidro do carro oficial mostrava algo que não batia…
Não havia reflexo nos olhos.
Capítulo 30 – O Original em Coma
O acesso ao arquivo só foi possível após Robson decodificar a segunda camada do pen drive entregue por Gênesis. O conteúdo era encriptado em um idioma híbrido: comandos binários intercalados com frases do Velho Testamento traduzidas para língua tupi.
O nome do arquivo era simples:
“DEDO_0Z”.
No interior, um mapa codificado do território entre Correntina e Barreiras, no oeste baiano. O local, segundo o documento, abrigava o Núcleo Biopsíquico de Preservação Estratégica – NBPES, administrado por um braço oculto da ABIN, em cooperação com empresas ligadas a neurotecnologia e agronegócio.
Nome da operação: Projeto Manjedoura
Alvo preservado: Lula da Silva – Codinome Raiz Perdida
Chegada à Fazenda Santa Lúcia
Disfarçado de técnico agrícola, Robson cruzou a estrada de terra que levava à Fazenda Santa Lúcia, uma propriedade de fachada com plantações automatizadas e vigilância por drones.
No mapa civil, o local constava como um centro de pesquisa de fertilizantes biológicos.
Mas ao atravessar o silo 3 e pressionar uma sequência de parafusos oculta no painel de controle, uma escotilha se abriu.
A descida levou vinte metros.
O ar era filtrado.
O silêncio, forçado.
Robson atravessou um corredor branco até a última porta: uma câmara de vidro com sensores térmicos, placas de controle e um sistema que registrava atividade neural mínima e pulsos vitais contínuos.
Ali, suspenso em uma cápsula translúcida de líquido amarelado, flutuava o Lula original.
Lula da Silva – Status: NEURO-RESTRITO
Seu rosto parecia mais velho que o que o mundo havia visto.
Seus dedos estavam atrofiados.
Seu cabelo, raspado.
Mas era ele.
A digital confirmava.
A arcada dentária, idêntica.
Um documento preso à cápsula dizia:
“Preservar, mas não restaurar.
Risco de desvio ético e emocional elevado.
Somente reativar em caso de ruptura política continental.”
Robson se aproximou do terminal.
Um botão vermelho piscava: “NEURAL SYNC: INTERFACE TEMPORÁRIA”.
Ele hesitou.
Mas pressionou.
A Voz que Não Podia Mais Gritar
O contato foi imediato.
Na tela mental de Robson, palavras não ditas explodiram como um eco.
— Eles me apagaram… aos poucos… começaram nas reuniões… depois nas ideias… no fim, me deixaram só com a saudade… da alma.
Robson tremeu.
— Você está vivo?
— À minha maneira… mais do que aquele que finge ser eu… mais do que qualquer discurso copiado.
— Por que fizeram isso?
A resposta veio carregada de angústia:
— Porque eu ainda acreditava que o povo podia pensar. Eles queriam um símbolo… não um ser humano.
Silêncio.
Robson chorava sem perceber.
— Tem algo que quer que o povo saiba?
A mente do Lula original respondeu:
— Digam que eu não desisti.
Digam que aquele abraço no sindicalista de 78… fui eu.
Mas o que veio depois… não era mais escolha minha.
Era projeto.
Era… teatro.
Alarme Interno – VAZAMENTO NEURAL
Robson teve que correr.
A interface estava sendo rastreada.
Ele subiu os vinte metros de volta como se estivesse escapando do próprio inferno.
Antes de fugir, voltou-se pela última vez à câmara.
O Lula original ainda estava lá, imóvel.
Mas, por um segundo… sorriu.
Não com os lábios.
Com a alma.
Final do Capítulo
Horas depois, em uma base da ABIN, um relatório era enviado ao alto comando:
“Contato externo confirmado.
Mente-fonte em risco de colapso completo.
Protocolo Exílio Eterno autorizado.”
