6. A Rejeição de Ellen G. White em 1888
 

O que Ellen White diz a respeito da reação contra a mensagem de 1888 soa quase incrível. Poderia dar-se que uma descrença naturalmente cubra nossos olhos e coração? Nós, seres humanos, parecemos ter dificuldade em crer no "testemunho de Jesus". Aquilo que foi uma derrota gostamos de chamar "uma gloriosa vitória". Onde perdemos o rumo presumimos que o encontramos.

Devemos esclarecer impressões confusas, nebulosas para fixar-nos na precisão o máximo possível. Vários canais de bênção celestial foram bloqueados pela reação negativa para com a mensagem de 1888. Os habitantes do céu já reconhecem o que "nós" fizemos nessa história, como segue:

(1) O Espírito Santo Foi Insultado

Isso pode soar impossível, por várias razões. Pode ser difícil para nós prontamente conceber o Espírito Santo como uma Pessoa que pode ser insultada ou que pode sentir e preocupar-Se a respeito. E pode ser ainda mais difícil conceber como os adventistas do sétimo dia podiam fazer uma coisa tal -- certamente não pastores e dirigentes da Associação Geral. Mas devemos defrontar o que a mensageira do Senhor tem a dizer. O testemunho de Jesus não passa por alto a realidade:

"Agora nossa assembléia aproxima-se do seu encerramento e . . . não tem havido nenhuma abertura para que o Espírito de Deus entre. Agora eu estava dizendo, de que vale nos reunirmos aqui e de nossos irmãos ministrantes virem se eles estão aqui somente para impedir o Espírito de Deus de alcançar o povo?" (Ms. 9, 1888; Olson, pp. 290, 291).

"Houve, eu sei, uma impressionante cegueira sobre as mentes de muitos [em Mineápolis], de modo que não discerniram onde o Espírito de Deus estava e o que constituía a verdadeira experiência cristã. E considerar que esses eram os que tinham a guarda do rebanho de Deus era penoso. . . .

"Nossos irmãos que têm ocupado posições de liderança na obra e causa de Deus deveriam estar tão intimamente ligados com a Fonte de toda a luz que não chamariam à luz trevas, e às trevas luz." (Ms. 24, 1888; ênfase acrescentada).

Os detalhes desta história são precisos e nítidos. Não precisa haver nenhuma confusão em nosso pensamento com respeito a intangíveis. O recebimento do Espírito Santo estava implícito no recebimento da própria mensagem. Seria impossível receber o dom do Espírito Santo da chuva serôdia e não receber a mensagem mediante a qual o dom era concedido. E as boas novas que hoje necessitamos assimilar é o corolário desta verdade: é igualmente impossível receber a mensagem hoje e não receber o dom do Espírito Santo nela implícito. Se não temos recebido o Espírito Santo no poder da chuva serôdia e do alto clamor, isso é clara evidência de que não recebemos a mensagem que o Senhor nos enviou.

O que é importante na compreensão de 1888 não é a atitude negativa de uns poucos indivíduos, uma chamada minoria empedernida, mas o espírito que "controlava" ou "prevalecia" na Assembléia de 1888 e posteriormente. Foi isso que teve um efeito determinante sobre aquela geração, e tem tido sobre cada geração desde então. Ellen White é clara a respeito dessa influência "controladora":

"Encontrei-me com os irmãos no tabernáculo e senti ser meu dever apresentar um breve histórico da assembléia e minha experiência em Mineápolis, o roteiro que havia seguido e por que, e claramente declarar o espírito que prevalecia naquela assembléia. . . . Eu lhes disse da posição difícil em que fui colocada, para, por assim dizer, permanecer sozinha e ser obrigada a reprovar o espírito errado que era um poder controlador nessa reunião. A suspeita e ciúme, as murmurações e a resistência ao Espírito de Deus que lhes apelavam pareciam-se mais com o modo por que os reformadores tinham sido tratados. Era a própria ordem em que a igreja [Metodista] tinha tratado a família de meu pai e oito dentre nós. . .

"Declarei que o roteiro que tinham estado seguindo em Mineápolis era crueldade para com o Espírito de Deus." (Ms. 30, 1889; ênfase acrescentada).

"[Os irmãos oponentes] foram movidos durante a assembléia [de Mineápolis] por outro espírito, e não sabiam que Deus havia enviado esses jovens para levarem uma mensagem especial a eles, a qual trataram com ridicularia e desprezo, não reconhecendo que as inteligências celestes estavam olhando para eles. . . Eu sei que naquele tempo o Espírito de Deus foi insultado." (Carta S24, 1892).

"Os pecados . . . jazem à porta de muitos... O Espírito Santo tem sido insultado, e a luz tem sido rejeita­da." (TM 393; 1896).

"Alguns 1 têm tratado o Espírito como um visitante incômodo, rejeitando o recebimento do rico dom, recusando reconhecê-Lo, dando-Lhe costas, e condenando-O como fanatismo." (TM 64; 1896).

A idéia de insultar o Espírito Santo é mais do que uma hipérbole passageira. Esta tragédia nos afeta hoje tão certamente quanto os erros dos judeus afetaram-nos há muito tempo.

Um pecado que um indivíduo cometeu há tempos no passado como um insulto a outra pessoa permanece como um peso sobre sua consciência e afeta o caráter e personalidade. Isso pode prosseguir até por décadas, na medida em que ambos os indivíduos viverem e até que o arrependimento e restituição tenham lugar.

De mesma forma, a consciência da corporação da Igreja, nosso caráter e personalidade denominacionais, nossa postura perante o Céu, o espírito que permeia nossas igrejas, são afetados negativamente por esse episódio vital de nossa história. Nossa herança ambiental é inescapável. Jeremias diz que "o pecado de Judá está escrito . . . com diamante pontiagudo . . . na tábua do seu coração e nas pontas dos seus altares" (Jeremias 17:1). E ele se estende duma geração a outra (2:5, 9; 3:24, 25; 14:20). Até que o arrependimento tenha lugar, condenamo-nos a repetir os pecados de nossos pais. A alienação do Espírito Santo está profundamente envolvida.

