3. O Alto Clamor que Virá de Modo Surpreendente
  

 

Por décadas, antes de 1888, a igreja e sua liderança antecipavam ansiosamente os "tempos de refrigério", quando a longamente esperada chuva serôdia viria. Essa era uma expectação acariciada entre nós um século atrás, assim como a longamente esperada vinda do Messias se dava entre os judeus ao tempo de João Batista.

Contudo, poucos pareciam reconhecer que a chuva serôdia e o alto clamor seriam primariamente uma compreensão mais clara do evangelho [ou seja, viriam com uma mensagem]. Esperava-se que o alto clamor fosse um barulho maior. Tomou-nos de surpresa o fato de ser iluminação maior.

Esperávamos um trovejante abalo da terra com uma mensagem de "Aprontai-vos, senão. . .!" Não estávamos preparados para a pequena e suave voz de uma revelação de graça como a verdadeira motivação da terceira mensagem angélica. O poder sobrenatural que esperávamos deve ser conseqüência de nossa aceitação daquela luz maior do evangelho. Essa deve iluminar a terra com glória.

Houve um terrível perigo de que os líderes judeus pudessem rejeitar seu Messias quando viesse "subitamente". E houve igual perigo de que os líderes responsáveis de nossa igreja desprezassem o alto clamor quando começasse. Já em 1882 Ellen White havia advertido de que poderiam algum dia ser incapazes de reconhecer o verdadeiro Espírito Santo:

"Muitos não podeis discernir a obra e presença de Deus... Há homens entre nós em postos de responsabilidade que sustentam que . . . uma fé tal como a de Paulo, Pedro, ou João, está . . . fora de moda, sendo impraticável em nossos dias. É considerada absurda, mística, e indigna de uma mente inteligente." (5T 74, 79).

Um falso otimismo prevalecia ("sei que muitos pensam bastante favoravelmente do tempo atual"), e "no poderoso peneiramento a ter lugar em breve", esses obreiros da liderança poderiam ser achados incompatíveis com a liderança de um tempo crítico.

"Aqueles que se têm fiado no intelecto, gênio ou talento, não poderão então permanecer à cabeça do rebanho. Eles não se adequaram à luz. Os que se têm provado infiéis não terão, então, a responsabilidade das ovelhas sob seus cuidados. Na última e solene obra, poucos grandes homens estarão engajados." (5T 80).

Ellen White havia antecipado o tempo em que o Senhor assumiria a liderança e suscitaria instrumentalidades humanas em que pudesse confiar:

"Quando tivermos homens tão dedicados como Elias, e possuindo a fé que ele possuía, veremos que Deus Se revelará a nós como o fez aos homens santos do passado. Quando tivermos homens que, conquanto reconhecendo suas deficiências, pleiteiem com Deus em fé ardorosa, como fez Jacó, veremos os mesmos resultados." (4T 402).

Especificamente, o presidente da Associação Geral em 1885 foi advertido de que a menos que ele e alguns outros

"...se despertassem para um senso de seu dever, não reconhecerão a obra de Deus quando o alto clamor do terceiro anjo for ouvido. Quando luz sair para iluminar a terra, em vez de virem em auxílio do Senhor, desejarão amarrar Sua obra a fim de ajustar-se a suas idéias limitadas. Permitam-me dizer-vos que o Senhor operará nesta última obra de um modo bastante fora do comum e de maneira que será contrária a qualquer planejamento humano. . . . Os obreiros se surpreenderão com os meios simples que Ele empregará para pôr em andamento e aperfeiçoar a Sua obra de justiça." (1º de outubro de 1885; TM 300).

Essa carta foi dirigida tanto a G. I. Butler quanto a S. N. Haskell. Haskell atendeu à advertência e foi um dos poucos que tiveram o discernimento de reconhecer a coisa misteriosa que estava acontecendo perante os seus olhos três anos depois. Mas não Butler e muitos outros. O Senhor seria forçado em 1888 a passar por alto ministros experientes a fim de empregar agentes mais jovens ou mais obscuros:

"O Senhor freqüentemente age onde menos esperamos; Ele nos surpreende por revelar o Seu poder mediante instrumentos de Sua própria escolha, enquanto passa por alto homens a quem temos considerado aqueles mediante os quais advirá a luz. . . .