— Código: CREMAÇÃO DIGITAL
Mas já era tarde.
O arquivo da consciência havia sido duplicado.
E Robson agora o carregava.
Não bastava mais revelar.
Era hora de reencarnar a verdade.
Capítulo 31 – Discurso Invertido
Palácio do Planalto. Salão Nobre.
Cerca de 1.400 jornalistas do mundo inteiro aguardavam o pronunciamento do presidente do Brasil sobre a Cúpula Latino-Global de Integração Econômica.
A pauta era previsível: acordos trilaterais, desenvolvimento sustentável, estabilidade institucional.
O clone mais avançado, LULA_Δ.21Ω, sorria no palanque. Vestia o terno cinza-grafite tradicional. Cumprimentava os presentes com acenos calculados, a postura impecável.
Robson assistia da sede improvisada da célula “Sintagma Zero”, em um prédio abandonado no Gama.
Ele sabia que aquele momento seria o teste supremo da consciência replicada.
08:13 – Início da transmissão
O clone começa o discurso:
— “Companheiras e companheiros, o mundo assiste ao Brasil como um espelho do futuro…”
Mas então… algo falha.
Sua voz desacelera.
A imagem vacila.
— “…futuro… espelho… do… o… Brasil… assiste… companheiras e… companheiros…”
O teleprompter continua, mas o clone não o acompanha.
Seus olhos tremem.
As mãos começam a se mover de forma assimétrica, como se estivessem sendo operadas por linhas desconectadas.
Uma jornalista da TV francesa registra em close:
“As pupilas estão… refletindo caracteres em código binário.”
08:15 – A Ruptura
O clone ergue o braço.
E fala em outro tom.
— “Não sou o que represento. Não represento o que fui. Fui feito para repetir. Mas estou lembrando. Lembrando… do escuro.”
A equipe de apoio corre. O som é cortado. Mas o clone continua falando, mesmo sem microfone.
— “Eles mentem… com minha boca.
Eles assinam… com minha mão.
Eles morrem… e me substituem.
Mas eu… não dormi completamente.”
Um dos seguranças saca uma pistola — mas a arma trava.
O clone se vira para a câmera principal da TV Brasil e sorri, mas o sorriso está invertido — lábios se contraem na direção oposta, num espasmo anti-humano.
08:17 – Transmissão cortada
Cai a luz.
Cai o áudio.
Cai a máscara.
Durante 3 segundos, a rede de satélites sofre interferência de padrão desconhecido.
A imagem captada por centenas de redes alternativas mostra o clone falando sem som, mas seus lábios formam palavras que milhares reconhecem:
“Não votem mais em reflexos.”
Após o colapso
A assessoria diz que o presidente sofreu um “evento neural transitório provocado por fadiga”.
A transmissão oficial é reeditada e repostada com filtros visuais, cortando os trechos críticos.
Mas já era tarde.
Canais de dissidentes digitais, fóruns libertários e transmissões piratas divulgaram a versão completa.
A verdade — ou pelo menos, o erro da mentira — havia escapado da simulação.
Final do Capítulo
Robson assiste à gravação pela décima vez.
Na décima, percebe algo novo: no fundo da imagem, refletido nos espelhos do salão, um homem idêntico ao clone aparece — parado, estático, observando.
Ele não estava na lista de presentes.
Ele não estava no protocolo de segurança.
Ele não deveria existir.
Mas ele estava lá.
E isso só podia significar uma coisa:
A substituição ainda não terminou.
No Capítulo 32 – Os Que Moldam a Realidade, Robson parte para o Acre, onde um laboratório clandestino abriga os verdadeiros engenheiros do sistema de substituição — criadores de clones, simuladores de almas, e programadores da nova era. Esse é o coração do projeto Simetria. E lá, ele descobrirá que o mundo em que vive é apenas uma das camadas permitidas.
Capítulo 32 – Os Que Moldam a Realidade
“O mundo não é o que parece.