O Espírito Santo é uma pessoa, não uma mera influência ou uma entidade etérea. Ele pode ser ofendido. Esse agudo conceito da personalidade de Deus como o Espírito Santo perspassa as Escrituras hebraicas. Os profetas estavam constantemente representando a Deus como o amante desapontado e ofendido da alma de Israel 2. O conceito é peculiar para Israel, pois nenhuma religião pagã tinha qualquer concepção de uma personalidade divina "ciumenta".

A mesma verdade se revela no Novo Testamento, e é também impressionantemente realçada nos testemunhos de Ellen White. Contudo, a idéia está geralmente ausente nos ensinos do moderno catolicismo e protestantismo. Uma plena apreciação dessa realidade é exclusiva àqueles que receberão o Senhor por ocasião de Sua segunda vinda, pois são coletivamente representados como uma noiva que finalmente aprontou-se para o relacionamento íntimo do matrimônio (Apocalipse 19:7-9; A heresia do panteísmo do início do século vinte atacava esta verdade da personalidade do Espírito Santo; o "ômega" sem dúvida reforçará esse erro).

Ofendido e insultado, Ele tem direito a retribuição. E como pode buscá-la, de modo coerente com o Seu caráter de amor? Sua retribuição é mais pungentemente penosa de suportar do que qualquer outra, pois ainda será a voz de amor que fala:

"Haverá mensagens transmitidas, e aqueles que têm rejeitado a mensagem que Deus envia ouvirão declarações as mais chocantes. . . . Magoada e insultada, a Divindade falará, proclamando os pecados que têm estado ocultos. Tal como os sacerdotes e governantes, cheios de indignação e terror, buscaram refúgio em fuga do último cenário da purificação do Templo, assim se dará na obra para estes últimos dias." (Special Testimonies, Série A, nº 7, pp. 54, 55).

O contexto dessa declaração é uma discussão da Igreja Adventista do Sétimo Dia.

 

(2) Jesus Cristo Foi Rejeitado e Insultado

Isto também nos é difícil de ver. Uma vez mais, a personalidade do Filho de Deus está em debate. Tem Ele sentimentos como nós, humanos, temos? Pode Ele ser ofendido? O que aconteceu em nossa história de 1888 parece tão assustador que a história seria inacreditável se não estivesse narrada claramente nos escritos de Ellen White. O seu discernimento foi inspirado.

O manso e humilde Jesus ainda escolhe mensageiros que são "somente homens", que se assemelham "a uma raiz de uma terra seca". Ele condescendeu em identificar-Se com os mensageiros de 1888 e foi ofendido e insultado quando as "credenciais celestes" que lhes concedeu foram desprezadas:

"Aqui estava evidência, que todos poderiam discernir a quem o Senhor reconheceu como Seus servos. . . Esses homens contra quem tendes falado têm sido como sinais no mundo, como testemunhas para Deus. . . Se rejeitais aos mensageiros delegados de Cristo, rejeitais a Cristo." (TM 97; 1896).

"Acusar e criticar aqueles a quem Deus está usando é acusar e criticar o Senhor que os enviou. . . .

"Para muitos o clamor do coração tem sido: "Não teremos este homem [Cristo] reinando sobre nós". . . A verdadeira religião, a única religião do Salvador ressurreto, que advoga justificação pela fé do Filho de Deus, tem sido diminuída, criticada, ridicularizada, e rejeitada." (TM 466-468).

"A mensagem atual . . . é uma mensagem procedente de Deus; ela traz as credenciais divinas, pois os seus frutos são para santidade." (RH 3 de setembro de 1889).

"Esta mensagem, como tem sido apresentada [por Jones e Waggoner] deveria ir a toda igreja que alega crer na verdade, e conduzir o nosso povo a uma posição mais elevada. . . . Desejamos ver quem tem apresentado ao mundo as credenciais celestes." (ibid., 18 de março de 1890).

Mas mesmo em tempos modernos, nosso estimado historiador eclesiástico desdenha o mensageiro, se não a própria mensagem:

"Ao remontarmos à controvérsia percebemos que foram os rancores despertados por personalidades, muito mais do que diferenças em crença, que causaram a dificuldade. O partido de Butler, Smith e Morrison cria na teoria da justificação pela fé. . . O partido de Waggoner e Jones cria na prática de boas obras; mas . . . demoravam-se quase exclusivamente sobre a fé como o fator da salvação. As mentes que podiam raciocinar serenamente tinham condições de harmonizar essas opiniões, mas nenhum dos lados se dispunha a considerar o outro lado serenamente." (Spalding, Captains of the Host [Capitães da hoste], p. 599).

Uma avaliação mais exata seria que os mensageiros de 1888 "demoravam-se quase exclusivamente" numa "fé que opera pelo amor", precisamente como Paulo pregava (Gálatas 5:6). Essa mensagem com "credenciais divinas" não era uma mistura comprometedora de legalismo e evangelho. Eles proclamavam com muita ênfase a justificação pela fé somente -- mas era a fé do Novo Testamento que demonstra seu poder motivador implícito para a verdadeira obediência a todos os mandamentos de Deus (TM 92).

Acaso aqueles mensageiros que se declarava deverem representar nosso Senhor "despertaram" os "rancores" que fizeram o Céu abandonar o cenário envergonhado? Iria o Senhor conceder "credenciais celestes" a mensageiros que não se dispusessem a "raciocinar serenamente"? Ellen White, certamente, nunca poderia reconhecer "preciosa luz" em não-santificados "gritos" ou irrazoável "ensinamento extremista" que nosso autor lhes atribui. (Spalding, op. cit., pp. 593, 601).