"Muitos rejeitarão as próprias mensagens que Deus envia a Seu povo, se esses irmãos da liderança não as aceitarem. . . . Mesmo que todos os nossos homens de liderança recusarem a luz e a verdade, essa porta permanecerá aberta ainda. O Senhor suscitará homens que darão ao povo a mensagem para este tempo." (OE, antiga edição, 126).

Novamente, em 1882 foi-nos dito:

"Pode dar-se que sob um exterior rude e pouco atrativo é que o brilho puro de um caráter cristão genuíno se revelará. . . .

"Elias tomou a Eliseu do arado, e lançou sobre ele o manto de consagração. O chamado para essa grande e solene obra foi apresentado aos homens de saber e posição; houvessem esses homens sido pequenos a seus próprios olhos, e confiado inteiramente no Senhor, Ele os teria honrado com o porte de Seu estandarte em triunfo para a vitória. . . .

"Deus empreenderá uma obra em nossos dias que somente poucos podem antecipar. Ele suscitará e exaltará entre nós aqueles que são ensinados antes pela unção de Seu Espírito, do que pela instrução externa de instituições científicas." (5T 81, 82).

Aqueles testemunhos de 1882 revelam uma inspirada previsão. Era como se a pequena senhora escrevesse a história de 1888 antecipadamente!

A Divina Escolha de Mensageiros

Naquele mesmo ano, 1882, E. J. Waggoner iniciou um curso de treinamento que estava evidentemente sob a guia especial do Espírito Santo. Ele estava sendo preparado para ser o agente de uma obra especial. Mais tarde descreveu sua experiência:

"Iniciei realmente meu estudo da Bíblia trinta anos atrás [1882]. Naquele tempo Cristo foi apresentado diante de meus olhos "evidentemente crucificado" para mim. Eu estava assentado um pouco à parte do corpo da congregação numa grande tenda durante uma reunião campal em Healdsburg [Califórnia], em um sombrio sábado à tarde. Não tenho idéia de qual era o tema do discurso. Não tinha conhecimento de nenhuma palavra nem texto. Tudo quanto permanece comigo foi o que eu vi. Subitamente uma luz brilhou ao meu redor, e a tenda estava-me muito mais brilhantemente iluminada do que se o sol do meio-dia estivesse a brilhar, e vi a Cristo dependurado na cruz, crucificado por mim. Naquele momento tive meu primeiro conhecimento positivo, que me veio como um dilúvio avassalador, de que Deus me amava, e que Cristo morrera por mim. Deus e eu éramos os únicos seres de que tinha consciência no universo. Sabia, então, por ver de modo real, que Deus estava em Cristo reconciliando consigo o mundo; eu era o mundo inteiro com todos os seus pecados. Estou certo de que a experiência de Paulo no caminho de Damasco não foi mais real do que a minha. . . .

"Resolvi imediatamente que estudaria a Bíblia à luz daquela revelação, a fim de que pudesse ajudar outros a verem a mesma verdade. Sempre cri que toda parte da Bíblia precisa estabelecer, com maior ou menor nitidez, essa gloriosa revelação [Cristo crucificado]." (Carta, 16 de maio de 1916, escrita pouco antes de sua súbita morte).

Naqueles mesmos anos anteriores a 1888 o Senhor estava preparando o seu colega. A mensagem da verdade encontrou A. T. Jones como um soldado do Exército dos Estados Unidos. Conquanto não fosse produto de escolas, ele estudava noite e dia, reunindo um grande cabedal de conhecimento bíblico e histórico. J. S. Washburn, que o conheceu pessoalmente, nos disse que ele era uma pessoa humilde, zelosa e de profundos sentimentos, cujas orações eficazes davam testemunho de que conhecia ao Senhor (entrevista de 4 de junho de 1950).

O agudo intelecto do jovem Jones equilibrava-se com uma fé cálida, simples e infantil. Nos tempos em que foi usado por Deus, ele era poderoso na pregação e no ministério pessoal. Nos anos imediatamente seguintes a 1888, houve significativas demonstrações do Espírito de Deus operando por seu intermédio, inclusive um ministério especial em Washington no Senado dos Estados Unidos para derrotar a lei dominical de Blair. De fato, esse quase um século de liberdade religiosa que os americanos desfrutam é um legado dos esforços eficazes de Jones e Waggoner, não reconhecidos e não honrados, ao oporem-se eles à intolerância religiosa em seus dias.