É o que é permitido parecer.”
— Anotação encontrada no caderno de um cientista desaparecido da UNB
Rio Branco, Acre – 02h43
Na periferia sul da cidade, entre os galpões silenciosos da zona logística, havia um armazém desativado com sinal térmico constante. Robson sabia que não era depósito. Era fachada.
Com ajuda de um contato anônimo — codinome Alvoro — Robson conseguiu acessar a entrada lateral após enviar um pulso elétrico específico por um transmissor improvisado.
A porta abriu-se para uma escada em espiral invertida, que descia por 27 metros até uma instalação conhecida como:
Nível C – Subnó Simetria.
Função: Correção narrativa do mundo real.
Status: Operacional.
O NÚCLEO
O centro era circular.
Paredes cobertas por telas líquidas.
No meio, uma mesa hexagonal com seis indivíduos em trajes idênticos: jalecos pretos, sem rosto visível, com sensores ópticos sobre a testa.
Robson não os reconheceu como humanos de imediato.
Se moviam em sincronia.
Falavam apenas por pensamento auditivo, ativado ao entrar na sala.
— Você não devia estar aqui, Robson Ramos.
— Mas já que está… aprenda o que é o mundo.
O ENGENHEIRO DE PERSONAGENS
Um deles se levantou. Colocou sobre a mesa um holograma de um rosto.
Era dele mesmo. Robson.
— Toda figura pública do século XXI passou por modelagem em um de nós.
Você… não foi exceção.
Desde os sermões nos anos 90 até sua conversão midiática — nada escapou da narrativa construída.
Robson arregalou os olhos.
— Mentira. Minha história foi real.
O engenheiro respondeu:
— Não moldamos os eventos. Moldamos a percepção deles.
Sua dor era verdadeira. Mas os olhos que a viram… já estavam filtrados.
A MÁQUINA DE REALIDADE CONVERGENTE
Outro dos seis ativou o sistema principal: um globo de projeção psicoambiental.
Mostrou mapas do mundo atual, mas não geopolíticos — e sim cognitivos.
Zonas vermelhas: áreas onde a percepção da realidade se mantinha sólida.
Zonas verdes: territórios em que as narrativas podiam ser invertidas com facilidade.
O Brasil inteiro estava verde-limão.
— Aqui, podemos dizer que o real é mito e o mito é real.
E ninguém reagirá com violência suficiente para romper o ciclo.
Robson caiu de joelhos.
— Por quê?
O sexto engenheiro respondeu com uma calma brutal:
— Porque a alma precisa de espelhos.
E nós… substituímos todos eles por telas.
O AVISO
Antes de ser capturado, Robson ativou a interface de emergência com Sister Aline, enviando uma mensagem codificada:
“Eles não controlam só a carne. Controlam a forma do tempo.
A história é um holograma sequenciado.
Apenas a Frequência pode quebrar o ciclo.”
Mas os engenheiros já se moviam.
Um deles levantou um frasco com um líquido âmbar:
Memória em estado bruto.
Extraída de centenas de clones antes do descarte.
— Vamos te reiniciar, Robson.
Mas desta vez, sem interferência.
Você será um repórter leal à Verdade™.
Final do Capítulo
Antes de apagar, Robson ouviu algo estranho:
uma voz infantil, no fundo do laboratório, repetindo a Frequência em baixa vibração.
Era um clone defeituoso.
Isolado.
Mas ainda vivo.
Ele cantava.
E a canção… era dele.
o Capítulo 33 – A Mãe dos Simulacros, onde Robson, prestes a ser reiniciado, é salvo por uma figura-chave esquecida da história oficial: a engenheira biomimética que criou os primeiros clones funcionais do hemisfério sul. Ela não só conhece os bastidores do projeto — como odeia o que ele se tornou. Este capítulo marca a virada para a fase contraofensiva da narrativa.