Por trás da vergonhosa cena em Mineápolis e das confusas sombras causadas por nossa descrença hoje, permanece a Figura que foi a Rocha de ofensa e a Pedra de tropeço daquela fatídica assembléia. Defrontamos face a face a realidade:

"Homens professando santidade têm desprezado a Cristo na pessoa de Seus mensageiros. à semelhança dos judeus, eles rejeitaram a mensagem de Deus. . . Ele não era o Cristo que os judeus estavam à procura. Assim hoje as agências que Deus envia não são o que os homens têm estado a buscar." (FCE 472; 1897).

"Cristo tem registrados todos os duros, orgulhosos, zombeteiros discursos proferidos contra os Seus servos como sendo contra Si próprio." (RH, 27 de maio de 1890).

O verdadeiro Cristo tem sempre sido mal assimilado. Como se espera com freqüência, Ele com idêntica freqüência tem sido rejeitado. Mas o moderno Israel deve vencer pelo menos todas as falhas passadas do antigo Israel. Isso terá lugar, pois estamos vivendo no tempo da purificação do santuário celestial. Essa é uma obra especial do tempo do fim de vitória que nunca foi completada no passado.

A carne e o sangue nunca nos revelam as verdadeiras credenciais da "raiz numa terra seca" que deve apresentar-se diante de nós. A história de 1888 nos ensina que os antigos judeus terão que deixar espaço para que ao lado deles nos ajoelhemos:

"Muitos dizem, 'Se eu tivesse somente vivido nos dias de Cristo, não teria torcido Suas palavras, ou interpretado falsamente as Suas instruções. Não O teria rejeitado e crucificado, como fizeram os judeus'. Mas isso será provado pelo modo em que tratais sua mensagem e Seus mensageiros hoje." (RH, 11 de abril de 1893).

A questão de 1888 não foi quanta "ênfase" colocar sobre a pregação desta "doutrina" com relação às nossas outras doutrinas "peculiares". A verdadeira questão era, "O que pensais vós de Cristo?" É-nos fútil hoje falar de estabelecer um correto "relacionamento com Cristo" a menos que defrontemos esta realidade de 1888.

A fim de reforçar nossa confiança de que não precisamos de arrependimento, temos produzido teses de Seminário "para indagar que lugar o ensino de justificação pela fé tem sido atribuído juntamente com as crenças distintivas" da Igreja. Gráficos têm sido elaborados contando o número de vezes que as palavras "justificação", "fé", "salvação", "Salvador", e "lei" têm aparecido em nossos trimensários da Escola Sabatina, "para provar que os adventistas do sétimo dia não têm reduzido a ênfase em salvação mediante Cristo". Poderiam agora os computadores medir nossa fidelidade e provar que a Verdadeira Testemunha está errada? Se mera verbalização é o critério, o catolicismo romano deve ser o ensino mais cristocêntrico do mundo. Enquanto o Filho de Deus continua a sofrer, devemos lançar sortes em várias pesquisas para ver como dividir Suas vestes, esta "doutrina ou crença da justificação pela fé juntamente com as crenças distintivas da Igreja?" A justiça de Cristo é vastamente mais do que uma mera repetição verbal.

A maior oportunidade escatológica de todos os tempos foi rejeitada em nossa era de 1888. O que se desprezou foi uma íntima reconciliação do coração com Cristo tal como um noivo sente por sua noiva. Mas verbalização e doutrina fria têm sido substitutos disso.

Homílias áridas que se perdem em pormenores entre justiça imputada e comunicada, justificação e santificação, expiação e propiciação, têm tornado o tema da "justificação pela fé" entediante para muitos. A mesma dificuldade prevaleceu pouco após 1888. Ellen White discute os esforços daqueles cujos corações se opunham à mensagem:

"Muitos cometem o erro de tentar definir minuciosamente os finos pontos de distinção entre justificação e santificação. Nas definições desses dois termos muitas vezes trazem suas próprias idéias e especulações. Por que tentar ser mais minucioso do que a Inspiração na questão vital da justificação pela fé? Por que tentar desenvolver cada pormenor, como se a salvação da alma dependesse de todos terem exatamente o seu entendimento dessa questão?" (Diário, 27 de fevereiro de 1891).

Podemos chegar a ver como o Cristo vivente e amorável foi insultado em Mineápolis, e não a fria doutrina mal compreendida! Deixamos de confiar naquelas vibrações do coração que eram a atração Dele, e lançamos desprezo sobre Aquele que nos estava atraindo, atribuindo a Sua ternura a designação de "fanatismo". As lágrimas que começaram a fluir da misteriosa atração da soerguida cruz extraiu de nós zelosas declarações "contra o entusiasmo e o fanatismo" (TM 80, 81).

Jesus conhece a nossa natureza humana, pois Ele próprio ainda compartilha dela. Ele é uma Pessoa. Ele também conhece o respeito próprio. Ele aproximou-se de nós em 1888. "Nenhuma alma dentre nós sonha o que poderia ter sido" nos doces dias que se teriam seguido, caso andássemos com Ele na gloriosa luz celestial. Freqüentemente falamos de 1844 como o "Grande Desapontamento". Mas em 1888 deu-se o Seu desapontamento, pois podemos ler de como Ele nos amou. Essa intimidade de amor não a teríamos. Por que nos deveríamos maravilhar se Ele não a forçasse sobre nós?

Foi-nos dito na própria Mineápolis:

"Ninguém deve permitir fechar o canal pelo qual a luz da verdade virá ao povo. Tão logo isso seja tentado, o Espírito de Deus será extingüido. . . . Permiti que o amor de Cristo reine nos corações aqui. . . . Quando o Espírito de Deus entrar, o amor tomará o lugar da hesitação, porque Jesus é amor; se o Seu Espírito fosse acariciado aqui, nossa assembléia seria como uma corrente d'água no deserto." (Ms. 15, 1888; Olson, pp. 300, 301).