O Espírito de Deus estava verdadeiramente preparando esses dois jovens para serem os arautos à igreja remanescente e ao próprio mundo do "começo" do longamente esperado alto clamor:

"O Senhor em Sua grande misericórdia enviou uma mensagem muito preciosa a Seu povo mediante os Pastores Jones e Waggoner. Essa mensagem devia trazer mais destacadamente perante o mundo o Salvador elevado, o sacrifício pelos pecados do mundo inteiro... Deus deu a Seus mensageiros exatamente aquilo de que carecia o povo." (1895; TM 91, 95).

Por oito anos após 1888, Ellen White freqüentemente referia-se a esses dois jovens cavalheiros como "os mensageiros do Senhor", endossando-os em palavras nunca proferidas quanto a mais ninguém. Há entre 200 e 300 declarações entusiásticas da parte dela. Em 1890 declarou:

"Suponde que elimineis o testemunho que tem sido apresentado durante esses últimos dois anos, proclamando a justiça de Cristo, a quem poderíeis apontar como trazendo luz especial para o povo?" (RH, 18 de março de 1890).

Em 1888 ela tinha dito:

"Deus está apresentando às mentes de homens divinamente designados gemas preciosas de verdade, apropriada para o nosso tempo." (MS. 8a, 1888, A. V. Olson, Through Crisis to Victory, p. 279; doravante Ol­son).

"A mensagem que nos é dada por A. T. Jones e E. J. Waggoner é a mensagem de Deus à igreja laodiceana." (Carta S24, 1892).

Quando ela primeiro ouviu a mensagem de Waggoner, imediatamente percebeu o seu verdadeiro significado. Era uma revelação especial para a igreja e para o mundo:

"Tem-me sido dirigida a indagação sobre o que eu penso dessa luz que esses homens estão apresentando. Ora, tenho-a apresentado a vós pelos últimos quarenta e cinco anos -- as incomparáveis belezas de Cristo. É isto que tenho estado tentando apresentar perante vossas mentes. Quando o irmão Waggoner apresentou essas idéias em Mineápolis, foi o primeiro ensino claro sobre esse assunto de quaisquer lábios humanos que ouvi, exceto as conversas entre mim e meu esposo. Disse a mim mesma que é porque Deus tem-na apresentado a mim em visão que eu a vejo tão distintamente, e eles não podem vê-la porque não a tiveram apresentada a eles como a mim tem sido, e quando outro a apresentou, toda fibra de meu coração disse amém." (Ms. 5, 1889).

Em nossa moderna terminologia, ela percebeu que a mensagem era uma transmissão que aplicaria poder do motor para as rodas. Por "quarenta e cinco anos" ela tinha estado girando o motor, mas o poder para completar a comissão evangélica não estava passando adiante. Agora percebia como a nova mensagem suplementando a velha realmente prepararia o povo daquela geração para a vinda do Senhor. Não admira que estivesse tão feliz!

Como o Alto Clamor Não Foi Reconhecido

Já em abril de 1890, Ellen White, tendo maior entendimento, aplicou a linguagem de Apocalipse 18 para a mensagem de 1888:

"Vários têm-me escrito perguntando se a mensagem [de 1888] de justificação pela fé é a terceira mensagem angélica, e tenho respondido: 'É a terceira mensagem angélica em verdade'. O profeta declara: 'Depois destas coisas vi descer do céu outro anjo que tinha grande autoridade, e a terra se iluminou com a sua glória' [Apoc. 18:1]." (RH, 1º de abril de 1890).

Em 1892, ela estava pronta para declarar inequivocamente que a mensagem era realmente o início do longamente aguardado alto clamor:

"O alto clamor do terceiro anjo já se iniciou na revelação da justiça de Cristo, o Redentor que perdoa o pecado. Este é o começo da luz do anjo cuja glória encherá a terra toda." (RH, 22 de novembro de 1892).

Observem que o "início" da obra desse anjo foi a mensagem, não sua presumível aceitação pela liderança ou o povo. Veremos mais tarde como essa realidade engloba um poderoso significado num tempo de crise.

O Pastor Butler, o oficial mais responsável da igreja, destacou-se em sua oposição à preciosa luz do alto clamor. Poucos outros eram espiritualmente capazes de transcender sua influência negativa. Em sua cega oposição ao alto clamor podemos ver o trágico cumprimento da advertência inspirada que lhe foi enviada em 1º de outubro de 1885 (cf. TM 300):

"Há alguns que têm um desejo de tomar uma decisão de imediato sobre qual é a posição correta no ponto sob discussão. Como seria do gosto do Pastor Butler, é recomendável que esta questão deva ser resolvida imediatamente. Mas estão as mentes preparadas para tal decisão? Eu não poderia sancionar tal curso... Eles não estão preparados para tomar decisões seguras. . .

