Contradições da Lição da Escola Sabatina Revelam Incompreensão da Mensagem de 1888

Até quando iremos nos contradizer ao explicar as duas Alianças?

O Comentário da Lição da Escola Sabatina nº7 deste 3º trimestre de 2003 começou com declarações maravilhosas que, de certa forma, até me surpreenderam pela clareza com que foram direto ao ponto central da Mensagem de 1888.

Vejam por vocês mesmos:

“Deus fez uma aliança com Abraão e seus descendentes, não no sentido de que Deus chegou a um acordo ou compromisso com a humanidade caída. Ao contrário, envolve a declaração da promessa incondicional de Deus de fazer de Abraão e sua descendência os destinatários de certas bênçãos”.

“Esta é uma ordem ou acordo divino, estabelecida sem qualquer cooperação humana e origina-se da iniciativa do próprio Deus, cuja vontade e determinação respondem tanto por sua origem como por seu caráter”.

“Não é fácil encontrar uma palavra que dê todo o significado do berith divino. Por que a Septuaginta escolheu e utilizou a palavra grega diatheke como correspondente de berith? É porque a palavra grega diatheke tinha o significado de vontade ou testamento. Não havia palavra melhor para expressar a idéia do Antigo Testamento de uma disposição solene e irrevogável feita pelo próprio Deus, por Sua própria escolha bondosa e destinada a assegurar uma herança religiosa para Seu povo escolhido”.

“Nesta relação de aliança, a pessoa que faz o testamento (o testador) não pergunta ao beneficiário do testamento se o aceita ou não. É uma demonstração unilateral da vontade do testador. Deus é quem dá início à aliança e também quem a conclui”.

“Deus expressou Sua vontade para com a humanidade tornando conhecida Sua disposição e Seus planos de redenção aos seres humanos. Ele ofereceu Jesus Cristo como garantia. Desde o início, na primeira declaração do evangelho (Gên.3:15), Deus prometeu Jesus Cristo como garantia da eficácia do que prometeu”.

Até pareceu que estávamos lendo os ensinamentos de Waggoner ou Jones transmitidos durante a Assembléia Geral de 1888 em Minneapolis, e que tão enfaticamente foram apoiados e defendidos por Ellen White.

A própria lição em sua introdução (edição do professor, pág.75) foi muito feliz ao afirmar:

“Nos tempos modernos definimos uma infinidade de relações por contratos. Geralmente são negociados bens ou serviços nos quais os dois lados ganham. Gilberto assina um contrato com o encanador para consertar a torneira; o encanador recebe seu pagamento e Gilberto tem uma torneira consertada. Mas a nova aliança não é bem assim. Nessa aliança, Deus não precisa de nós; nós precisamos dEle. Ele nos estende graça, misericórdia, perdão dos pecados; nós não oferecemos nada de volta porque não temos nada para oferecer que mereça a graça, a misericórdia e o perdão que obtemos dEle. Tudo o que podemos fazer é aceitar pela fé, uma fé que é motivada por um amor que leva à obediência sincera”.

Por tudo isto que foi dito, é lamentável quando, ao chegarmos na parte de segunda-feira, nos deparamos com a confusa e contraditória explicação dada quanto à diferença entre os dois concertos (ou alianças):

“Embora haja uma grande diferença entre a antiga e nova aliança... Nos dois casos existem promessas e deveres. A principal e fundamental diferença entre a antiga e a nova aliança é que agora existe perdão total e certeza. Aquilo para o que a antiga aliança apontava em tipos, sombras e símbolos, se cumpriu, em realidade, em Jesus... E, finalmente, se na antiga aliança o povo encontrava esperança no sangue de uma ovelha, um cordeiro ou um touro, quanto mais esperança temos no sangue de Jesus Cristo?”

“Nos dois casos existem promessas e deveres”? Como assim? Estaria esta frase sugerindo que Deus promete cumprir a Sua parte na Aliança se cumprirmos a nossa parte? A Aliança é uma troca de favores? É um toma lá da cá?