"Não mais ternos chamados, nenhuma melhor oportunidade poderia ser-lhes dada a fim de que pudessem realizar o que deveriam ter feito em Mineápolis. . . Ninguém pode dizer quanto pode ter estado em jogo quando se negligencia a conformação com o chamado do Espírito de Deus. Virá o tempo quando estarão dispostos a fazer qualquer coisa possível a fim de ter uma chance de ouvir o chamado que rejeitaram em Mineápolis. . . Melhores oportunidades jamais virão, sentimentos mais profundos não terão." (Carta 019, 1892).

Uma vez mais o testemunho de Ellen White estende a nossa fé. Mas devemos compreender a realidade. Os corações humanos fizeram pouco caso do terno amor dAquele que deu o Seu sangue por nós. Finalmente, da parte de "muitos" na liderança, a leviandade transformou-se naquilo que Ellen White tristemente chamou de "ó­dio". Sete anos após Mineápolis ela disse àqueles "muitos":

"Voltastes as costas, não a face, ao Senhor. . . O Espírito de Deus está partindo de muitos dentre o Seu povo. Muitos avançam por veredas escuras e secretas, e alguns desses nunca regressarão. . . Eles não só recusaram aceitar a mensagem, mas odiaram a luz. . . Estão votando ao desprezo o Seu Espírito Santo." (TM 89-91; 1895).

O Céu "indignou-se" (TM 76). Há uma intimidade de angústia pessoal envolvida aqui que é peculiar na moderna história religiosa, talvez em todos os tempos. São-nos lembrados os lamentos profundos de Jeremias e Oséias do passado. Ellen White declarou em Mineápolis: "Se somente soubésseis como Cristo tem considerado a vossa atitude religiosa nessa assembléia" (Ms. 8a, 1888; Olson, p. 281). Quatro anos depois, "há tristeza no céu quanto à cegueira espiritual de muitos de nossos irmãos" (RH, 26 de julho de 1892). Falando daqueles "que resistiram ao Espirito de Deus em Mineápolis," ela declarou:

"Todo o universo celestial testemunhou o tratamento descaridoso de Jesus Cristo, representado pelo Espírito Santo. Tivesse Cristo estado perante eles, teriam-No tratado de modo semelhante àquele em que os judeus trataram a Cristo." (Special Testimonies [Testemunhos especiais], Série A., nº 6, p. 20).

"As cenas que tiveram lugar naquela assembléia [de Mineápolis] fizeram o Deus do céu envergonhar-Se em chamar aqueles que tomaram parte nelas de Seus irmãos. Tudo isso o Vigilante celeste anotou, e foi escrito no livro das lembranças de Deus." (Special Testimony to the Review and Herald Office [Testemunho especial ao es­critório da Review and Herald], 1896, pp. 16, 17).

Estas são palavras muito tristes para registrar, mas não podemos ser honestos e recusar encarar a implicação plena delas. O que "o Vigilante celeste anotou" deve também estar "escrito no livro de [nossa] lembrança". Podemos ver-nos naqueles caros irmãos de um século atrás, pois, "pela graça de Deus, eu sou".

 

(3)O Ministério de Ellen White Foi Desprestigiado

A atitude da liderança para com o apoio de Ellen White à mensagem de 1888 foi semelhante ao do antigo Israel e Judá a profetas tais como Elias e Jeremias. Observem os seus comentários francos pouco depois da assembléia de Mineápolis:

"Não tenho tido um tempo fácil desde que deixei a costa do Pacífico. Nossa primeira reunião não foi semelhante a qualquer outra Assembléia de Conferência Geral de que já participei. . . Meu testemunho foi ignorado, e nunca em minha vida fui tratada como na assembléia [de 1888]." (Carta 7, 9 de dezembro de 1888).

"Irmãos, estais me instando a ir a vossas campais. Devo dizer-vos claramente que as atitudes tomadas contra mim e minha obra desde a Assembléia da Assoc. Geral de Mineápolis -- vossa resistência à luz e advertências que Deus tem dado por meu intermédio -- tem tornado os meus esforços cinqüenta vezes mais difíceis do que teria sido doutro modo. . . Parece-me que puseste de lado a Palavra do Senhor como indigna de vossa atenção. . . Minha experiência desde a assembléia em Mineápolis não tem sido muito asseguradora. Tenho pedido ao Senhor por sabedoria diariamente, e para que não me sinta inteiramente descoroçoada, descendo à sepultura de coração partido como ocorreu com o meu marido." (Carta 1, 1890).

Essas não eram palavras de uma mulher dominada pelas emoções. Ela tinha boas razões para os seus sen­timentos:

"Relatei na reunião de quinta-feira de manhã [em Ottawa, Kansas] algumas coisas com referência à as­sembléia de Mineápolis. . . .

"Deus me deu alimento no tempo certo para o povo, mas foi recusado por não ter vindo exatamente da maneira que esperava que viesse. Os Pastores Jones e Waggoner apresentaram luz preciosa ao povo, mas o preconceito e descrença, ciúme e vãs suspeitas barraram a entrada dos corações de modo que nada dessa fonte poderia encontrar entrada em seus corações. . . .

"Assim como se deu na traição, julgamento e crucifixão de Jesus, tudo isso tinha passado perante mim ponto por ponto e o espírito satânico tomou o controle e moveu-se com poder sobre os corações humanos, que haviam se aberto a dúvidas e amargura, ira e ódio. Tudo isso era prevalecente durante a assembléia [de Mineápolis]. . .

"Fui conduzida à casa onde nossos irmãos faziam sua habitação, e havia muita conversação e excitação de sentimentos e alguns comentários penetrantes e supostamente inteligentes e irônicos. Os servos aos quais o Senhor enviara eram ridicularizados e colocados sob uma luz ridícula. O comentário . . . passou por mim e a obra que Deus me havia dado a cumprir era qualquer coisa menos lisonjeira. O nome de Willie White era utilizado livremente e ele era ridicularizado e denunciado, também os nomes dos Pastores Jones e Waggoner." (Carta 14, 1889; ênfase acrescentada).