"Não vejo razão para os sentimentos agitados que se criaram nesta reunião [Mineápolis, 1888]. . . . As mensagens procedentes de seu presidente em Battle Creek são calculadas para agitar-vos a tomar uma decidida posição; mas eu vos advirto contra o fazê-lo. . . . Sentimentos excitados conduzirão a más decisões." (Ms 15, 1888; Olson, p. 295).

"Nunca me esquecerei da experiência que tivemos em Mineápolis, ou das coisas que foram-me então reveladas com respeito ao espírito que controlava homens, as palavras proferidas, as ações praticadas em obediência aos poderes do maligno... Eles eram movidos na reunião por outro espírito, e ignoravam que Deus havia enviado esses jovens homens... para apresentarem-lhes uma mensagem especial que trataram com ridicularia e desprezo, deixando de reconhecer que inteligências celestiais estavam velando por elas... Eu sei que naquele tempo o Espírito de Deus foi insultado." (Ct. 24, 1892).

Assim a liderança desta igreja, ansiosamente esperando ser vindicada perante o mundo no longamente esperado alto clamor, na verdade desdenhou o Espírito de graça e desprezou as riquezas de Sua bondade.

Tornemos claro que esse pecado de insultar o Espírito Santo não prendeu o corpo da igreja coletivamente no pecado imperdoável. O pecado dos antigos judeus contra o Espírito Santo consistiu em atribuir a Sua obra a Satanás (Marcos 3:22-30). Não queremos dizer que os nossos irmãos em geral da era de 1888 foram a esse ponto, conquanto alguns indivíduos possam tê-lo feito. (Insultá-Lo já foi suficientemente mau!). Ellen White continuou a ministrar a esta igreja até sua morte em 1915, assim indicando sua crença de que o perdão é possível, e de que a solução ao nosso problema não é a desintegração ou abandono denominacional, mas o arrependimento denominacional e a reconciliação com o Espírito Santo. 

 

As Chamadas "Falhas" dos Mensageiros Não Desculpam a Rejeição da Mensagem Deles

 

A rejeição da luz por aqueles que têm responsabilidade diante de Deus é inescusável. Não é nossa função neste tempo final encontrar falhas; apenas podemos anotar os fatos. Os irmãos que se opuseram à luz pensavam sinceramente que estavam fazendo o certo porque os agentes a quem o Senhor empregou pareciam falhos. O Senhor operou num modo fora do ordinário e surpreendeu os irmãos. Ellen White descreveu o que estava ocorrendo, empregando o tempo futuro para referir-se a eventos presentes.

"Na manifestação do poder que ilumina a terra com sua glória, eles verão somente algo que em sua cegueira julgam ser perigoso, algo que despertará seus temores e se postarão na oposição. Em vista de que o Senhor não age segundo suas expectações e idéias, eles se oporão à obra." (RH Extra, 23 de dezembro de 1890).

Anteriormente, ela havia assinalado a dificuldade que os irmãos estavam tendo em suas próprias almas. Podemos simpatizar com eles, pois a prova era bastante severa:

"Agora desejo que sejais todos cautelosos com respeito a que posição tomais, se vos envolverdes nas nuvens da descrença por notar imperfeições; vedes uma palavra ou um pequeno ponto, talvez, que possa vir a ter lugar, e julgai-os [Jones e Waggoner] por isso... Deveis observar é se Deus está operando com eles, e então reconhecer o Espírito de Deus que é revelado neles. E se escolherdes resistir, estareis agindo da mesma maneira como os judeus agiam." (Sermão, 9 de março de 1890; MS. 2, 1890).

Irmãos mais velhos e experientes estavam melindrados ante a perspectiva de Ellen White tão decididamente apoiar dois homens comparativamente jovens e obscuros contra praticamente o conjunto todo de obreiros. O Pastor A. G. Daniells mais tarde declarou que ela teve que tomar posição "quase sozinha" contra quase toda a Associação Geral (The Abiding Gift of Prophecy, p. 369). Robert W. Olson relatou ao Concílio Anual no Rio de Janeiro em 1986 que ela fora "publicamente desafiada" na assembléia de 1888 (Adventist Review, 30 de outubro de 1986). Se estivesse certa, parecia que Deus havia passado por alto os irmãos da liderança, e isso era desconcertante:

"Aqueles a quem Deus tem enviado com uma mensagem são tão-somente homens, mas qual é o caráter da mensagem que levam? Ousaríeis dar as costas ou depreciar, as advertências, em vista de que Deus não vos consultou quanto ao que seria preferível?" (RH, 27 de maio de 1890).