Mais uma vez a Lição teve a chance de explicar claramente a diferença entre a velha e a nova aliança, e não o fez. A diferença não é uma questão de tempo (dispensação: antes da cruz-depois da cruz); a diferença é uma questão de condição do coração. Abraão, que viveu antes da cruz, quando “creu em Deus” (creu nas promessas feitas por Deus e descansou na confiança de que Deus é fiel e poderoso para cumprir tudo aquilo que promete) estava vivendo debaixo da Nova Aliança ou Aliança Eterna (a mesma Aliança firmada com Adão em Gên.3:15 e repetida a Noé, Moisés e ao povo de Deus).

Agora, quando Abraão tentou ajudar Deus a cumprir aquilo que Ele havia prometido (Agar), passou a viver debaixo da Velha Aliança, que se resume na tentativa humana de ajudar Deus a cumprir aquilo que Ele prometeu. Foi desta forma que o povo de Israel “invalidou” a Aliança com base na Graça mediante a Fé que o Senhor tentou estabelecer com eles lá no Sinai:

O Senhor havia dito: “Vistes o que fiz aos egípcios” (Êxo.19:4). Em outras palavras: “Vocês viram como eu vos libertei da Escravidão. Foi pela Minha iniciativa e pelo Meu poder que vocês foram libertados. Vocês não tiveram que lutar contra os Egípcios (não tiveram que conquistar a sua libertação), mas tiveram apenas que crer e esperar confiantemente na salvação que Eu estava realizando”. E o Senhor continuou: “Se diligentemente ouvirdes a Minha voz e guardardes a Minha aliança” (Êxo.19:5). As duas palavras: “ouvir” do hebraico “shamah”, e “guardar” do hebraico “shamar” possuem o sentido de ouvir, considerar, dar atenção, acatar, manter, cuidar, cultivar (Gên.2:15), vigiar, observar, apreciar. Não é o termo habitual que se usa para “obedecer” no sentido de “fazer”.

O Senhor estava pedindo para que eles considerassem atentamente a Aliança que “Ele” estabeleceu para os libertar da escravidão, colocando-se como o Deus deles, e fazendo deles o Seu povo. A Aliança é a promessa de salvação feita por Deus. O povo deveria cuidar por mantê-la sempre na memória; vigiar para não esquecê-la, apreciar Sua iniciativa. “Obedecer” no sentido de “fazer” não cabe aqui porque até então o Senhor não tinha pedido nada para eles, mas apenas lembrado de Sua Aliança (Promessa e Cumprimento) a favor deles (Êxodo19:4).

Mas o povo não entendeu o princípio de graça envolvido na Aliança do Senhor e falou: “Tudo o que o Senhor falou, faremos” (Êxo.19:8). Promessas e esforço humano tentando realizar aquilo que somente Deus poderia realizar. Aqui esta o princípio por trás da Velha Aliança: o “esforço humano”; o “eu”. É por isso que o Senhor, após ouvir a resposta do povo disse: “Quem dera que eles tivessem tal coração que me temessem, e em todo o tempo guardassem todos os meus mandamentos, para que bem lhes fosse a eles e aos seus filhos para sempre! Vai, dize-lhes: Tornai-vos às vossas tendas” (Deut.5:29-30). Interessante notarmos aqui a palavra “coração” que mais tarde foi repetida na Nova Aliança (Jer.31:33).

A questão não era se esforçar para cumprir “regras e preceitos” com medo do castigo ou com vistas na recompensa, e sim permitir que o Senhor transformasse o “coração” – Aliança Eterna ou Nova Aliança. Eles não entenderam, e o Senhor de uma forma desconsolada diz: “Vai, voltem” – “Voltem porque ainda vocês não entenderam a Minha Aliança”; “Voltem, porque vocês vão precisar de mais tempo para entender aquilo que estou tentando explicar desde Gên.3:15”.

Para uma melhor compreensão da diferença entre a Velha e a Nova Aliança estude Gálatas 4:21-31.

Voltando ao texto da lição que diz:

“A principal e fundamental diferença entre a antiga e a nova aliança é que agora existe perdão total e certeza” (Negrito acrescentado).