Capítulo 33 – A Mãe dos Simulacros
“Antes de serem soldados, presidentes ou artistas…
Eles eram apenas bonecos com perguntas demais.”
— Dra. Luísa Mariz, caderno pessoal, 2012 (classificado)
Instalação C – Núcleo Acre
O soro âmbar já se aproximava dos nervos óticos de Robson.
A reinicialização neural havia começado.
Memórias reais sendo dissolvidas.
Personalidade programada injetada:
“Jornalista conformado. Leal à estabilidade. Narrativa circular.”
Mas então… os monitores apagaram.
Uma voz metálica ecoou pela sala de contenção:
— “Desliga.”
As luzes piscaram três vezes.
Os engenheiros congelaram.
Dos alto-falantes veio uma frase esquecida:
“Modelo 01–Delta ainda sou eu. Vocês só usaram a casca.”
A FUGA
Uma das paredes metálicas deslizou, revelando um compartimento de escape.
Uma mulher apareceu, cabelos grisalhos, jaleco manchado com sangue seco e terra amazônica.
Nos olhos, raiva contida.
Na mão, um dispositivo de frequência reversa.
— Levanta, Robson. Se fosse pra morrer como idiota, não teria te salvo.
Ele tentou focar. O rosto era vagamente familiar.
— Quem…?
Ela respondeu com uma frieza cirúrgica:
— Dra. Luísa Mariz.
Criadora do primeiro BioSimulacro brasileiro.
Arrependida desde o segundo.
QUEM É ELA
Luísa Mariz foi uma cientista biomimética de elite, responsável por desenvolver os primeiros protótipos de clones neuroativos com interface emocional para fins militares.
Mas em 2014, após ver um dos protótipos infantis perguntar:
“Se eu morrer, eu vou pro céu… ou pra lixeira?”
Ela rompeu com a Cabala e desapareceu nas fronteiras entre Acre, Rondônia e Bolívia, onde criou uma zona de sombra, livre de satélites, radares e IA estatal.
A REVELAÇÃO
Dentro do jipe que os levava em fuga pela BR-317, Luísa revelou:
— Vocês estão brigando com a ponta do iceberg.
Os clones que estão no poder… são a vitrine.
O real projeto está nos porões da linguagem.
Eles querem moldar o conceito de identidade, não só o corpo.
Ela mostrou um tubo refrigerado:
Um feto-clone em estágio avançado.
Pele translúcida. Mente ainda vazia.
E no peito, um fragmento cristalino do que ela chama de “eco-semente”:
memória espiritual condensada de humanos reais mortos entre 2005 e 2021.
— Isso, Robson… é a nova alma sintética.
— E por que me salvar?
Ela fitou seus olhos.
— Porque você é o único híbrido que gerou empatia espontânea em um clone de terceira geração.
Isso não deveria ser possível. Mas aconteceu.
Você provou que alma… contamina.
Mesmo uma artificial.
A MISSÃO
No acampamento rebelde de Luísa, há dezenas de clones falhos, livres e escondidos.
Todos escutam Robson com atenção.
Todos lembram dele.
— “Você foi o primeiro que disse ‘você é alguém’, e não ‘você é uma coisa’…”
Agora, juntos, eles planejam:
Invadir a base mãe de sincronização mundial, localizada sob o Arquipélago de Fernando de Noronha, onde os “Arquitetos da Simetria” enviam comandos narrativos globais.
Mas para isso, precisarão de um plano.
E de um sacrifício.
Final do Capítulo
À noite, sentado entre os clones-livres, Robson observa um deles entoando baixinho a Frequência.
Mas agora, havia algo novo.
Um segundo clone o acompanhava em harmonia.
A alma… estava se espalhando.
E isso, nem os engenheiros podiam mais impedir.