"Deus... deu oportunidade de apresentar-vos armados e equipados para o auxílio do Senhor... Mas acaso vos aprontastes?... Sentaste-vos quietos, e nada fizestes. Deixastes que a palavra do Senhor caísse ao chão sem ser ouvida; e agora o Senhor tomou homens que eram meninos quando vos postáveis na frente da batalha, e deu-lhes a mensagem e a obra que não quisestes assumir. . . Criticareis? Direis, "Eles estão saindo de seu lugar?" Contudo não ocupastes o lugar que eles agora são chamados a ocupar." (TM 413).

Sendo como é a natureza humana, os opositores buscariam alguns ganchos sobre os quais dependurar as dúvidas. O fato de que os mensageiros do Senhor era "tão-somente" homens parecia suprir a necessidade:

"Aqueles a quem Deus enviou com uma mensagem são tão-somente homens... Alguns têm-se desviado da mensagem da justiça de Cristo para criticar os homens." (RH, 27 de dezembro de 1890).

Falando "àqueles em posições de responsabilidade", Ellen White perguntou: "Por quanto tempo odiareis e desprezareis os mensageiros da justiça de Deus?" (TM 96).

Um de nossos apreciados autores denominacionais tenta demonstrar que a oposição de 1888 foi justificável. Observem como ele realça as "faltas" de Jones e Waggoner e os culpa por terem causado a rejeição de sua mensagem. Assim, de fato perpetua o preconceito contra 1888 e atrasa o nosso relógio por cem anos:

"Não só era ele [Jones] grosseiro por natureza, mas cultivava a singularidade de oratória e maneiras,... era às vezes irritadiço, e propiciava motivos para ressentimento. . .

"[Jones e Waggoner] ao gritarem, "Cristo é tudo" ... davam evidência de que não eram inteiramente santificados... [Incorretamente cita a Sra. White como apoiando a idéia de que Jones e Waggoner contribuíram com um espírito de contenda para a "terrível experiência durante a Assembléia de Mineápolis"].

"Eles se apegavam quase exclusivamente à fé como o fator na salvação, . . . não revelavam disposição para considerar o outro lado calmamente. . . Não estavam inteiramente isentos de faltas em seu próprio conceito e arrogância. . .

"Falhavam em revelar a humildade e amor que a justificação pela fé transmitem. . . O ensinamento extremado de Jones e Waggoner é ainda perceptível nas declarações místicas daqueles que tornam a fé tudo, e a as obras nada.

"... [Eles eram] canais imperfeitos... Ao recapitularmos a controvérsia, percebemos que foram os rancores suscitados pelas personalidades [de Jones e Waggoner], muito mais do que as diferenças em crença, que provocaram a dificuldade." (A. W. Spalding, Captains of the Host, pp. 591-602).

Essa é uma análise negativa dos homens a quem a inspiração atribuiu o papel de "mensageiros do Senhor". Conquanto eles fossem "tão-somente homens", é difícil entender por que o Senhor deveria escolher para uma obra tão especial homens que eram notavelmente "canais imperfeitos", não-santificados (em comparação com outros), despertando "ressentimento" e "rancores", grosseiros e "místicos". O Senhor aborrece um espírito de justiça própria e contenda. Mas Jones e Waggoner não tinham tal espírito na época de 1888.

Embora seja verdade que Ellen White repreendia A. T. Jones por ser em algumas ocasiões "demasiado duro" sobre Urias Smith na controvérsia anterior à sessão sobre os dez chifres, não obstante, defende os dois irmãos como "cristãos" e "cavalheiros". E ela mais do que sugeriu que um número considerável dos irmãos da oposição não evidenciavam tais "credenciais celestiais".

Dispomos de autores modernos que pintam a Jones e Waggoner em semelhantes termos de descoberta de falhas, a exemplo de seus oponentes em 1888. Mas os dois "mensageiros" desfrutavam do solidário endosso de Ellen White. É verdade que após a era de 1888 ter-se findado, eles falharam e perderam o rumo. Essa provavelmente é a razão por que os escritores modernos desejam culpá-los pela tragédia de 1888. Mas julgam mal os fatos.