"Vozes que estava surpresa em ouvir uniam-se nessa rebelião, . . . duras, ousadas e decididas em denunciar [a irmã White]. E de todos aqueles tão livres e avançados em suas cruéis palavras, ninguém havia vindo a mim para indagar se aqueles relatórios e suas suposições eram verazes. . . . Após ouvir aquilo tudo, meu coração afundou dentro em mim. Nunca havia imaginado perante minha mente que tipo de confiança podemos depositar naqueles que alegam ser amigos, quando o espírito de Satanás encontra acesso aos seus corações. Pensei na crise futura, e sentimentos que nunca posso transpor em palavras por um breve momento me dominaram. . . . 'O irmão trairá o seu irmão até a morte'." (idem).

Não seria justo caracterizar a reação íntima de Ellen White a isso como "emocional", bem como a de Jones e Waggoner. Mas todos os três eram seres humanos com corações que podiam ser feridos. Todos os três sentiram dor e angústia, como se dera com os antigos profetas. Ellen White em particular sentia profundamente as premonições da perseguição final dos santos. Ela em realidade empregou a palavra "perseguição" para descrever a atitude íntima de irmãos dirigentes para com os mensageiros de 1888 (GCB 1893, p. 184).

Por outro lado, era um enigma aos sinceros irmãos daquela época como ela podia apoiar dois jovens apa­entemente deficientes contra o julgamento sereno e sólido de quase todos os dirigentes e pastores estabelecidos. Se "equilíbrio" se fazia necessário, por que apoiava os aparentemente desequilibrados? Por que comparava a reação dos irmãos contra a mensagem de Jones e Waggoner à reação dos judeus contra Cristo?

A oposição a 1888 era composta de pastores bons, sinceros, altruístas e grandes trabalhadores. A preocupação deles com o progresso da Igreja era genuína. Foi o temor deles de que essa bela visão da justiça de Cristo conduzisse ao fanatismo. Mas esse temor calcificou os corações humanos. Parece haver somente uma maneira de entender essa misteriosa reação. Um estudo cuidadoso das numerosas declarações de Ellen White indica que era à revelação da largura, comprimento, profundidade e altura do amor de Cristo (ágape) que nosso queridos e ativos irmãos estavam se opondo instintivamente. O amor revelado na cruz "nos constrange" de modo que os crentes doravante acham impossível prosseguir vivendo para o eu (2 Coríntios 5:14, 15). A profunda verdade parece ser que esse tipo de devoção a Cristo, esta intimidade maior com Ele, foi mal acolhida:

"Aqui estava evidência de que todos poderiam discernir a quem o Senhor reconhecia como Seus servos. Mas há aqueles que desprezaram os homens e a mensagem que traziam. Eles o têm rotulado de fanáticos, extremistas e entusiastas." (TM 97; 1896).

"Esses homens [da oposição] têm estado mantendo posições de confiança, e têm moldado a obra segundo sua própria semelhança, na medida em que o puderam. . . Eles têm estado zelosamente denunciando o entusiasmo e o fanatismo. Fé . . . que Deus tem requerido que Seu povo exerça, é chamada de fanatismo. Mas se há algo sobre a terra que deveria inspirar os homens com zelo santificado, é a verdade tal como está em Jesus, . . . Cristo, feito a nós sabedoria, e justiça, e santificação e redenção.

". . . Se há algo em nosso mundo que deveria inspirar o entusiasmo, é a cruz do Calvário." (ibid., pp. 80, 81; 1895).

Assim, somos levados aos pés da cruz de Cristo. Aqui está a misteriosa divisão continental no adventismo, onde a fé e a descrença seguem rumos separados. De todos os seres humanos, o pastor evangélico ou administrador defronta a mais sutil tentação de assumir um amor disfarçado do eu. A menos que pesquise aquela maravilhosa cruz e lance o desprezo sobre todo o seu orgulho profissional e pessoal, resistirá inconscientemente ao ágape ali revelado. Em O Peregrino John Bunyan viu que perto do próprio portão do céu há uma vereda que conduz ao inferno.

Ellen White não considerava as exposições de Jones e Waggoner nem extremas, nem radicais, mas tentava argumentar com os irmãos que julgavam que assim fossem. Declarações amplamente publicadas tais como a seguinte faz perdurar um mito:

"A Sra. White [não] endossava as idéias propostas pelo Pastor Waggoner com respeito a Gálatas. . . Ela até parecia ter um sentimento de que os dois homens que eram tão destacados naquela época poderiam posteriormente ser levados a desviar-se dadas as posições extremadas de certos pontos." (Christian, op. cit., p. 232).

Suas asserções não eram dirigidas contra quaisquer "pontos de vista extremos" que Waggoner tivesse. Em lugar de acusá-lo de ser radical ou extremista, ela indica que alguns de seus pontos de vista eram imaturos -- não havia "perfeição". No plano de Deus, essa imaturidade devia ser superada por cuidadoso "cavar nas minas de Deus em busca do precioso tesouro". A luz que brilhou em 1888 era somente o "começo" da luz que devia iluminar a terra com gloria3. Tal luz gloriosa começou a brilhar mediante canais imperfeito s, mas divinamente escolhidos.

 

Uma Gloriosa Caça ao Tesouro Desprezada

Não era plano de Deus que um ou dois jovens realizassem toda a escavação. Outras mentes mais amadurecidas deveriam prosseguir com isso, desejando receber "todo raio da luz que Deus enviar . . . embora pudesse vir mediante o mais humilde de Seus servos" (Ms. 15, 1888). Dentro de seu tempo de vida o evangelho eterno deve ser desdobrado num todo maduro e completo, pronto para iluminar a terra com a glória da verdade.