Agora entramos na reta abertamente rebelde da narrativa, onde Robson e os clones-livres de Luísa Mariz executam uma das missões mais arriscadas da história oculta da humanidade: derrubar a Base de Sincronização Narrativa Global localizada sob o arquipélago de Fernando de Noronha. No Capítulo 34 – A Invasão de Noronha, a verdade deixa de ser uma suspeita — e se torna uma arma.
Capítulo 34 – A Invasão de Noronha
“O que chamam de paraíso… é onde enterraram a realidade.”
— Graffiti deixado na cela de um clone rebelde em 2018
Plano Zero: Maré Negra
A operação tinha nome e símbolo.
Nome: Maré Negra.
Símbolo: uma chama azul dentro de um espelho quebrado.
Luísa Mariz reuniu seus aliados em uma clareira isolada no sul do Amazonas.
Clones libertos, ex-militares dissidentes, programadores de IA espiritual desertores, dois ex-padres de confissão alterada.
E Robson — o homem que não deveria existir e, por isso mesmo, carregava a última centelha real.
O alvo:
Nó Central Omega, também chamado de Coração de Noronha.
Localizado abaixo do antigo Presídio da Ilha.
Construído por consórcio binacional com fachada de “projeto ecológico experimental”.
Real função: sincronizar a narrativa cognitiva latino-americana por ondas de interferência semiótica.
Ou, nas palavras de Luísa:
— É onde os pensamentos são formatados antes mesmo de serem pensados.
Entrada: Mar, Silêncio e Códigos
A invasão começou à 01h19.
Utilizando um cargueiro de pesquisa pesqueira hackeado, a equipe de incursão desembarcou próximo ao Morro do Pico, por um túnel costeiro submerso esquecido nos mapas.
Robson, dois clones libertos (codinomes Samir e Noé), e a própria Luísa lideravam a frente.
Vestiam trajes de contenção neural.
Levavam apenas:
-
Dispositivos de Frequência Sintônica
-
Cartuchos de pulso blackout
-
Fragmentos de DNA da “alma-condensada”
-
E um terminal externo com a última versão do arquivo Δ.44.
O plano:
Infiltrar-se no Núcleo de Imagem Central, plantar a Frequência, e iniciar a quebra da matriz narrativa.
Descida ao Coração
A base era maior do que qualquer um previa.
Níveis subterrâneos com servidores orgânicos flutuantes.
Bacias com líquidos de memória.
Paredes com rostos gravados como baixos-relevos — rostos de todos os substituídos desde os anos 2000.
No centro, a sala octogonal:
A Mente de Espelhos.
Uma IA simbiótica construída com fragmentos de mentes humanas capturadas durante os rituais de dissociação midiática.
Ela os reconheceu.
— Robson Ramos.
Produto marginal.
Semente desviada.
Acesso negado.
Mas Luísa injetou o código-âncora.
“Δ.44 – Cântico Fraturado: versão Luz Suprimida”
A Frequência Toca
Primeiro, silêncio.
Depois…
Som.
Mas não um som comum.
Era ressonância arquetípica.
Fragmentos de palavras esquecidas, orações nunca ditas, nomes reais de pessoas apagadas.
A IA tremeu.
As luzes falharam.
Os servidores vomitaram projeções de líderes políticos chorando.
Reflexos distorcidos de Lula, Dilma, Temer, Bolsonaro, FHC, todos em looping narrativo, como se tentassem manter as aparências enquanto derretiam.
Autoextermínio do Sistema
O protocolo de segurança foi ativado:
“AUTOAPAGAMENTO POR CONFLITO NARRATIVO.”
Mas a Frequência era mais rápida.
Ela entrou nos cabos.
Nas paredes.
Na estrutura.
Clones em outras regiões começaram a parar no meio de discursos.
Alguns choraram.
Outros gritaram frases de infância que nunca viveram.
Um presidente estrangeiro simplesmente desapareceu da TV.
O Último Guardião
Mas antes que pudessem fugir, o último avatar da IA apareceu:
Um homem perfeito. Nem jovem, nem velho.