Ellen White predisse que essa trágica conseqüência se daria caso a oposição à mensagem deles prosseguisse. Contudo, acrescentou, a falha posterior da parte deles de modo algum invalidaria a sua mensagem e ministério de 1888-1896, o período de seu endosso (ver capítulo 10). Criticar esses "mensageiros" durante aquela época do "início" do alto clamor significa endossar as objeções de seus oponentes contemporâneos. Logicamente, isso justifica a rejeição da bênção especial que procedeu do céu. É impressionante como após cem anos ainda nos sentimos compelidos a culpar os mensageiros especiais do Senhor pelas conseqüências de nossa própria descrença.

Ellen White notavelmente considerou Jones e Waggoner como revelando um genuíno espírito cristão durante e após a Assembléia de Mineápolis (testemunhas oculares substanciam o seu julgamento):

"O doutor Waggoner tem-nos falado de maneira bem direta. . . De uma coisa estou certa, como cristãos não tendes o direito de abrigar sentimentos de inimizade, falta de cortesia e preconceito para com o Dr. Waggoner, que tem apresentado seus pontos de vista de modo claro e de maneira objetiva e direta, como deve agir um cristão. . . Creio ser ele perfeitamente honesto em suas posições, e respeitaria os seus sentimentos e nele confiaria como um irmão cristão, na medida em que não haja evidência de que é indigno. O fato de que ele honestamente sustenta alguns pontos de vista escriturísticos que diferem dos vossos e meus não é razão por que devamos tratá-lo como um ofensor, como um homem perigoso, e torná-lo objeto de crítica injusta." (Ms 15, 1888; Olson, p. 294).

Um jovem pastor que veio à assembléia de Mineápolis com uma mente preconceituosa contra ele deixou em registro suas impressões do espírito que Waggoner demonstrava:

"Tendo decididamente inclinação em favor do Pastor Butler, e contra E. J. Waggoner, fui à reunião com uma mente predisposta. . . .

"Com lápis e caderno de anotações na mão eu ouvia em busca de heresias e estava pronto a encontrar falhas e achar defeitos no que quer que fosse apresentado. Na medida em que o Pastor Waggoner começou, parecia muito diferente daquilo que eu estava à procura. Pelo fim de sua segunda lição eu estava pronto a reconhecer que ele ia ser preciso e sua metodologia não revelava qualquer espírito de controvérsia, nem mencionou qualquer oposição que eu estava antecipando. Muito em breve sua maneira, e o puro evangelho que estava propondo mu­aram materialmente minha mente e atitude, e passei a ser um atento ouvinte em busca da Verdade. . . Ao final da quarta ou quinta lição do Pastor Waggoner eu era um pecador arrependido e submisso. . .

"... Após o Pastor Waggoner ter concluído seus onze estudos, a influência deles havia em grande medida eliminado de muitos o espírito de debate. . ." (C. McReynolds, "Experiences While at the General Conference in Minneapolis, Minn., in 1888" [Experiência Enquanto na Assembléia da Associação Geral de Mineápolis, Minn., em 1888]. E. G. White Estate, D File, 189).

Ellen White até defendeu a metodologia ousada e espírito aparentemente iconoclasta dos jovens mensageiros:

"Homens sairão no espírito e poder de Elias para preparar o caminho para o segundo advento do Senhor Jesus Cristo. É sua obra tornar coisas tortuosas retas. Algumas coisas precisam ser derribadas; algumas coisas devem ser edificadas." (Ms. 15, 1888; Olson, p. 300).

"Que nenhuma alma se queixe dos servos de Deus que a eles foram com uma mensagem enviada pelo céu. Não mais busqueis falhas neles, dizendo: "Eles são demasiado positivos; eles falam de modo muito vigoroso". Eles podem falar com vigor; mas não seria necessário? Deus fará com que os ouvidos dos ouvintes reverberem se não derem atenção a Sua voz ou a Sua mensagem. . . .

"Pastores, não desonreis a vosso Deus e agraveis o Seu Santo Espírito lançando reflexos sobre os caminhos e maneiras dos homens que Ele escolheria. Deus sabe que ninguém, a não ser homens ardorosos, firmes, determinados, de fortes sentimentos considerarão esta obra como sendo de importância vital, e aplicarão tal firmeza e decisão a seus testemunhos que despedaçarão as barreiras de Satanás." (TM 410, 412, 413).