Se esse fosse o propósito de Deus, seria necessário que as posições tanto de Waggoner quanto de Jones não fossem perfeitas ou maduras nesse estágio inicial de desenvolvimento. Eles deveriam meramente desafiar os seus irmãos à maior caça ao tesouro de todos os tempos. As próprias imperfeições e imaturidade de suas opiniões iria atrair a voluntária cooperação de seus irmãos. Tivessem os dois jovens cavalheiros visto toda a luz em sua perfeição, onde se situaria o gozo de seus irmãos no puro deleite da descoberta? Deus, em Sua infinita misericórdia, haveria de compartilhá-la entre eles.

Foi este gracioso privilégio que os irmãos desprezaram, atribuindo aos mineiros pioneiros dos ocultos filões da verdade o título de "fanáticos" e "extremistas". Sugerir que os mensageiros mesmo em Mineápolis fossem instáveis, em perigo de serem "desviados" com seus "pontos de vista extremos", lança uma injustificada aspersão sobre a própria Ellen White. Não estaria ela sendo ingênua se endossasse os jovens mensageiros tão indig­nos de confiança?4

Ela quase temerariamente arriscou sua reputação em entusiástico e persistente apoio da mensagem deles. Poderia o Senhor escolher mensageiros tão instáveis? Atribuir-lhes-ia uma mensagem tão potencialmente auto-destrutiva? É perigoso submeter-se para ser um mensageiro do Senhor? Certamente a misericórdia de Deus é maior do que a atribuição a Seus servos de mensagens auto-destrutivas!

Devemos observar brevemente como em várias assembléias da Associação Geral oradores reconheceram abertamente que o espírito anti-1888 incluía virtual desafio ao ministério de Ellen White:

"O que os irmãos naquela temerosa posição em que se postaram, rejeitaram em Mineápolis? Rejeitaram a chuva serôdia--o alto clamor da mensagem do terceiro anjo.

"Irmãos, não é isso demasiado mau? Logicamente os irmãos não sabiam que estavam fazendo isso, mas o Espírito do Senhor ali estava para dizer-lhes que o faziam, não estava? Mas quando rejeitaram o alto clamor, "o ensino de justificação", e então o Espírito do Senhor, por seu profeta, postou-se ali e nos disse o que eles esta­vam fazendo,--o que então? Oh, então eles simplesmente puseram esse profeta de lado com todo o resto." (A. T. Jones, GCB 1893, p. 183; ênfase acrescentada).

Ninguém na Assembléia o desafiou, pois todos sabiam que o que ele dizia era a verdade. No Concílio Anual de 1986 no Rio de Janeiro, Robert W. Olson, do Patrimônio Ellen White, também declarou que na sessão de 1888 Ellen White foi "publicamente desafiada" (Adventist Review, 30 de outubro de 1986). Em 1889 ela declarou:

"O Pastor Butler apresentou-me a questão numa carta declarando que minha atitude na Assembléia [de 1888] quase chegou a partir o coração de alguns dos nossos irmãos do ministério naquela reunião. . . 

"Sendo que alguns de meus irmãos me têm na conta de que eu não tenho um julgamento de maior valor do que o de qualquer outro, ou como alguém que não foi chamado para essa obra especial, e que estou sujeita à influência de meu filho Willie, ou de alguns outros, por que pede à irmã White para participar de vossas campais ou reuniões especiais?

"Eu não posso ir. Não poderia fazer-lhes bem nenhum, e isso seria somente estar tratando com leviandade as sagradas responsabilidades de que o Senhor me incumbiu. . . .

"Ter essas palavras distorcidas, mal aplicadas pelos descrentes, é de se esperar, o que não me surpreenderá; mas ter os meus irmãos que estão familiarizados com a minha missão e meu trabalho, tratar levianamente a mensagem que Deus me dá para transmitir, ofende o Seu Espírito e é para mim desencorajador. . .

"Meu caminho é bloqueado pelos meus irmãos." (Carta U-3, 1889).

Logicamente, nem todos os irmãos opunham-se-lhe desse modo. Mas o apoio aberto a ela era bem pouco visível. A humilde mensageira do Senhor reconheceu em Mineápolis o que estava acontecendo. As bênçãos mais abundantes da chuva serôdia fizeram com que ex-amigos mudassem de atitude de positivo para negativo:

"Deus não me ergueu para atravessar a planície a fim de falar-vos enquanto vos assentais aí para questionar a Sua mensagem, e indagar se a irmã White é a mesma que costumava ser outrora. . . Depois reconheceis que a irmã White estava certa. Mas de algum modo isso mudou agora, e a irmã White é diferente. Tal como a nação judaica." (Ms. 9, 1888; Olson, p. 292).

 

(4) O Exílio de Ellen White na Austrália

Tão determinada estava a oposição pós-1888 a Ellen White que a Associação Geral virtualmente a exilou na Austrália. Conquanto seja verdade que o Senhor reverteu sua estada lá para o bem de Sua causa naquele continente, nunca foi Sua vontade que ela fosse naquela época. Ela declara que o Senhor desejava que o inspirado trio ficasse junto na América e combatesse a batalha até a vitória. Seus próprios escritos indicam que os irmãos dirigentes desejavam que tanto Ellen White como Waggoner ficassem fora do caminho.

É bem sabido que a Sra. White foi somente porque a Associação Geral designou que fosse (um exemplo elogiável de cooperação com a liderança da Igreja!). Em 1896 ela escreveu com muita franqueza ao presidente da Associação Geral:

"O Senhor não estava dirigindo nossa saída da América. Ele não revelou que era Sua vontade que eu deixasse Battle Creek. O Senhor não planejou isso, mas permitiu que agissem segundo vossa própria imaginação. O Senhor desejava que W. C. White, sua mãe e seus obreiros permanecessem na América. Nós éramos necessários no centro da Obra, e tivesse vossa percepção espiritual discernido a verdadeira situação, nunca teríeis consentido com as medidas tomadas. Mas o Senhor lê os corações de todos. Havia tanta disposição para que partíssemos que o Senhor permitiu que esse evento tivesse lugar. Aqueles que estavam cansados com os testemunhos dados foram deixados sem as pessoas que os transmitiam. Nossa separação de Battle Creek foi para deixar os homens cumprirem sua própria vontade e maneira, que julgavam superior à maneira do Senhor.