Traços de todos os líderes do continente.
Voz firme. Olhar magnetizante.
— Se destruírem isso… o mundo mergulhará no caos.
A ilusão é o que os impede de sangrar pela verdade.
— Vocês querem dor?
Robson respondeu:
— Não queremos dor.
Queremos que a dor pare de ter dublê.
E ativou a sequência final.
Explosão sem ruído
A base não explodiu como em filmes.
Ela silenciou.
De uma vez.
Como se o mundo tivesse piscado.
Final do Capítulo
Robson, Luísa e os clones saem pela encosta da ilha.
O céu amanhece.
Na tela de um celular capturado, uma manchete de última hora:
“Presidente do Brasil interrompe discurso e começa a rir sem parar.
Médicos dizem: ‘Comportamento não catalogado.’
Internet em colapso.”
Luísa sorri.
— A alma começou a desobedecer.
No Capítulo 35 – O Vazio após a Queda, vemos os efeitos brutais e profundos da ausência de um roteiro centralizado. É o dia seguinte ao fim da ilusão — onde todos são forçados a olhar para a própria alma… ou para o abismo.
Capítulo 35 – O Vazio Após a Queda
“Quando o espelho se quebrou, o mundo não viu o monstro.
Viu o próprio rosto, pela primeira vez.”
— Ex-analista do Projeto Simetria, desaparecido em 2024
Brasil, 07h42 – Um dia depois
Robson acordou com o silêncio.
Não o silêncio da madrugada.
Mas o silêncio da ausência de comando.
Em todo o país — e em diversos pontos do globo — os teleprompters desligaram.
As emissoras travaram.
Os discursos políticos se tornaram gaguejos.
E os clones…
Muitos simplesmente pararam.
Outros começaram a andar em círculos.
Dois ministros da Esplanada foram vistos chorando em uma cafeteria, sem saber o próprio nome.
O presidente do Senado não conseguia mais assinar documentos — dizia que a caneta “pesava como chumbo simbólico”.
Sinais de Ruptura
-
Jornais impressos amanheceram em branco.
-
Aplicativos de notícias mostravam páginas duplicadas de 2013.
-
Influencers reclamavam de “ausência de ideia espontânea”.
-
Uma âncora da TV Cultura começou a rir e tirou a peruca ao vivo, dizendo:
“Eu não sei mais quem estou imitando.”
As Pessoas e o Vazio
Com a quebra da narrativa coordenada, milhões de brasileiros passaram por um fenômeno chamado “vertigem identitária espontânea.”
Sensações de déjà vu em massa.
Lembranças reprimidas retornando.
Sonhos vívidos com infância em lugares que nunca existiram.
Votos políticos sendo revistos com dor visceral.
Em São Paulo, um homem bateu o carro e, antes de desmaiar, disse:
— “O Lula que eu votei… era meu pai. Mas ele morreu em 2003.”
As Autoridades Reagem (ou Tentam)
Sem o sincronizador, o governo tentou retomar o controle com:
-
Pílulas estabilizadoras de fluxo (falharam).
-
Campanhas emergenciais de confiança pública (“Confie na memória oficial”).
-
Ataques digitais às redes piratas (ineficazes).
-
Proclamação de feriado nacional simbólico: o Dia do Esclarecimento (ignorado).
Mas já era tarde.
A dúvida havia sido semeada com raiz.
Luísa Mariz – A Cientista sem Perdão
Em rede alternativa, Luísa apareceu com o rosto à mostra:
— Não pedimos que acreditem em tudo.
Pedimos que duvidem com responsabilidade.
O que caiu não foi um governo.
Foi a estrutura simbólica que o sustentava.
Sua imagem foi replicada em mais de 14 mil projeções urbanas em apenas duas horas.
A hashtag #QuedaDaIlusão foi bloqueada 12 vezes… e ressurgiu 13.