Um historiador moderno descreve o grosseiro e supostamente inculto A. T. Jones como "um homem alto e magro, com um jeito saltitante e posturas e gestos rudes" (Spalding, op. cit., p. 591). Ellen White tinha uma opinião muito diferente dele:

"Há obreiros cristãos que não receberam uma educação superior porque foi-lhes impossível obter tal vantagem; mas Deus tem oferecido evidência de que os tem escolhido. . . Ele os tem tornado co-obreiros eficientes consigo próprio. Eles têm um espírito pronto a aprender; sentem sua dependência de Deus, e o Espírito Santo está com eles para ajudar em suas fraquezas... Ouve-se em sua voz o eco da voz de Cristo.

"É evidente que ele caminha com Deus, que tem estado com Jesus e aprendido Dele. Tem trazido a verdade ao santuário interior da alma; é para ele uma realidade viva, e apresenta a verdade na demonstração do Espírito e de poder. As pessoas ouvem o alegre som. Deus fala a seus corações mediante o homem consagrado a Seu serviço. . . Ele se torna realmente eloqüente. É fervoroso e sincero, e amado por aqueles por quem trabalha... Seus defeitos serão perdoados e esquecidos. Seus ouvintes não se farão cansados e desgostosos, mas agradecerão a Deus pela mensagem de graça a eles enviada por meio de Seu servo.

"Eles [os oponentes] podem sustentar o átomo objetável sob lentes de aumento de sua imaginação até que o átomo se torne como um mundo, e apague de sua vista a preciosa luz do céu. . . Por que levar tanto em conta aquilo que possa parecer-vos tão objetável no mensageiro, e descartar todas as evidências que Deus tem oferecido para equilibrar a mente com respeito à verdade?" ("Cristian Education". 1893, citado em FE 242, 243; RH, 18 de abril de 1893).

A própria Ellen White, com toda sua respeitável experiência e idade, e consciente de sua exaltada posição como mensageira especial do Senhor, julgou uma honra apoiar a obra de Jones e Waggoner:

"Tenho viajado de um lugar a outro, assistindo a reuniões onde a mensagem da justiça de Cristo foi pregada. Considerei um privilégio permanecer ao lado de meus irmãos, e dar o meu testemunho com a mensagem para o tempo." (RH, 18 de março de 1890).

 

A Verdadeira Razão Por Que a Mensagem Foi Rejeitada

Ao relermos hoje as inspiradas mensagens enviadas por anos após 1888, instando pela aceitação da mensagem, não podemos compreender -- lendo sobre a superfície -- por que poderia haver qualquer falha em fazê-lo. Temos, portanto, cometido o erro de assumir que nossos irmãos realmente chegaram a aceitá-la de coração.

Não devemos passar por alto um fato importante. Como poderia alguém aceitar a mensagem que Deus enviou e "odiar e desprezar" os mensageiros que empregou? Eles eram "tão-somente homens", muito positivos e ousados, e desafortunadamente para o prestígio e paz dos irmãos, estavam certos. Isso fez com que as agências escolhidas pelo Senhor de libertação se tornassem objeto de tropeço e uma pedra de ofensa devido à prevalecente descrença. Aquilo que o Senhor tencionou como um aroma de vida para vida tornou-se um aroma de morte para morte. Aquilo que Ele enviou para a terminação de Sua obra tornou-se o início de um longo atraso.

Aceitar a mensagem era demasiada humilhação. As implicações eram de que Deus estava de algum modo descontente com a condição espiritual daqueles que eram os "canais apropriados" para a luz especial do céu. Observem a análise de Ellen White quanto ao cerne do problema:

"Se os raios de luz que brilharam em Mineápolis tivessem podido exercer o seu poder convincente sobre aqueles que tomaram posição contra a luz, se todos tivessem renunciado a seus caminhos e submetido sua vontade ao Espírito de Deus naquele tempo, teriam recebido as mais ricas bênçãos, desapontado o inimigo, e permanecido como homens fiéis, verdadeiros a suas convicções. Eles teriam tido uma rica experiência; mas o eu declarou: "Não". O eu não estava disposto a ser afetado; o eu lutou pelo predomínio, e todas aquelas almas serão novamente provadas nos pontos em que falharam então. . . O eu e a paixão desenvolveram características odiosas." (Carta 19, 1892).