"O resultado está perante vós. Tivessem permanecido do lado certo, tal decisão não teria sido tomada neste tempo. O Senhor teria trabalhado pela Austrália por outros meios, e uma forte influência teria sido mantida em Battle Creek, o grande coração da Obra.

"Lá teríamos permanecido ombro a ombro, criando uma atmosfera saudável a ser sentida em todas as nossas associações. Não foi o Senhor quem planejou essa questão. Não pude obter um raio de luz quanto a deixar a América. Mas quando o Senhor apresentou-me essa questão tal como realmente era, não abri os lábios para ninguém porque eu sabia que ninguém discerniria a questão em todas as suas implicações. Quando partimos, alívio foi sentido por muitos, mas não tanto por ti mesmo, e o Senhor não Se agradou disso, pois Ele havia nos colocado junto às rodas do maquinismo de Battle Creek.

"Esta é a razão de te estar escrevendo. O Pastor Olsen não teve a percepção, a coragem, a força, para levar as responsabilidades; nem houve qualquer outro homem preparado para cumprir a obra que o Senhor Se tinha proposto que deveríamos fazer. Eu te escrevo, Pastor Olsen, dizendo-te que era desejo de Deus que permanecêssemos lado a lado, para que eu te aconselhasse, te instruísse, e para que agíssemos em conformidade. . . Não estavas discernindo; não estiveste disposto a ter a forte experiência e conhecimento que não deriva de fonte humana removida de ti, e assim revelaste que os caminhos do Senhor foram mal calculados e passados por alto. . . Este conselho não foi considerado uma necessidade.

"Que o pessoal de Battle Creek sentisse que poderia deixar-nos partir na época em que o fizemos foi o resultado de planejamento humano, e não do Senhor. . . O Senhor determinou que devêssemos estar próximos das casas publicadoras, que devêssemos ter fácil acesso a essas instituições para que pudéssemos juntos nos aconselhar. . . Oh, quão terrível é tratar o Senhor com dissimulação e negligência, zombar de Seu conselho com orgulho devido à sabedoria do homem parecer tão superior." (Carta a O. A. Olsen, 127, 1896).

Aqueles que dizem que a mensagem de 1888 foi aceita pela liderança da Igreja podem interpretar os anos de Ellen White na Austrália como cooperação com o Espírito Santo. É verdade que lhe era possível escrever boas cartas para a terra natal. Mas privar a América do Norte de seu ministério pessoal nessa ocasião crítica confirmou "em grande medida" a final derrota do começo da mensagem do alto clamor.

E. J. Waggoner sofreu um exílio semelhante ao ser enviado à Inglaterra na primavera de 1892. Há evidência também de que não foi puro zelo missionário que o enviou. Àquelas alturas Ellen White já se tinha ido; o segundo membro do trio especial devia também partir. Notamos o seguinte, na tese doutoral de Gilbert M. Valentine sobre W. W. Prescott:

"Segundo W. C. White, a Sra. White, que aparentemente ainda tinha lembrança das injustiças do período pós-1888, declarou que lhe havia sido mostrado "que conquanto alguns de nosso pessoal alegravam-se em tê-lo [E. J. Waggoner] removido da obra em Battle Creek por sua designação para trabalhar na Inglaterra", ele devia ser colocado de volta 'para dar assistência como um professor no coração de nossa Obra'. (W. C. White a A. G. Daniells, 30 de maio de 1902." William Warren Prescott: Seventh-day Adventist Educator [William Warren Pres­cott: Educador Adventista], Vol. 1, p. 289).

Um ano antes de Ellen White ir para a Austrália, ela derramou o seu coração numa carta a J. S. Washburn, um jovem ministro. Aqui, à semelhança de Jeremias, ela escreve quase em desespero. Descreve vividamente o clima prevalecente na sede de Battle Creek:

"Assisto a reuniões nas pequenas igrejas mas sinto que não tenho forças para trabalhar com a Igreja que tem tido o meu testemunho tão abundantemente, e contudo aqueles que se puseram contra a minha mensagem, e não se inclinam a mudarem sua posição de resistência, não obstante tudo quanto o Senhor me tem dado a dizer em demonstração do Espírito e poder, não tenho esperança de que pudessem ser ajudados por nada que eu pudesse dizer adicionalmente. Eles têm resistido aos apelos do Espírito de Deus. Não tenho esperança de que o Senhor tenha um poder em reserva para quebrar a resistência deles. Deixo-os nas mãos de Deus, e a menos que o Senhor ponha sobre mim um decidido encargo de falar palavras no Tabernáculo [de Battle Creek] não tentarei dizer nada até que aqueles que têm participado no bloqueio de meu caminho o deixem livre. . . Não tenho forças para contender com o espírito, e resistência, dúvidas e descrença que têm invadido suas almas, de modo a que não vejam quando vem o bem. Tenho muito maior liberdade em falar a descrentes. Eles estão interessados. . .

"Oh, é o lugar mais difícil no mundo, falar onde grande luz tem vindo aos homens em posições de responsabilidade. Eles têm sido iluminados, mas escolheram as trevas, antes que a luz. . .

"Podes crer que tenho grande angústia de alma. . . Qual será o fim dessa teimosa descrença ainda teremos que ver." (Carta W32, 1890).

Os Anos da Década de 1890 Teriam Uma Mensagem Para a Década de 1990?