Isto é dispensacionalismo! (Deus tem uma maneira diferente de tratar com a humanidade em cada uma das dispensações ou períodos). Quer dizer que antes não existia “perdão total e certeza”? É este um privilégio somente para aqueles que vivem depois da cruz? Não podemos conceber tais pensamentos perante um Deus que afirma: “Eu, o Senhor, não mudo” (Mal.3:6). A Nova Aliança existe antes da fundação do mundo e foi proferida desde Gên.3:15. Ela é também chamada de Aliança Eterna. Ela é a única Aliança (Promessa) pela qual importa que sejamos salvos.

Contradição ainda mais relevante é a apresentada parte “Testemunhando” (edição do professor, pág.82) onde lemos:

A aliança era simplesmente um contrato entre Deus e o povo. Sob este contrato, o Senhor prometia ser seu Deus, perdoá-los e purificá-los de todos os pecados. E o povo adoraria ao Senhor e obedeceria à Sua lei. As condições desse contrato foram levadas a efeito por meio de um modelo, o santuário terrestre, com todos os seus símbolos e cerimônias” (Negrito acrescentado).

Confuso este texto, especialmente depois de ser afirmado no Comentário da Lição:

Deus fez uma aliança com Abraão e seus descendentes, não no sentido de que Deus chegou a um acordo ou compromisso com a humanidade caída. Ao contrário, envolve a declaração da promessa incondicional de Deus de fazer de Abraão e sua descendência os destinatários de certas bênçãos” (Negrito acrescentado).

E o pior de tudo é que com tamanha contradição saltando aos olhos, alguns afirmam que a nossa igreja nunca recusou a mensagem da Justificação pela Fé conforme foi apresentada em Minneapolis, ou que mais tarde houve plena aceitação. Se como igreja tivéssemos aceitado, tais contradições e incoerências não surgiriam. Pelo menos, não em publicações oficiais como é a Lição da Escola Sabatina.

E a Lição, na parte intitulada “Aplicações à vida diária”, continua apresentando mais pensamentos contraditórios:

“1. A história acima ilustra como uma parceria, contrato ou acordo não traz necessariamente benefícios e lucros iguais para ambos os lados; e nem sempre significa investimentos, esforços ou sacrifícios iguais! Mas os resultados dependem igualmente dos dois lados(Negrito acrescentado).

“Os resultados dependem igualmente dos dois lados”? Onde esta a unilateralidade descrita no Comentário da Lição?

“Esta é uma ordem ou acordo divino, estabelecida sem qualquer cooperação humana e origina-se da iniciativa do próprio Deus, cuja vontade e determinação respondem tanto por sua origem como por seu caráter” (Negrito acrescentado).

“Nesta relação de aliança, a pessoa que faz o testamento (o testador) não pergunta ao beneficiário do testamento se o aceita ou não. É uma demonstração unilateral da vontade do testador. Deus é quem dá início à aliança e também quem a conclui” (Negrito acrescentado).

Um pouco mais adiante em “Perguntas de aplicação” é feita a pergunta:

“Que mudanças ajudariam a igreja e você, pessoalmente, a viver uma vida digna da nova aliança?”

Será que existe alguma mudança tão significativa e drástica que poderá tornar-me “digno” da Nova Aliança? A Aliança é uma Aliança de Graça devido a nossa total indignidade e incapacidade de mudar as coisas por nós mesmos.

Quero concluir com duas sugestões de alterações nos textos contidos na parte de quinta-feira abaixo reproduzidos:

“Mediante a aliança, podemos estar certos de que Deus apoiará o Seu lado da promessa”.

“A segunda parte de Hebreus 10 adverte contra o pecado obstinado ou a persistência no pecado. Fazer isso é uma forma de desobediência e uma transgressão da nossa parte da aliança”.

Talvez ficasse mais de acordo com o Evangelho em sua pureza se fosse dito:

“Mediante a aliança, podemos estar certos de que Deus cumprirá a Sua promessa, desde que não a rejeitemos obstinadamente”.

“A segunda parte de Hebreus 10 adverte contra o pecado obstinado ou a persistência no pecado. Fazer isso é uma forma de resistir à ação salvadora de Deus oferecida em Sua aliança”.

Fico pensando: Como será que os moderadores em suas classes de Escola Sabatina irão conseguir explicar essas contradições e discrepâncias?

Sem nos voltarmos para aquilo que aconteceu em 1888 será muito difícil! -- Cleiton Heredia, SP.

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