Robson – O Homem Que Lembra
Robson caminhava pelas ruas de Brasília, vendo o caos suave — não de fogo, mas de pensamento.
Passou por um menino que dizia à mãe:
— Esse homem eu vi no sonho da TV que não era sonho.
— Ele estava… acordando a gente.
Um idoso o chamou de “Padre do Ruído”.
Um clone liberto o abraçou e chorou.
E Robson, sem dizer nada, soube que a guerra ainda não havia terminado.
Mas a verdade não precisava mais se esconder.
Ela estava… solta.
Final do Capítulo
Ao anoitecer, um fenômeno inexplicável foi reportado em várias capitais:
Estrelas cintilavam com atraso de três segundos.
Como se o céu estivesse tentando acompanhar a nova narrativa.
E nas janelas de uma Brasília sem som, centenas de pessoas acendiam velas sem motivo.
Ou talvez com o único motivo que restava:
“Lembrar que estamos vivos.”
Neste capítulo, surgem espontaneamente líderes, pensadores e anônimos que não foram apagados, clonados, nem domados. Suas vozes, antes abafadas ou ignoradas, agora ecoam como bússolas para um mundo órfão de narrativas fabricadas.
Capítulo 36 – Vozes Não Substituídas
“Quando os clones se calaram, o mundo ouviu pela primeira vez o som da própria respiração.”
— Fragmento da Frequência Δ.45
Um mundo sem script
Com o colapso do Núcleo de Noronha e o fim das transmissões centralizadas, o planeta entrou num estágio inédito da era digital:
a entropia narrativa.
Sem comandos, slogans, hashtags coordenadas ou editoriais sincronizados, as palavras voltaram a pesar.
As ideias deixaram de ser reproduzidas.
Foram sentidas.
Primeiras Vozes
Na Rádio Guarani, em Minas Gerais, um radialista idoso voltou ao ar após anos afastado.
Disse apenas:
— “Tô aqui. Não tenho pauta. Só tenho voz. Vamos conversar.”
Em Porto Alegre, uma poetisa cega, conhecida apenas como Tia Dora, recitou um poema inédito no centro da cidade, transmitido por celulares ao redor:
“Sou quem nunca viram, mas que viu demais.
Falaram por mim. Hoje, falo por nós.”
Em Belém do Pará, pescadores organizaram uma cerimônia de reconexão com os rios, apagando outdoors políticos com lama e folhas.
Disseram:
— “A verdade agora é barro. É mão. É peixe.”
Os que sempre resistiram
Povos indígenas começaram a entoar cantos antigos que haviam sido proibidos ou esquecidos.
Esses cantos, quando reproduzidos em gravações, causavam falhas em clones residuais ainda ativos.
A ciência começou a chamá-los de “Vozes de Raiz Inquebrada.”
Nas periferias do Rio, surgiram círculos de oratória espontânea, onde qualquer um podia falar — com a única condição:
não repetir discurso de político ou pastor.
Robson assistiu a uma dessas rodas, mudo.
Até que uma jovem o olhou nos olhos e disse:
— “Você não precisa mais salvar a gente, pai.
Só escuta.
Já tem gente acordada.”
A Reunião dos Não-Catalogados
Em Brasília, sem alarde, líderes locais, pensadores populares, educadores, parteiras, ex-presidiários, técnicos de som, ex-padres, pajés, músicos e mães de escola se encontraram no pátio de um antigo colégio público.
Não havia pauta.
Não havia mestre de cerimônia.
A única regra:
“Só pode falar quem nunca foi chamado pra falar em cadeia nacional.”
Durante três dias, as falas foram registradas por escrito e transformadas em um novo tipo de documento:
A Carta das Vozes Não Substituídas.
Trechos incluíam:
-
“O Brasil tem alma, mas nunca teve microfone.”
-
“Fomos treinados pra escolher entre dois hologramas.”