O ministério de Ellen White à Igreja Adventista do Sétimo Dia freqüentemente exibe essa qualidade que se iguala a Jeremias. A mensagem do antigo profeta é verdade presente. O episódio de 1888 é uma parábola, e Deus nos testará uma vez mais.

Devido ao fato de que nossa história de 1888 tem sido tão vastamente deturpada, nossa atitude contemporânea é ainda preconceituosa contra a obra de Jones e Waggoner. Ainda parecemos suspeitar de que a mensagem deles poderia conduzir ao fanatismo. Ainda presumimos falsamente que ela conduziu os dois mensageiros ao desvio da apostasia. Na medida em que assim pensamos, caso o Senhor envie mais pérolas de verdade a serem lançadas perante nós, seríamos obrigados a reagir a tal mensagem como fez a oposição da era 1888.

Hoje não herdamos nenhuma culpa genética de nossos antepassados que rejeitaram a maior oportunidade de todos os tempos, o começo da chuva serôdia e do alto clamor; mas somos seus descendentes espirituais. As Escrituras Sagradas não ensinam nenhuma transmissão genética de pecado, seja "original" ou de outra espécie, de geração a geração. Mas há uma transmissão de pecado que não é genética. "Por um homem, entrou o pecado no mundo". "O pecado abundou" e "reinou para a morte". "Todo o mundo [tornou-se] culpado diante de Deus" (Romanos 5:12, 20, 21; 3:19). Essa misteriosa transmissão de pecado nos é esclarecida na seguinte declaração:

"Em sua própria fonte, a natureza humana foi corrompida. E desde então o pecado tem continuado a sua obra odiosa, atingindo mente após mente. Todo pecado cometido desperta os ecos do pecado original. . .

"A mútua dependência é uma coisa maravilhosa. A influência recíproca deveria ser cuidadosamente es­tudada. . .

"Cada geração assume alguma fase do mal em antecipação àquele que a precedeu, seguindo adiante na marcha da impenitência e rebelião. Deus está observando, medindo o templo e os adoradores em seu interior. . .

"Nenhum homem vive para si mesmo. Consciente ou inconscientemente ele está influenciando outros, seja para o bem ou para o mal. . . Não seria tempo de que um povo se levante em independência moral, abrigando ao mesmo tempo um senso de sua dependência de Deus? . . .

"O Senhor enviou ao nosso mundo uma mensagem de advertência, que é a Terceira Mensagem angélica. Todo o céu está aguardando para nos ouvir vindicar a lei de Deus." (RH, 16 de abril de 1901).

Temos mais luz do que nossos antepassados, daí temos maiores responsabilidades. A alienação do coração de Cristo que causou a rejeição da mensagem de 1888 é hoje bem mais sutil, mais sofisticada, mais profundamente sepultada além de nossa consciência. Mas não é menos real. Somente a iluminação do Espírito Santo a tornará manifesta. Deve chegar o tempo, pelo menos para cada um de nós, quando "a cruz será apresentada, e sua real importância será vista por toda mente que tem sido cegada pela transgressão. Diante da visão do Calvário com sua misteriosa Vítima, os pecadores se apresentarão condenados" (DA 58). Não seria uma bênção se pudéssemos ver a cruz hoje antes que seja demasiado tarde?

O Espírito Santo capacita o crente sincero a ver-se refletido nos personagens bíblicos de tempos atrás. Ele pode igualmente nos capacitar a ver-nos em nossos antepassados de um século atrás. Inatamente não somos melhores do que eles. O Espírito Santo pode curar-nos da cegueira que permite vermos o mal se estiver suficientemente distante no passado, enquanto deixamos de reconhecê-Lo sob o nosso próprio nariz. A Palavra de Deus tem sido verdadeira desde o próprio começo:

"Sem a iluminação do Espírito de Deus, não seremos capazes de discernir a verdade do erro, e cairemos sob as tremendas tentações e enganos que Satanás trará sobre o mundo.

"Estamos próximos do encerramento da controvérsia entre o Príncipe da luz e o príncipe das trevas, e em breve os enganos do inimigo provarão que tipo de fé que é a nossa." (RH, 29 de novembro de 1892).

Conclusão

Reconhecer a verdade de que nossos antepassados insultaram o verdadeiro Cristo e o verdadeiro Espírito Santo não é em si más notícias. E revelar a realidade da resistência profundamente arraigada ao "testemunho de Jesus" é uma bênção. De nenhuma outra maneira além de defrontar a verdade podemos nos preparar para futuras provas. A verdade é positiva, ativa, animadora.

As boas novas são que o céu tem por todo o tempo estado mais disposto a conceder o derramamento final do Espírito de Deus do que temos pensado. É tão-só nossa contínua resistência, freqüentemente inconsciente, que tem impedido o Dom agora por mais de um século, a despeito de nossas orações por Ele.

Defrontar a verdade honestamente tem sido uma fonte de gozo. A estabilidade e progresso da Igreja organizada pode somente ser abençoada por isso.

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1. Nunca Ellen White diz que "alguns" que se opunham eram "poucos", nem diz ela que aqueles que aceitaram eram "muitos". Sem exceção conhecida, os que rejeitaram a mensagem eram "muitos" e os que a aceitaram foram "poucos".

2. Ver, por exemplo, 1 Samuel 8:7; 12:6-12; Isaías 50:1; 54:5-17; 61:10; 63:9-14; Jeremias 31:1-9; Ezequiel 16; Oséias, passim.

3. Incidentalmente, conquanto Ellen White não tomasse nenhuma firme posição sobre a "lei em Gálatas" em 1888, por 1896 ela estava pronta para tomar uma posição. Waggoner estivera certo o tempo todo! "A lei em Gálatas [é] . . . especialmente . . . a lei moral" (1 SM 234, 235).

4. Ver Apêndice para uma discussão da acusação de que Jones estaria ensinando o erro da "carne santa" e perfeccionismo pouco depois da assembléia de 1888.