"Alguns têm estado cultivando ódio contra os homens a quem Deus tem comissionado para levarem uma mensagem especial ao mundo. Eles começaram essa obra satânica em Mineápolis. Posteriormente, quando viram e sentiram demonstração do Espírito Santo testificando que a mensagem era de Deus, odiaram-na ainda mais, porque era um testemunho contra eles." (TM 78, 80; 1895).

"O Espírito Santo, de tempos em tempos, revelará a verdade mediante seus próprios agentes; e nenhum homem, nem mesmo um sacerdote ou governante, tem o direito de dizer, não dês publicidade a vossas opiniões, porque não creio nelas. Esse maravilhoso "eu" pode tentar rebaixar o ensinamento do Espírito Santo." (TM 70; 1896).

"Eles [os oponentes] não ouviam, nem queriam entender. Por que?-- Para não se converterem e terem de reconhecer que todas as suas idéias não estavam corretas. Isso eles eram demasiadamente orgulhosos para fazer, e assim persistiram em rejeitar o conselho de Deus e a luz e evidência que haviam sido dadas. . . . Esse é o terreno sobre que alguns de nossos irmãos da liderança estão agora percorrendo." (Ms. 25, 1890).

"Vi que Jones e Waggoner tiveram sua contrapartida em Josué e Calebe. Como os filhos de Israel apedrejaram os espias com pedras literais, vós apedrejastes esses irmãos com pedras de sarcasmo e ridículo. Vi que vós voluntariamente rejeitastes o que sabíeis ser a verdade. Apenas porque ela era por demais humilhante para a vossa dignidade. Vi alguns de vós em vossas tendas arremedando e fazendo toda a sorte de galhofas desses dois irmãos. Vi também que se tivéssemos aceito a mensagem deles teríamos estado no reino após dois anos daquela data, mas agora temos de retornar ao deserto e ficar 40 anos." E.G.White, Escrito de Melbourne, Austrália, 09.05.1892.

Como em todas as eras passadas, uma análise da verdade de um profeta foi desonrada e desacatada. Mas para nós hoje, há boas novas em defrontar a realidade.

Podemos firmar nossos pés sobre a rocha sólida somente se estivermos dispostos a defrontar a verdade plena. É chegado o tempo para fazer isso e ninguém poderá retardar o relógio.

 

Onde Estavam os "Alguns"?

Observem a expressão, "alguns de nossos irmãos da liderança" rejeitaram "o conselho de Deus". É possível conhecer a verdade de qual é a proporção implícita desses "alguns"?

Seis anos depois Ellen White identificou aqueles que rejeitaram a mensagem com uma designação genérica. Os "alguns" constituíam o corpo principal de nossos irmãos da liderança e mais influentes: "A luz que deve iluminar a terra inteira com sua glória foi resistida, e pela ação de nossos irmãos tem sido em grande medida mantida afastada do mundo." (Carta 96, 1896; 1 SM 235; ênfase acrescentada). Sem exceção ela consistentemente identifica aqueles dentre "nossos próprios irmãos" que rejeitaram como "muitos" e os que aceitaram como "poucos" (ver capítulo 4).

A parábola de 1888 lança luz sobre nossa posição hoje:

"Os judeus recusaram receber a Cristo porque Ele não veio segundo as suas expectações. . . .

"Esse é o perigo a que a igreja agora se expõe--que as invenções dos homens assinalem o caminho preciso para o Espírito Santo vir. Conquanto não se preocupem em reconhecê-lo, alguns já têm feito isto. E devido a que o Espírito deve vir, não para o louvor de homens ou para estabelecer suas errôneas teorias, mas para reprovar o mundo do pecado, e da justiça, e do juízo, muitos se volvem Dele." (TM 64, 65; 1896).

Obviamente, a mensagem de 1888 foi muito mais do que uma mera reiteração de uma doutrina negligenciada. Os delegados à Assembléia chegaram inesperadamente a defrontar a Cristo face a face quando depararam face a face a Sua mensagem. "O que é justificação pela fé? É a obra de Deus em lançar a glória do homem no pó" (COR 104). O confronto envolvia a humilhação de suas almas até esse pó, e não estavam preparados para tanto. Eles se ressentiam de contrição, e lágrimas descendo-lhes a face.

Em suma, podemos ver como o amor de Cristo que derrete corações e o orgulho do clero profissional são incompatíveis. Eles estavam montados sobre o êxito, e a humildade de coração tornou-se-lhes uma pedra de tropeço.

Poderia este ser ainda nosso problema hoje?