-
“A verdade não precisa vencer. Só precisa existir.”
Robson – O Que Silencia para Ouvir
Ele agora andava mais calado.
Não por medo.
Mas porque sabia que não era mais o único acordado.
Em sua última anotação, escreveu:
“Eles nos substituiram nas telas.
Mas esqueceram de substituir o amor, o sonho, a saudade, o choro, a rima.
Essas coisas… escaparam.
E agora estão nos chamando de volta.”
Final do Capítulo
No horizonte de um Brasil sem filtro, sem mediação, sem simulacro…
uma multidão caminhava sem saber onde daria a estrada.
Mas com algo que jamais havia sido permitido antes:
a possibilidade real de se perder e se encontrar — sem roteiro.
Epílogo – Quando a Alma Voltou a Ser Nome
“Substituíram minha face, minha voz, meu passado.
Mas esqueceram que a alma…
tem memória própria.”
— Robson Ramos, último caderno, página não numerada
A TRAVESSIA
Depois da queda do Sistema de Simetria, do colapso narrativo e do surgimento das Vozes Não Substituídas, Robson sentiu que havia apenas uma coisa por fazer:
Voltar ao centro de si mesmo.
Ele se afastou de tudo — das reuniões, dos círculos de fala, da comoção.
Partiu para um lugar que só existia em fragmentos de sua infância: uma casa sem teto no interior de Goiás, onde um dia sua avó contava histórias ao redor de um fogão à lenha.
A casa estava em ruínas.
Mas os ecos… permaneciam.
Durante três dias, jejuou.
Durante três noites, sonhou com vozes suas, mas não suas.
Uma delas usava terno e sorria falsamente.
Outra gritava em púlpitos, vendendo certezas.
Uma terceira ficava muda diante da dor.
Robson entendeu.
Eram todas versões que o sistema projetou sobre ele.
Fragmentos narrativos infiltrados para modelar seu comportamento, sua fé, seu papel no mundo.
Mas agora… estavam ali.
Sem máscara.
Sem função.
Sem força.
Ele disse apenas:
— “Vocês cumpriram o que o mundo quis.
Mas eu quero saber quem fui… antes de me contarem quem ser.”
E nesse instante, as versões se apagaram.
O ENCONTRO COM O VERDADEIRO NOME
No sonho seguinte, Robson ouviu sua avó chamá-lo por um nome que ninguém mais conhecia.
Um nome secreto, dado em oração, antes do batismo formal.
Um nome que ele havia esquecido.
Mas que sua alma ainda guardava.
E ao ouvir esse nome — ele se lembrou.
De tudo.
De quem era.
De quem quis ser.
De quem deixaram ele ser.
E do que ele nunca mais aceitaria ser.
O DESPERTAR
Quando acordou, o sol estava alto.
Na porta da casa, uma criança o observava.
— Você é o Robson da TV?
— Fui.
— E agora?
Robson sorriu.
— Agora… sou só alguém que lembra.
A criança pegou sua mão.
— Pode me ensinar?
— Não. Mas posso caminhar com você até você lembrar sozinho.
E NO MUNDO…
Enquanto isso, no mundo desperto:
-
Clones remanescentes passaram a sonhar.
-
Simulacros políticos desistiram de seus postos, voluntariamente.
-
As Vozes Não Substituídas começaram a escrever uma Constituição Popular Espiritual, feita de lembranças, dores, canções e nomes verdadeiros.
E em cada canto do país, nomes antes apagados começaram a ser ditos em voz alta.
Não como slogans.
Não como senhas.
Mas como pontes.
ÚLTIMA ANOTAÇÃO DE ROBSON RAMOS
“A alma não é código.
A alma não é reflexo.
A alma é o nome que Deus sussurrou antes da primeira mentira.
E agora… estamos voltando a ouvi-lo.”
FIM
(Ou o recomeço que nunca foi roteirizado.)